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Tribuna da Bahia, Salvador
03/07/2018 10:50
03/07/2018 10:50
Luiz Holanda é advogado e professor universitário.
PROFESSOR CEARENSE RADICADO NA BAHIA
A ternura da indecência
As
acintosas decisões de alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF),
integrantes do grupo nacionalmente conhecido como “garantistas da impunidade”,
têm deixado o país perplexo e sem esperança. Não há um só acusado de corrupção
– mesmo que condenado-, que permaneça na prisão por muito tempo. Todos ficam
livres quando seus processos chegam às mãos dos ministros Ricardo Lewandowski,
Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Marco Aurélio Mello ou do decano Celso de Mello.
Os três
primeiros integram a Segunda Turma da Corte, e estão determinados a
“desconstruir” a Lava Jato por meio de suspensão de sentenças como no recente
caso do ex-ministro José Dirceu. Para os que não se lembram, logo que começou o
processo do chamado mensalão, Ricardo Lewandowski foi objeto de denúncia feita
pela repórter da Folha de São Paulo, Vera Magalhães, ao ser flagrado em
conversa telefônica reclamando de suposta interferência da imprensa no
resultado do julgamento, que decidiu pela abertura de ação penal contra os
mensageiros, entre os quais se encontrava o ex-ministro José Dirceu, seu amigo
e correligionário.
Segundo
Lewandowski, “A imprensa acuou o Supremo. Todo mundo votou com a faca no
pescoço”. Para ele, “a tendência era amaciar para o Dirceu”. O ministro foi o
único a divergir do então relator, Joaquim Barbosa, quanto à imputação do crime
de formação de quadrilha para o ex-ministro, descrito na denúncia do
procurador-geral da República da época, Antonio Fernando de Souza, como “o
chefe da organização criminosa”.
Antes
dessa reportagem o jornal “O Globo” havia divulgado algumas mensagens trocadas
entre os ministros especulando sobre os votos dos colegas. Esse tipo de
comportamento, sob todos os aspectos nefasto e indecente, fez gerar uma
descrença generalizada com a própria justiça. Vários pedidos de impeachment de
ministros ocorreram, restando, atualmente, quatro solicitações ainda em
tramitação, três delas justamente contra Gilmar Mendes, Lewandowski e Dias Toffoli.
A Segunda
Turma do STF está ficando famosa na garantida da impunidade dos criminosos de
colarinho branco. Fora algumas reações, o trio continua incólume. Mesmo assim,
vez por outra aparece um corajoso para desafiar o trio. O promotor de Justiça
de São Paulo, Ricardo Montemor, é um deles. Revoltado com a decisão que
tirou das mãos do juiz Sérgio Moro o processo do sítio de Atibaia e o processo
do terreno do Instituo Lula, divulgou no facebook suas impressões chamando os
três de canalhas
Procurado
pela reportagem para informar se a notícia era mesmo de sua autoria ou era uma
espécie de fakenews, o promotor avisou que só se manifestaria na
“Corregedoria”. O corajoso promotor demonstrou que nós vivemos um processo
contínuo de delinquência institucional, sendo que uma das facetas dessa
delinquência se expressa justamente no poder judiciário, através do chamado
ativismo judiciário, que ocorre quando esse poder extrapola de suas funções de
guardião da Constituição e passa agir como ator político, interferindo em todos
os setores e esferas dos demais poderes, inclusive no de si próprio.
Esse
ativismo significou a legalização da impunidade. Condenados em segunda
instância, que deveriam estar cumprindo pena, passaram a ficar em liberdade
graças a esses ministros. Na prática, isso significa a impossibilidade jurídica
de se colocar na cadeia pessoas já condenadas em segunda instância.
Houve um
momento em que o próprio STF fez ressurgir a esperança de que os poderosos
criminosos poderiam ser presos. Foi quando decidiu que os condenados em segunda
instância pudessem cumprir a pena na prisão, prevalecendo, naquela ocasião, a
tese de que o cumprimento da pena, nessa situação, não fere o princípio da
presunção de inocência nem o disposto no art.5º, LVII, da Constituição Federal,
que diz que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória”, pois caberia à lei federal definir o que se
entende por “considerado culpado”.
Na
decisão considerou-se que uma vez considerado culpado em duas instâncias, o réu
pode cumprir a pena na prisão, com base no que determina o Código Penal e o que
vem sendo adotado em todas as democracias do mundo. Esse entendimento, no
entanto, durou pouco tempo.
O
poderoso lobby dos corruptos envolvidos na Lava Jato imediatamente entrou em
cena para fazer voltar a valer a decisão anterior do STF de 2009, ajudado pela
Ordem dos Advogados do Brasil, que entrou com uma ação direta de
inconstitucionalidade contra a interpretação que até então vinha predominando.
Agora, os
três ministros, majoritários na Segunda Turma no STF, colocaram em pauta o
desfazimento sistemático da Lava Jato, liberando praticamente todos os
poderosos condenados em segunda instância, ignorando a própria posição do
tribunal. Esse trio, que a imprensa vem denominando de “trio ternura”, deverá
abrir todas as celas daqui para frente. Além de poderoso, ninguém tem força
para contestá-lo na Corte ou fora dela. Mesmo assim, a chamada “ternura” que o
trio possui para soltar criminosos, além de indecente, não deixa de ser uma
desonra para o tribunal. Que República! E que Tribunal!
Luiz Holanda é advogado e professor universitário.
PROFESSOR CEARENSE RADICADO NA BAHIA
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