Órgãos públicos se unem para manter operações da Unimed-Rio
Procuradorias, ANS e Defensoria tentam acordo para garantir atendimento
18/07/2016 - 08h05 - Atualizada às 08h05 - POR AGÊNCIA O GLOBO
O objetivo é fazer com que fornecedores, executivos e médicos cooperados se comprometam com o pacto independentemente de quem estiver no comando da operadora.
As negociações incluem aporte de capital pelos cooperados e, segundo fontes, compromissos com grandes grupos do setor, como a Rede D’Or. A meta é criar um arranjo para evitar que se repita com a cooperativa carioca o que aconteceu com a Unimed Paulistana, liquidada em fevereiro deste ano.
Não bastassem os problemas de caixa, há uma batalha em torno do comando da empresa. Além dos grupos de oposição, o próprio conselho fiscal da cooperativa defende a destituição da atual diretoria, que tem o mesmo executivo, Celso Barros, no comando desde 1998. Foi convocada uma assembleia, para o próximo dia 28, com este fim. Mas a Unimed-Rio não descarta suspender a assembleia, como fez judicialmente em junho, caso o rito para convocação não tenha sido cumprido à risca.
"Os próximos dias serão decisivos. O plano de reestruturação é viável, mas é preciso captar a confiança da rede para manter o atendimento e acabar com a discussão sobre quem vai assumir o comando", diz uma fonte próxima à negociação.
Segundo Luiz Eduardo Perez, assessor de Comunicação e Marketing da Unimed-Rio, a operadora tem um plano de recuperação bem embasado. Ele destaca que a sinistralidade (o percentual da receita usado para atendimento) é de 79%, um patamar abaixo do vigente no mercado. Perez ressalta ainda que a Unimed-Rio teve redução no número de reclamações e que o programa exige que a operadora não tenha qualquer plano suspenso no semestre. Para isso, ela precisa ter menos de 50 notificações de investigação preliminar na ANS.
Consumidores em alerta
"Quando contratei o Plano Delta, tinha à disposição uma ampla oferta de hospitais e clínicas, todos de grande porte. Agora, a oferta deixa muito a desejar. Quando reclamei, alegaram que há hospitais que não foram descredenciados, mas deixaram de atender o meu plano".
O passivo da operadora é outro ponto crítico, alvo de questionamento de cooperados. Pelos números oficiais, são R$ 600 milhões, mas fontes do setor dizem que o montante poderia chegar a R$ 2,5 bilhões, se consideradas dívidas de longo prazo com bancos e outros compromissos.
Um primeiro alívio para o caixa da operadora foi o início da cobrança de uma participação, de 20% a 35%, da produção mensal dos cerca de 5.400 médicos cooperados, para pagamento de uma dívida tributária de Imposto Sobre Serviços (ISS). A operadora, oitava maior do país, explicou que pagou os tributos em nome dos sócios, de 2012 a 2015, e que foi aprovado em assembleia o ressarcimento dos valores pelos cooperados até que o montante seja equalizado.
"A situação no Rio é muito diferente da de São Paulo devido ao envolvimento de entes públicos e do interesse da rede credenciada na solução da crise. Mas a contribuição do ISS não será suficiente. Os cooperados precisarão fazer aporte. É importante que os clientes saibam que a cooperativa não está na “bacia das almas” ", disse outra fonte.
Um cooperado da oposição, que não quis se identificar, diz que a questão é a confiabilidade:
"Sabemos que eventuais prejuízos, como os lucros, devem ser partilhados. A questão é que, se aparece no balanço que dois mais cinco é igual a sete, há dúvidas. Falta credibilidade à atual diretoria"
O Conselho Empresarial de Medicina, da Associação Comercial do Rio, convocou uma reunião para quarta-feira para discutir o caso da Unimed-Rio.
"Os consumidores estão protegidos pela portabilidade, mas uma eventual quebra da Unimed-Rio teria grave consequência para a rede de hospitais, clínicas e laboratórios do Rio. Há como negociar as dívidas, a questão é garantir o que for pactuado. Eles precisam tomar juízo e resolver a questão política", diz Josier Vilar, presidente do Conselho.
Fernando Antonio Boigues, presidente do Sindicato dos Hospitais e Clínicas do Município do Rio, faz avaliação similar:
"Se a Unimed-Rio deixasse o mercado, o que ninguém quer que aconteça, haveria um efeito dominó. Há pequenas clínicas e hospitais com até 60% do atendimento vindos de clientes da cooperativa. O sindicato já se reuniu com a diretoria da Unimed-Rio e também com a ANS para saber como ajudar", afirma Boigues, acrescentando que a dívida com hospitais de todo o Brasil poderia estar na casa do bilhão de reais, número negado pela operadora.
Mais de 70% das cooperativas em boa situação
Fontes a par da situação alegam que só seria possível uma ação mais contundente da agência na cooperativa em caso de liquidação. A própria demora da agência para iniciar a direção fiscal teria o objetivo de evitar que a Unimed-Rio tentasse invalidá-la por meio de artifícios jurídicos.
O sinal de alerta para a reguladora foi a liberação judicial, às vésperas do Natal de 2014, da reserva técnica de provisionamento (a Peona) de R$ 350 milhões — dinheiro que fica recolhido na ANS como garantia de pagamento a fornecedores de atendimentos ainda não registrados.
A advogada Juliana Bumachar, especializada em recuperação judicial, explica que a direção fiscal é crucial:
"Operadoras de saúde não estão incluídas na Lei de Recuperação e Falências. A direção fiscal atua com esse foco, de entender o que está errado na gestão financeira e ajudar na implementação de um plano de reestruturação".
Elici Maria Checchin Bueno, coordenadora executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), diz ter recebido relatos de usuários da Unimed-Rio, oriundos da carteira da Golden Cross, em São Paulo, que não têm conseguido atendimento adequado:
"Desde que foi decretada a alienação compulsória da carteira da Unimed Paulistana, os consumidores da cooperativa carioca enfrentam problemas para ter acesso aos serviços".
Claudia Nakano, advogada especializada no direito à saúde, afirma que, numa liquidação, os direitos dos consumidores, apesar da portabilidade, nunca são plenamente contemplados:
"Muitas vezes, não se escolhe a operadora e, na maioria dos casos, como no da Unimed Paulistana, essa transferência significa mudança de rede e aumento da mensalidade"
O comprometimento do sistema Unimed, com uma eventual quebra da operadora carioca, é outra questão que preocupa. Isto porque cooperativas do estado dependem de repasse financeiro e da rede de atendimento para manter seus serviços. A Unimed Leste Fluminense, por exemplo, com cerca de 203 mil usuários, tem 30% de seus atendimentos prestados a clientes da Unimed-Rio. Em março, os pagamentos foram suspensos pela cooperativa carioca, o que levou à interrupção da prestação do serviço por médicos e pela rede credenciada à fluminense. A situação, porém, já foi regularizada.
Valdmário Rodrigues Júnior, diretor de Integração Cooperativista e Mercado da Unimed do Brasil, garante que não há risco de contaminação. Com 31% do mercado nacional de planos de saúde e a segunda maior rede hospitalar do país, o sistema Unimed, diz ele, tem mais de 70% das suas cooperativas em boa situação econômica.
"A gestão financeira e de rede é autônoma", ressalta, informando que a Unimed Brasil ajudou a elaborar o programa de saneamento e dá apoio técnico à cooperativa.
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