UMA MÃE, CINCO DOS SEUS REBENTOS NUMA MADRUGADA DE CHUVAS, VENTOS , TROVÕES E RELÂMPAGOS NO ESTADO DO CEARÁ .
Era março de 1960, madrugada do dia 18 para o dia 19, dia de
São José, do teto coberto por telhas coloniais, vermelhas e encaixadas uma
sobre a outra caiam gotículas que se perdiam em nuvens antes de atingir o desgastado
piso de mosaico amarelo fosco, da velha e alta casa do bairro do socorro, na bela Juazeiro do Norte .
Sobre esta cobertura milenar caiam milhões de gotas d’água
num verdadeiro dilúvio que inundava o Ceará e que, acompanhados de ensurdecedores
trovões, cortantes ventos, eletrizantes
relâmpagos compunham aquela cena que tanto assombro trazia e traz às inocentes crianças e aos animais irracionais.
A combinação da pouca idade dos cinco rebentos com os quatros fenômenos da natureza, os estalidos e as
pancadas firmes da chuva no telhado, o ribombar dos trovões , o chicotear dos
fortes ventos e os clarões dos relâmpagos,
que modificavam as formas dos objetos ao serem
atingidos pelos eletrizantes raios , traziam para a longa e escura noite milhares de elucubrações assombrosas na mente dos moradores
da casa 55, da Praça do
cinquentenário, do bairro do Socorro, na terra do Padre Cícero .
A cidade achava-se dominada
por uma das maiores chuvas do seco e árido Cariri Cearense , mesmo assim, conhecido como o Oásis do Nordeste, o solo derretia-se em água , o Rio Salgadinho
transbordava , encharcava e alimentava os
canaviais, os arrozais e todos os pomares do vale
do Cariri, eram as forças da natureza lembrando ao homem quem realmente é o
senhor da terra.
Na larga cama de colchão de palha, a jovem matriarca, atenta e a pensar na vida; e de como
proteger as suas crias menores .
Neste dia de saudosa memória, o patriarca encontrava-se a vinte léguas em busca do enche bucho , do enche cérebro e do vestir de sua prole, o patriarca do cio da terra , com as suas forças fazia brotar o pão provedor e a matriarca fazia milagres para tudo render e sobrar, tudo sobrava , tudo era em abundância e sempre havia mais e mais bocas a alimentar, era a sua casa o porto para muitos parentes , amigos e ajudantes, era um verdadeiro e frutífero pomar, era um lar acolhedor, das suas frondes colhiam-se os frutos, agasalhavam-se os pássaros e os insetos, nas suas sombras descansavam todos os seres humanos e os animais , dos galhos, das cascas e das folhas faziam-se o adubo, os humos das minhocas e por último o fogo .
Neste dia de saudosa memória, o patriarca encontrava-se a vinte léguas em busca do enche bucho , do enche cérebro e do vestir de sua prole, o patriarca do cio da terra , com as suas forças fazia brotar o pão provedor e a matriarca fazia milagres para tudo render e sobrar, tudo sobrava , tudo era em abundância e sempre havia mais e mais bocas a alimentar, era a sua casa o porto para muitos parentes , amigos e ajudantes, era um verdadeiro e frutífero pomar, era um lar acolhedor, das suas frondes colhiam-se os frutos, agasalhavam-se os pássaros e os insetos, nas suas sombras descansavam todos os seres humanos e os animais , dos galhos, das cascas e das folhas faziam-se o adubo, os humos das minhocas e por último o fogo .
A educação, a habitação,
a saúde e a alimentação eram as pilastras dos condutores daquela família,
falava para os filhos que, num futuro
muito próximo a força muscular iria perder valor no cotidiano ganha pão, as máquinas
iriam fazer todos os trabalhos braçais, até os animais iriam perder esta função
e
seria o cérebro o senhor absoluto na condução da vida , enquanto maior o grau
educacional mais promissor seria o
futuro, sem educação os seres humanos não encontrariam ocupações dignas na lida
diária, tudo seria mais difícil.
A chuva caia torrencialmente
sobre o sofrido telhado, as crias
maiores, cobertas dos pés à cabeça, pensavam na vida deitadas nas suas puídas redes
e camas patentes, os menores aos poucos e
em busca de socorro foram tomando o caminho do aconchegante quarto , aposento no qual
se encontrava a acolhedora mãe, primeiro
o caçula, O MIJÃO , com dois anos de idade, depois a chorona, A MAGRELA, com quatro anos de idade acompanhada do calado e pensativo, O CHORÃO, com seis anos , em seguida o corajoso e
valente, O GÊNIO, com
oito anos , complementado pelo inteligente
e cuidadoso, O COMPENETRADO, com dez anos incompletos.
