sexta-feira, 31 de outubro de 2014

A CALÇOLA DE TIA ZIZINHA


 


 
 
A calçola de tia Zizinha


Apesar de franzina tia Zizinha era uma setentona valente, de semblante calmo, de voz firme e olhar seguro. impunhava respeito,    nem só seus sobrinhos, mas todos a chamavam de Tia Zizinha, era ela quem organizava as quermesses, as partidas de futebol, as torcidas organizadas e as festas do milho, quando jovem, ganhou concursos de Rainha da Paróquia, embora pequena e  sequinha, fora a minha tia um verdadeiro furacão ou um vulcão em atividade.



Era dezembro de 1978,  a cidade se achava em chamas , a população duplicada devido a presença dos visitantes para a maior vaquejada da região , cavalos espalhados em todos os recantos e baixios,  bois nos currais, caminhões e caminhonetes enchiam as ruas de chão batido,  carros de som martelando ouvidos, canções sertanejas aproximando os apaixonados, rodas gigantes, canoas, tiro ao alvo e muita comida regional, tudo idealizado, organizado e executado por tia Zizinha.



O relógio marcava 12 horas,  a conversa rodeava a farta mesa do almoço, o papo solto campeava na imensa sala da amada tia, eu, sempre tirado a conversador, iniciei uma discussão sobre a vida, sobre a grandeza do universo, sobre a importância do ser humano e o quanto de orgulho possui uma certa classe social, apesar da insignificância, depois da longa prosa filosófica, em tom de deboche, falei para tia Zizinha: 


- Tia, a senhora não vê neste mundão de meu Deus, esses indivíduos que se dizem importantes, bonitos, orgulhosos, cheios de soberbas etc.? Eles e todos nós somos uns bostas, tia Zizinha, somos uns merdas, aliás tia Zizinha, nós e bosta somos a mesma coisa: basta um mosquito, uma bactéria, um vírus, e lá estamos todos nós debaixo do chão, veja tia, nós não somos nada, basta um dia sem um banho, e lá está a inhaca.


Tia Zizinha parou, pensou , matutou e de imediato me falou:
- Nós não, meu filho, me tire dessa corriola,  vocês sim, vocês que estudaram, que se diplomaram, moram e moraram na capital e são doutores podem se considerar bostas, podem se achar uns merdas, porque eu ainda sou um pum: um pum silencioso, um pum sem odor, isto é, um pum fajuto, escondido e que não tem direito a voz,  pra você vê, nem zoada o coitado faz, eu, seu pai e a sua  mãe somos uns projetos de bosta, ainda falta muito, e nem sei se um dia seremos bosta, acho que daqui para frente , seremos  sempre prenúncios bosta.


Após gostosas e efusivas gargalhadas retruquei:


- É tia, eu não sei por que tanto orgulho, tanto orgulho besta, pois todo mundo do mundo tem por trás uma bunda: umas batidas, outras avantajadas, mas todos têm, todos, todo mundo do mundo tia, tem uma bunda.



Pensei       que havia falado tudo , a tia não concordou e não  contou conversa, com o dedo em riste, abriu a boca e, em voz alta  advertiu a todos que estavam na sala: 



- E ainda por cima, meu filho, ainda por cima, furada,.



Este é o perfil da minha velha tia Zizinha, respostas na ponta da língua e tem para todas as perguntas. 


                                      *****


Agora  voltando à vaquejada, estávamos num pôr do sol de domingo, Tia Zizinha no comando da festa, de vestido vermelho-rodado, chicote de couro cru na mão direita, chapéu de massa na esquerda  e uma  bota cano longo que beirava o joelho, era uma verdadeira amazonas. Ao redor via-se a pista limpa, rapazolas pendurados nos mourões da cerca de madeira, moças de minissaias saboreando maçãs do amor, velhos e crianças nas arquibancadas de tábuas agrestes. As cancelas e os portões fechados, tudo pronto para a abertura do evento.



Sob os aplausos da platéia entra na pista a tia Zizinha, sozinha, descontraída e envaidecida,  com as salvas de palmas era a toda poderosa, a rainha da festa, ali estava a Tia Zizinha em carne, osso e outros predicados, a platéia gritava em coro e sincronizada: “Tia Zizinha!” várias vezes e sempre em som mais alto,  aquele ato poderia se chamar de dia de glória, de labuta, de dedicação, dia  de coroação, Tia Zizinha era mais do que uma  Rainha, era a imperatriz do sertão.
De repente, não se sabe de onde surgiu um boi preto de mais de metro de largura,  ancas largas, chifres em arcos, grandes e  pontudos, bem pontudos, com um aro de cobre nas narinas, cinta de couro apertada no  vazio, olhos avermelhados, narinas bufando que só uma maria-fumaça, com os cascos queria furar o chão, as patadas sobre o solo e o poeirão que subia chamou a atenção do público, o animal não contou conversas, nem gritaria e nem tempo ruim,  partiu enlouquecido e desembestado  pra cima de tia Zizinha. 


