segunda-feira, 6 de junho de 2016

O FILHO , O PAI E A NATUREZA

O FILHO , O PAI E A NATUREZA

O FILHO , O PAI E A NATUREZA
O FILHO , O PAI E A NATUREZA

 Este Texto foi produzido quando completei 07 anos de Medicina(1989) e fiquei preocupado com o destino dos nossos idosos , pensei que ainda no fim do século XX  o ser perderia em parte para o ter, perderia à proporção que ocupações importantes fossem embutidas nas vidas dos  filhos educados pelo suor dos seus genitores, educados às custas de muitos sacrifícios , resignação e humildade.

Imaginei um mundo repleto de casas de idosos e os filhos quando bons , custeando. Imaginei também que muitos  seriam abandonados e como medida de segurança enviei aos poderes públicos uma carta perguntando se não seria criado um manual, um regimento, um estatuto para proteger os desprotegidos do futuro.

Sempre falei e ainda falo para todos que me escutam , que no futuro além dos menores abandonados , serão milhares de idosos no abandono.

 Brevemente o Brasil será habitado por cidadãos  acima dos 60 anos .
Fui informado que tramitava no  Congresso o estatuto do idoso e o estatuto do adolescente, fiquei mais tranquilo, apenas mais tranquilo.


                                          Iderval Reginaldo Tenório
                                                 o blog é cultural


O FILHO QUE NÃO PROSPEROU

 

Numa roda de amigos foi abordado o quanto era importante o olhar, o cheiro , os conselhos e a presença dos pais.

Num caloroso e contagiante momento,  contou um dos amigos a seguinte história 

  Relatou que na sua cidade,  havia um bom senhor oriundo de classe social baixa ,  que  apesar do seu analfabetismo, com a sua vasta cultura existencial e o suor do seu próprio rosto,  conseguiu educar os seus 14 filhos.

O tempo passou, os filhos cresceram, alguns galgaram postos importantes na sua nação e o bom senhor à proporção que ganhava conhecimentos, foi envelhecendo.

Envelhecendo com saúde, com dignidade, com cidadania e com o respeito de todos os que lhe rodeavam. 
Como é peculiar à família e aquela não fugira a regra,  anos após anos, procurava através de encontros familiares lembrar ao velho carvalho o seu incalculável valor , a sua importância e o quanto era cabal a sua existência para a sua prole. 

De todos os seus filhos , um havia voado mais alto e galgado postos estratégicos na sua República, o tempo passava e de todos os filhos , aquele nunca estava presente devido a sua importância perante a nação , muitas  vezes nomeava prepostos, as vezes  irmãos e até mesmo amigos para lhe substituir nos encontros familiares, jamais negara ajuda financeira quando solicitado , era  sempre influente nas questões decisórias da família.

O tempo passou, o ancião foi perdendo as forças, os músculos foram minguando, os cabelos ficaram ralos , a mente foi ficando curta, murchando e o bom homem foi paulatinamente perdendo a memória, perguntava onde estava, muitas vezes perguntava até mesmo quem ele era.
  A  grande e tradicional família continuava as suas comemorações, anos após anos, e anos após anos o filho que prosperou era substituído por outro irmão ou por um dos seus amigos, até o dia em que foi convocado, até o dia em que foi intimado a comparecer ao 99o- aniversário do patriarca por todos os componentes daquela feliz e honesta família.

Ao chegar, entrou no quarto do seu genitor, se aproximou e disse : 

__A bença pai.

O velho imobilizado nada respondeu, Repetiu mais alto:

__ A bença pai ,a  bença pai.

  o  velho abriu os olhos, mexeu com o pescoço de um lado para o outro, fez esforço para levantar a cabeça , mirou o rosto do seu filho e com a voz trêmula balbuciou:

__Quem é você? DE ONDE VOCÊ VEIO ? ONDE VOCÊ MORA? QUEM É O SEU PAI? .

O filho parou, pensou, baixou a cabeça e disse :

__ A BENÇA PAI, EU SOU O SEU FILHO, o seu filho do meio, é que faz mais de 20 anos que não vejo o senhor, faz mais de 20 anos que não venho na nossa terra.

O pai mais uma vez falou:

__quem é você, de onde você veio, onde você mora, você é filho de quem, quem é o seu pai? Eu te abençôo mas não sei quem é você, se você diz que é meu filho é porque é o meu filho,  porém eu não me lembro de você. 

Desencantado pelo vasto tempo que havia visto o seu pai , com a amnésia paterna e decepcionado com o que presenciara não conseguira entender o que se passava, quando mais tarde  , soube por intermédio dos outros irmãos, que o seu pai num processo fisiológico fora perdendo paulatinamente a capacidade de memorizar, de verbalizar e de locomoção, passando a lembrar apenas dos fatos repetitivos, dos rostos do seu cotidiano das pessoas que de mais perto convivera nos últimos dias,  do seu cachorro e dos utensílios de primeira necessidade, o banheiro, as sandálias.  

Numa onda de culpa e de irresponsabilidade entendeu , que o pai devido a sua ausência , havia apagado da mente quaisquer resquícios ou lembranças de sua existência, havia apagado de sua mente até mesmo a legitimidade paterna, entendeu também que foi a sua ausência , a sua distância e o seu descaso para com o velho e bondoso pai que apagara toda a sua existência como filho.

Desconfiado, deprimido e solitário partiu para a conquista, para luta, para a briga, se esforçou, porém o velho e bondoso senhor aos poucos foi apagando da mente os dados e imagens cerebrais , aos poucos foi esquecendo , esquecendo, esquecendo... até o dia em que não mais lembrava nem de si, até o dia em que entrou em vegetação.

Com os fatos presenciados,  o filho passou a entender que o seu pai precisava era de abraços, de carinho, de respeito e de sua presença,  e não de ajuda financeira.

Foi-se o velho, com ele foi sepultado todas as suas memórias e conhecimentos, restando as boas lembranças e os seus ensinamentos.

Para o filho ficou a certeza que foi 20 anos atrás o ultimo dia em que o seu pai lhe viu, ficou gravado na sua memória que os seus filhos não eram netos do seu pai e mais claro ainda,  que o homem é a mente, o homem é a comunicação , o homem é fruto de sua raiz, o homem é o cérebro.

 E que o núcleo familiar jamais esqueça da importância dos seus genitores, estes jamais deverão perder a sua importância, jamais deverão ser substituídos e por mais longe que o homem vá, as suas raízes serão mais fortes.

Seja pai dos seus pais. 

24 de Janeiro de 1989
Iderval Reginaldo Tenório



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