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As indústrias flutuantes chinesas
O governo Lula lançou sua segunda política industrial, com desoneração e
incentivos fiscais da ordem de R$ 21,4 bilhões até 2011. Um dos
principais objetivos será modernizar as empresas brasileiras, medida
mais do que necessária num período de competição quase selvagem pelos
mercados mundiais. Vejam o que a China, de longe o mais agressivo de
todos os competidores, está fazendo no setor de bens de capital.
Montaram indústrias flutuantes, isso mesmo, flutuantes, dentro de
navios, na busca de reduzir o prazo de entrega de máquinas e
equipamentos mundo afora.
O governo chinês embarca em navios peças e mão-de-obra especializada,
que vai montando máquinas ao longo da viagem marítima. Como algumas
partes desses maquinários são importadas, em vez de ficar aguardando a
chegada da peça na China, o navio vai ancorando nos portos em que ela
está disponível durante a viagem até o destino final: o país do
comprador do bem de capital. Com esse modelo de indústria, a China
consegue entregar em quatro a seis meses uma máquina que outros países
demoram cerca de um ano para fazer chegar às mãos do seu cliente. Não
por outro motivo a China hoje é um grande competidor internacional no
setor de máquinas e equipamentos. Lidera, por exemplo, a produção de
guindastes para portos, já considerados um dos mais avançados do mundo.
O fato é que entender a China e suas estratégias passou a ser vital para
competir no mundo atual. De um país antes conhecido por fabricar
produtos baratos e ruins, hoje busca avançar no mercado internacional
desenvolvendo produtos de alta tecnologia, ainda a preços bem mais
competitivos do que seus parceiros internacionais. Resultado de um país
que cresceu de 1979 a 2006 a uma taxa média de 9,6% ao ano. Que hoje,
diante da escassez de energia provocada pelo salto econômico, procura
transferir indústrias de consumo energético intensivo para outros
países, como o Brasil.
Na busca de compreender esse ator global, a Fundação Dom Cabral decidiu
pesquisar as empresas chinesas e sua atuação no Brasil. A primeira etapa
do estudo resultou na montagem de um ranking com as 200 maiores
companhias da China, intitulado "Os futuros donos do poder: Top 200
Chinese Dragons". Desse grupo, pelo menos dez já estão atuando no
Brasil, inclusive aquela que é considerada hoje a maior empresa chinesa:
Sinopec, uma companhia petroleira (veja relação abaixo).
Responsável pelo estudo, o professor Carlos Arruda diz que as cinco
maiores empresas chinesas listadas no ranking apresentam um faturamento
superior a US$ 500 bilhões. Além da Sinopec, as outras quatro são: China
National Petroleum Corporation, State Grid Corporation of China(SGCC),
Petrochina Company Ltd. e Industrial and Commercial Bank of China.
Segundo Arruda, boa parte dos 200 dragões chineses tem sua origem em
"decisões de organismos, agências ou instituições ligadas ao governo
central". Muitas delas, porém, são tidas como empresas privadas de
capital aberto, com ações disponíveis nas bolsas de Hong Kong e Nova
York. O que torna muito complexo a definição do que é realmente público e
privado no gigante asiático
Em sua pesquisa, Carlos Arruda afirma ter notado que as empresas
chinesas hoje buscam associar o baixo custo com a inovação tecnológica.
Diz ele no estudo que, atualmente, "mais do que a capacidade de produção
a baixo custo", as empresas do ranking procuram se destacar "se
associando com parceiros tecnológicos de todo o mundo". O professor cita
o caso da Haier, uma das maiores produtoras de refrigerantes da China,
que se tornou líder mundial na fabricação de adegas climatizadas. A
empresa, em associação com a Walmart (Sam's Club), "desenvolveu produtos
50% mais baratos do que os concorrentes, com tecnologias muito mais
avançadas". Segundo Arruda, em pouco tempo a Haier conquistou 60% do
mercado americano.
Dessas empresas chinesas que buscam incorporar alta tecnologia a seus
produtos, o professor Carlos Arruda menciona também a Huawei, já
presente no Brasil no setor de telecomunicações. A empresa chinesa se
associou à Telefônica (Vivo) para desenvolver e lançar a família de
telefones celulares de terceira geração. O pesquisador da Fundação Dom
Cabral destaca que hoje na China é possível encontrar universidades
montadas por empresas para formação de mão-de-obra especializada em
tecnologia avançada. O segundo passo da Dom Cabral será analisar a
atuação no Brasil das empresas chinesas. Entre as 200 maiores companhias
chinesas, as dez que já estão no Brasil são:
Air China (transporte/logística)
Bank of China (setor financeiro)
Baosteel (siderurgia e metalurgia)
China Metais e Minerais - Minmetals (siderurgia e metalurgia)
China Shipping do Brasil (transporte/logística)
Cosco Brasil S/A (transporte/logística)
Gree Electric Appliances Inc. (eletroeletrônico)
Sinopec (petróleo e gás)
ZTE (telecomunicações)
Huawei (telecomunicações)
Além da política industrial
O governo Lula, depois da política industrial, vai avançar para outra
área. A do ajuste fiscal. Num dia, lançou um pacote de desoneração
tributária e incentivos fiscais de R$ 21,4 bilhões até 2011. No outro,
deve anunciar um aperto fiscal, economizar mais dinheiro para fazer uma
poupança externa. Com isso, duas personagens do governo ficarão
satisfeitas. O ministro Guido Mantega (Fazenda) criará o fundo soberano,
terá dinheiro para estimular empresas brasileiras lá fora e, de quebra,
poderá atuar no mercado de câmbio. O presidente do Banco Central,
Henrique Meirelles, ganhará uma ajudazinha do Ministério da Fazenda, que
vai reduzir um pouco mais o gasto público para fazer poupança externa.
Com isso, diminuirá a demanda pública. A política econômica fica um
pouco mais equilibrada. Um pouco tarde, mas ainda a tempo de evitar que a
inflação faça maiores estragos no país.
Valdo Cruz, 55 anos, é repórter especial da Folha. Foi
diretor-executivo da Sucursal de Brasília durante os dois mandatos de
FHC e no primeiro de Lula. Ocupou a secretaria de redação da sucursal.
Escreve às terças
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