Imediatamente a tia procurou os portões, todos lacrados, a amazona não titubeou, com seus finos gravetos quis fazer bonito, levantou os braços, mostrou o belo chapéu de massa e rodou o chicote de couro cru sobre a cabeça, quis parecer que tudo fora programado, que aquilo fazia parte do espetáculo, correu para um lado, pulou para o outro, gritou como vaqueiro,  “Vai boi mandingueiro, boi marruá, boi bufão”, . Procurava enganar o valente bizão e mostrar valentia para os espectadores , conseguiu chegar até a cerca, mas,  chegou tarde,  sentiu na sua traseira uma cravinetada dupla ou um impulso veloz, compacto, agudo e muito forte nos atrofiados glúteos, os chifres lhes acertaram em cheio, a tia decolou   como um teco-teco sem biruta a manobra lhe arrancou a saia, as anáguas e a combinação, de quebra, trouxe como troféu a sua vermelha calçola de brim, fundo duplo de forro grosso e acinturada com cordões de rede. 


Com a setentona jogada contra a cerca ,  as saias lhes cobrindo as enfurecidas narinas, além das vistas vedadas pela calçola o boi ficou acuado, perdeu o rumo, rodava como um peão à procura da presa, o povo gritava, pulava,  o boi atordoado ficou perdido, desorientado, o boi pirou, surtou, o boi endoideceu e rodava como uma cobra cega. 


Apesar do ataqueo boi perdeu a batalha, a Tia Zizinha levantou garbosamente o machucado corpo, ao sacudir a poeira não teve outra escolha, desfilou só de califon e com as vestes de cima três dedos abaixo dos seus dois murchos maracujás,  com a traseira batida e dois vergalhões vermelhos indo até as costas, a tia corria elegantemente para escapar do esbaforido boi. 


Foi o espetáculo do ano, a platéia foi ao chão, os gritos ensurdecedores contagiaram os presentes, a platéia foi ao  delírio e   a tia Zizinha chegou ao estrelato, ao dia de glória. Os narradores com os microfones em punho, muitos ficaram roucos de tanta emoção, foi o maior espetáculo da terra, nos folhetins  a manchete : A CALÇOLA VERMELHA DE TIA ZIZINHA E O BOI QUE PERDEU O RUMO.  



 Daquele dia em diante nunca mais a tia organizou festas, passou a detestar vaquejadas e como vingança comprou o boi bufão, realizando o maior churrasco aberto de minha terra, na Chapada do Araripe não ficou um cristão que não saboreasse uma parte do velho boi e lá a tia  não  compareceu, como troféu  guarda na dita sala a cabeça do boi bobão


Iderval Reginaldo Tenório
Noticias
 1   
Ainda hoje todo boi bravo que aparece nas vaquejadas o locutor brada em voz alta:

___E lá vai o boi que tirou as calçolas de tia Zizinha, o boi dos chifres certeiros, o boi que aposentou tia Zizinha e  complementa a narração com diversas trovas.

menina me da um beijo     só não quero do pescoço,

quero no bico do peito  num lugar que não tem osso,

que é pra quando eu ficá velho  me alembrar que já fui moço.
2
Confesso que não gostei da inusitada cena e nem do inesperado espetáculo, porém,  vibro, vibro, pois não tenho culpa de ser parente de gente famosa e sobrinho da  minha querida, amada  e inesquecível tia Zizinha.
3
Não perco a oportunidade de anualmente participar da maior festa do interior do Ceará, realizado no Parque de Exposição e Vaquejada Tia Zizinha, cujo símbolo é uma cabeça de boi com uma calcinha vermelha nas pontas, cravada com o magestoso TZ maiúsculo.               
O TZ de TIA ZIZINHA.


 Salvador, 20 de Fevereiro de 2008.
Iderval Reginaldo Tenório



A CALÇOLA DE TIA ZIZINHA



                                  A calçola de tia Zizinha



Apesar de franzina tia Zizinha era uma setentona valente, de semblante calmo, de voz firme e olhar seguro. impunhava respeito,    nem só seus sobrinhos, mas todos a chamavam de Tia Zizinha, era ela quem organizava as quermesses, as partidas de futebol, as torcidas organizadas e as festas do milho, quando jovem, ganhou concursos de Rainha da Paróquia, embora pequena e  sequinha, fora a minha tia um verdadeiro furacão ou um vulcão em atividade.