A mãe no meio e os cinco rebentos a lhe abraçar, no aconchego materno da genitora, na segurança dos seus odores hormonais e nos
raios de confiança advindo do EU da matriarca , o medo das rajadas cortantes dos ventos, dos
estrondosos rompantes dos trovões, dos eletrizantes e incandescentes
raios dos relâmpagos foi substituído
pela irrestrita proteção e, como numa regressão uterina os rebentos entraram num escuro casulo
e a tempestuosa noite foi transformada num sereno porto seguro, como recompensa todos caíram num reconfortante sono.
Já apaziguados e livres das descargas adrenalínicas, os dois
maiores, o corajoso e valente, o GÊNIO,
o inteligente e cuidadoso, O
COMPENETRADO foram para as suas redes.
O calado e pensativo ,
O CHORÃO, tibungou numa branca rede estrategicamente armada para os socorros noturnos
e as duas crias menores, O CAÇULA MIJÃO e A
CHORONA MAGRELA , adormeceram sob a
proteção da cuidadosa mãe. Como dois caçuás, um de cada lado, com os braços e
as pernas a lhe abraçarem pelo pescoço e
pela cintura viajaram nos braços do deus
do sono, O MORFEU, até o clarear do dia , ao acordarem estavam um a um , cara a cara e bem cobertos com os seus
brancos lenções, levemente azulados,
feitos de sacos lavados com sabão e anil, porém com o FORTE carimbo circular : ” USINA DE AÇÚCAR DAS ALAGOAS”.
Veio o amanhecer,
clima frio, solo molhado, brisa a balançar as algarobas da praça, paredes
úmidas, sapinhos e rãs a pularem nas ruas, pássaros a chilrear, sorrisos nos rostos de todos os moradores da
região, vendedores confiantes no bom inverno e no São José que nunca falhou no dia 19 de
março. Café simples na mesa, banana
casca verde, ovos, tapiocas, manteiga de garrafa, cuscuz cozido num prato esmaltado coberto por um pano
branco e emborcado numa panela , massa de milho pisado no
centenário pilão da avó materna , um bule
azul de bico esmaltado , decorado com
desenhos de flores, folhas e grãos de café repleto do verdadeiro arábico
pilado em casa , outro com leite bovino
com muita nata.
No centro da mesa comida e alegria , muita fala sobre a grande chuva e como foi bom dormir nos braços da mais linda, cheirosa, quente,
protetora e amável mãe.
Fora ou foi o maior
presente para os rebentos CHORÃO e para
o GÊNIO, uma vez que, os fenômenos iniciaram no dia 18
de março e foram sacramentados no dia 19
de março, dia do padroeiro do Ceará, chuva, ventos, trovões e relâmpagos , uma
noite de paz e muita bonança.
Viva o mais sublime e puro amor, o amor de mãe, neste episódio o amor da natureza, a mãe
terra, e o amor de uma verdadeira mãe, a
humana, se entrelaçaram em nome da
fartura e do vínculo eterno das verdadeiras famílias.
Hoje, de olhos fechados e a marejarem, o CHORÃO, já maduro sonha
com aquela gostosa noite e logo vem na
sua mente como foi bom, importante, necessário
e confortante a existência daquele ninho e o acolhimento daquela matriarca para
os seus frágeis e amáveis rebentos .
Nos dias atuais, quatro senhores e uma senhora choram como chora o Chorão ao relembrar aquela noite, uma mãe acolhedora, quatro filhos e uma filha,
os cinco mais novos de uma prole de doze , noite escura de copiosa chuva, ensurdecedores trovões , chicoteadores
ventos e eletrizantes relâmpagos, tudo obra do Criador, obra de Deus e que fez de uma noite de medo na mais gostosa,
gratificante, acolhedora e segura noite
de suas vidas.
Dormir ao lado,
pertinho, colado, cheirando e abraçando a
mãe, sentido o seu amor, o seu carinho e
os seus odores maternos tornou estes rebentos pessoas melhores, cidadãos
do bem e para o bem.
Viva esta grande matriarca e viva esta bela família
nordestina , viva aquela inesquecível madrugada de março de 1960.
Viva o Criador que sempre sabe o que faz.
Viva!
Salvador, 22 de Junho de 2019.
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