A História pode se repetir como tragédia
11/06/2019 às 06:15Adicionar legenda |
Por incrível que pareça ninguém no Brasil
governa sem apoio político. Esse apoio tem um preço, atingindo, às
vezes, a própria governabilidade. De tão alto, pode inviabilizar a
administração, bastando apenas que o governo não tenha
dinheiro para pagá-lo. O Centrão, por exemplo, sabe disso. Daí suas
exigências em querer sempre mais. Chegou a recusar os cargos de segundo
escalão ofertado pelo governo em troca de apoio à proposta da reforma da
Previdência.
Segundo a imprensa, lideranças de vários
partidos disseram que a aprovação da reforma da Previdência só passa se o
governo pagar o preço, que, por enquanto, é apenas inicial: R$ 10
milhões por deputado. Essa é a quantia com que cada
parlamentar poderá dispor para despejar em obras e repasses federais do
seu interesse.
Até agora não se ouviu qualquer contestação
ao que foi noticiado pelos jornais. A quota de R$ 10 milhões é para
parlamentares reeleitos; os iniciantes receberão apenas R$ 7,5 milhões.
Segundo cálculo dos economistas, a conta poderá
superar os R$ 500 milhões, sem contar os cargos do segundo escalão.
Considerando que o presidente, na campanha
eleitoral, prometeu acabar com o “toma lá, dá cá”, o cenário é de
completa desolação. Nas palavras de um senador tucano, para conseguir
qualquer apoio no Congresso o governo “vai ter que
dividir o poder, fazer concessões e reabrir o balcão de negócios”.
Isso já aconteceu antes. Vem desde a
proclamação da República. Nos anos 30 fizemos uma revolução visando a
renovação dos costumes. Nada mudou desde então. Mesmo vitoriosos, os
revolucionários tiveram que ceder, pois as oligarquias
que apoiaram a subida de Vargas ao poder agiram da mesma forma que o
Centrão na república bolsonarista: exigiram de Vargas a preservação das
formas tradicionais de fazer política no Brasil.
O resultado todo mundo sabe. Diante das
pressões, Vargas, para governar, teve de assumir o Executivo, o
Legislativo, demitir governadores, nomear interventores e dissolver o
Congresso. E para se manter no poder, procurou apoio nos
tenentes, que ele utilizou como instrumento de luta contra as
oligarquias.
Os tenentes eram nacionalistas, defendiam o
prolongamento da ditadura varguista e uma Constituição representativa
por classes. Muitos chegaram a interventores nos estados, tentando fazer
reformas importantes para atender as reivindicações
populares.
Apesar disso, não tinham condições de
realizar grandes transformações. Daí a necessidade de fazer acordo com
as oligarquias para poderem governar. Destes acordos, os principais
foram feitos no Nordeste, onde o general Juarez Távora
era conhecido como o vice-rei do Norte. Em São Paulo, a situação levou à
deflagração de uma revolta que quase se transformou numa guerra civil,
com a Revolução Constitucionalista de 1932.
Para acabar com a crise, Vargas assumiu o
compromisso com as oligarquias de desagregar o grupo tenentista, cujo
resultado final foi a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte
em 1933, que promulgou a Constituição de 1934.
Três anos depois, Vargas deu um golpe
apoiado pelo Exército. Dessa vez instalou o Estado Novo e plantou as
bases de uma longa etapa de poder pessoal. Para isso contribuíram os
centrões da época, tanto pela falta de maturidade política
como pela avidez quanto ao uso do dinheiro público.
É preciso compreender que a eleição de
Bolsonaro, para além do pragmatismo antipetista, representou uma
esperança para o país, que exigia e exige mudanças, rápidas e eficazes.
Se o Centrão prosseguir nesse comportamento do toma lá
dá cá e tentar inviabilizar o governo com fins puramente eleitoreiros, a
história de amanhã poderá se repetir como tragédia. E aí nem Deus
poderá prever o que poderá acontecer, mesmo se tratando de Brasil.
Luiz Holanda é advogado e professor universitário.
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