Era dezembro de 1978,  a cidade se achava em chamas , a população duplicada devido a presença dos visitantes para a maior vaquejada da região , cavalos espalhados em todos os recantos e baixios,  bois nos currais, caminhões e caminhonetes enchiam as ruas de chão batido,  carros de som martelando ouvidos, canções sertanejas aproximando os apaixonados, rodas gigantes, canoas, tiro ao alvo e muita comida regional, tudo idealizado, organizado e executado por tia Zizinha.


O relógio marcava 12 horas,  a conversa rodeava a farta mesa do almoço, o papo solto campeava na imensa sala da amada tia, eu, sempre tirado a conversador, iniciei uma discussão sobre a vida, sobre a grandeza do universo, sobre a importância do ser humano e o quanto de orgulho possui uma certa classe social, apesar da insignificância, depois da longa prosa filosófica, em tom de deboche, falei para tia Zizinha:


- Tia, a senhora não vê neste mundão de meu Deus, esses indivíduos que se dizem importantes, bonitos, orgulhosos, cheios de soberbas etc.? Eles e todos nós somos uns bostas, tia Zizinha, somos uns merdas, aliás tia Zizinha, nós e bosta somos a mesma coisa: basta um mosquito, uma bactéria, um vírus, e lá estamos todos nós debaixo do chão, veja tia, nós não somos nada, basta um dia sem um banho, e lá está a inhaca.


Tia Zizinha parou, pensou , matutou e de imediato me falou:


- Nós não, meu filho, me tire dessa corriola,  vocês sim, vocês que estudaram, que se diplomaram, moram e moraram na capital e são doutores podem se considerar bostas, podem se achar uns merdas, porque eu ainda sou um pum: um pum silencioso, um pum sem odor, isto é, um pum fajuto, escondido e que não tem direito a voz,  pra você vê, nem zoada o coitado faz, eu, seu pai e a sua  mãe  somos uns projetos de bosta, ainda falta muito, e nem sei se um dia seremos bosta, acho que daqui para frente , seremos  sempre prenúncios bosta.


Após gostosas e efusivas gargalhadas retruquei:


- É tia, eu não sei por que tanto orgulho, tanto orgulho besta, pois todo mundo do mundo tem por trás uma bunda: umas batidas, outras avantajadas, mas todos têm, todos, todo mundo do mundo tia, tem uma bunda.


Pensei       que havia falado tudo , a tia não concordou e não  contou conversa, com o dedo em riste, abriu a boca e, em voz alta  advertiu a todos que estavam na sala: 


- E ainda por cima, meu filho, ainda por cima, furada,.


Este é o perfil da minha velha tia Zizinha, respostas na ponta da língua e tem para todas as perguntas. 


                                      *****

Agora  voltando à vaquejada, estávamos num pôr do sol de domingo, Tia Zizinha no comando da festa, de vestido vermelho-rodado, chicote de couro cru na mão direita, chapéu de massa na esquerda  e uma  bota cano longo que beirava o joelho, era uma verdadeira amazonas. Ao redor via-se a pista limpa, rapazolas pendurados nos mourões da cerca de madeira, moças de minissaias saboreando maçãs do amor, velhos e crianças nas arquibancadas de tábuas agrestes. As cancelas e os portões fechados, tudo pronto para a abertura do evento.


Sob os aplausos da platéia entra na pista a tia Zizinha, sozinha, descontraída e envaidecida,  com as salvas de palmas era a toda poderosa, a rainha da festa, ali estava a Tia Zizinha em carne, osso e outros predicados, a platéia gritava em coro e sincronizada: “Tia Zizinha!” várias vezes e sempre em som mais alto,  aquele ato poderia se chamar de dia de glória, de labuta, de dedicação, dia  de coroação, Tia Zizinha era mais do que uma  Rainha, era a imperatriz do sertão.


De repente, não se sabe de onde surgiu um boi preto de mais de metro de largura,  ancas largas, chifres em arcos, grandes e  pontudos, bem pontudos, com um aro de cobre nas narinas, cinta de couro apertada no  vazio, olhos avermelhados, narinas bufando que só uma maria-fumaça, com os cascos queria furar o chão, as patadas sobre o solo e o poeirão que subia chamou a atenção do público, o animal não contou conversas, nem gritaria e nem tempo ruim,  partiu enlouquecido e desembestado  pra cima de tia Zizinha.


