CENA DE UM GRANDE PRONTO SOCORRO.
Nos dias atuais são grandes os desentendimentos nas emergências públicas e privadas.
Num dos plantões , da maior Emergência do Estado, formou-se uma aglomeração em torno de um ser humano , uma senhora exposta numa fria, suja e nua maca, duas mulheres a esbravejar , braços rijos e dedo em riste, escrachavam um abnegado servidor. Ao lado, de jaleco quase branco, surrado, suado e amarrotado, um jovem esculápio com os olhos arregalados , tez engordurada, semblante de medo e sinais de cansaço. Não saia uma atitude de sua lavra, não possuía palavras, gestos e nem argumentos que resgatasse a paz no seu trabalho, estava engessado, congelado e estupefato com a dantesca cena.
Como um providencial invasor, um médico interviu na dramática cena , se pôs entre os quatro e toda uma plateia, paramédicos, outros pacientes, acompanhantes e curiosos que adentraram à sala.
Foi até a surrada maca, expôs os cabelos brancos e a limpar os óculos ficou frente a frente à frágil anciã . Sem luvas alisou o rosto, os cabelos , o abdome, pegou nas duas mãos da enferma, mirou a sua face , cravou os seus olhos nos olhos da paciente e entrou vagarosamente na sua alma .
Pausadamente e com a voz macia perguntou o seu nome, onde morava, o que fazia , a idade , a profissão, perguntou pela familia e o que estava sentindo. Levantou a cabeça, olhou para as duas filhas, colocou um dos braços no ombro do jovem assistente e o outro no ombro de uma das mulheres, fechando o círculo da compreensão. Mirou uma das janelas que mostrava o infinito azul do céu , poucas nuvens , uma bela estrela e a borda da lua , sem pensar, guiado por uma força maior, vindo não sabe de onde, lembrou a todos que Deus existe e ali estava presente .
O ambiente conspirava pela presença do Criador, não existia outras possibilidades, naquele momento não existia outra explicação, ali encontrava-se uma anciã quase santa, que na vida só havia praticado o bem, grande mãe, eximia avó, magistral esposa e eterna sofredora por não conseguir consertar as mazelas do mundo. Uma anciã quase pura , em sofrimento, debilitada, nunca assistida pelos poderes públicos.
Tratava-se de um ser humano fragilizado, subserviente, sem força e sem ação, sendo assistido por um dos seguidores de Deus , o médico, que só pensa no bem, que faz tudo pelo bem e é guiado pelo bem . Ao lado suas filhas, duas guerreiras que lutavam desbravada e consanguineamente ao seu favor, enxergavam naquela relíquia humana o que existia de mais precioso, valioso e sublime nas suas vidas, uma dádiva de Deus, a sua querida e insubstituível mãe. Queriam a sua recuperação e exigiam os seus direitos. O momento era a prova concreta da presença do grande Mestre, ali estavam todos de mãos dadas para a recuperação daquela heroína. O velho esculápio após apaziguar os ânimos , parou o discurso, quase uma homilía , saiu de cena e deixou mansamente o ambiente .
O jovem prosseguiu o seu atendimento. Agora, ele, as filhas, a quase santa, os olhares dos demais , a desnuda e fria maca, a velha janela, as nuvens , a grande estrela, a nesga da lua e todos com a tutela do grande Criador .
O silencio reinou no recinto, as filhas se aproximaram do jovem médico . O diálogo sadio colocou nos eixos o tumultuado momento, todos entenderam os esforços dos guerreiros e sofridos médicos.
O velho Esculápio deu continuidade à sua rotina nesta grande casa de saúde. Como médico quase que calejado, ficou feliz com o desenrolar daquele momento sublime que estava se transformando num funesto imbróglio, ainda bem que Deus existe .
Viva a paz, o respeito, a ética , o homem, a benevolência, a beneficência, a autonomia e a cidadania, é assim que se constrói um grande povo, viva a medicina, viva a mãe da humanidade. Viva a abnegação da Medicina
Doutor, muito obrigado.
Iderval Reginaldo Tenório
2 comentários:
Parabéns pela narração .
Viva os médicos, viva Dr. Iderval
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