Imediatamente a tia procurou os portões, todos lacrados, a amazona não titubeou, com seus finos gravetos quis fazer bonito, levantou os braços, mostrou o belo chapéu de massa e rodou o chicote de couro cru sobre a cabeça, quis parecer que tudo fora programado, que aquilo fazia parte do espetáculo, correu para um lado, pulou para o outro, gritou como vaqueiro,  “Vai boi mandingueiro, boi marruá, boi bufão”, . Procurava enganar o valente bizão e mostrar valentia para os espectadores , conseguiu chegar até a cerca, mas,  chegou tarde,  sentiu na sua traseira uma cravinetada dupla ou um impulso veloz, compacto, agudo e muito forte nos atrofiados glúteos, os chifres lhes acertaram em cheio, a tia decolou   como um teco-teco sem biruta a manobra lhe arrancou a saia, as anáguas e a combinação, de quebra, trouxe como troféu a sua vermelha calçola de brim, fundo duplo de forro grosso e acinturada com cordões de rede.


Com a setentona jogada contra a cerca ,  as saias lhes cobrindo as enfurecidas narinas, além das vistas vedadas pela calçola o boi ficou acuado, perdeu o rumo, rodava como um peão à procura da presa, o povo gritava, pulava,  o boi atordoado ficou perdido, desorientado, o boi pirou, surtou, o boi endoideceu e rodava como uma cobra cega.


Apesar do ataqueo boi perdeu a batalha, a Tia Zizinha levantou garbosamente o machucado corpo, ao sacudir a poeira não teve outra escolha, desfilou só de califon e com as vestes de cima três dedos abaixo dos seus dois murchos maracujás,  com a traseira batida e dois vergalhões vermelhos indo até as costas, a tia corria elegantemente para escapar do esbaforido boi.


Foi o espetáculo do ano, a platéia foi ao chão, os gritos ensurdecedores contagiaram os presentes, a platéia foi ao  delírio e   a tia Zizinha chegou ao estrelato, ao dia de glória. Os narradores com os microfones em punho, muitos ficaram roucos de tanta emoção, foi o maior espetáculo da terra, nos folhetins  a manchete : A CALÇOLA VERMELHA DE TIA ZIZINHA E O BOI QUE PERDEU O RUMO.  



 Daquele dia em diante nunca mais a tia organizou festas, passou a detestar vaquejadas e como vingança comprou o boi bufão, realizando o maior churrasco aberto de minha terra, na Chapada do Araripe não ficou um cristãoque não saboreasse uma parte do velho boi e lá a tia  não  compareceu, como troféu  guarda na dita sala a cabeça do boi bobão.

Iderval Reginaldo Tenório
Noticias
 1   
Ainda hoje todo boi bravo que aparece nas vaquejadas o locutor brada em voz alta:
___E lá vai o boi que tirou as calçolas de tia Zizinha, o boi dos chifres certeiros, o boi que aposentou tia Zizinha e  complementa a narração com diversas trovas.
menina me da um beijo     só não quero do pescoço,
quero no bico do peito  num lugar que não tem osso,
que é pra quando eu ficá velho  me alembrar que já fui moço.
2
Confesso que não gostei da inusitada cena e nem do inesperado espetáculo, porém,  vibro, vibro, pois não tenho culpa de ser parente de gente famosa e sobrinho da  minha querida, amada  e inesquecível tia Zizinha.
3
Não perco a oportunidade de anualmente participar da maior festa do interior do Ceará, realizado no Parque de Exposição e Vaquejada Tia Zizinha, cujo símbolo é uma cabeça de boi com uma calcinha vermelha nas pontas, cravada com o magestoso TZ maiúsculo.               
O TZ de TIA ZIZINHA.

 Salvador, 20 de Fevereiro de 2008.
Iderval Reginaldo Tenório

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

O Encontro, Mestre Vitalino

O Encontro, Mestre Vitalino .




O Encontro, Mestre Vitalino .



Nas minhas andanças pelos caminhos do além, deparei com  um sujeito franzino, mulato de meia altura, cabelo baixo, bigode fino   tangenciando o lábio superior e   afastado  das narinas , semblante equilibrado, olhos brilhantes, pescoço ornado com um rosário da mãe de Deus, roupas simples e compostas, alpercata currulepe , atravessado no tórax cruzando-o de um lado ao outro uma capanga de couro cru, o cidadão  olhou para este mortal, mirou os seus  olhos puxados , franziu a testa e indagou pausadamente num linguajar peculiar.


___É vossemecê por acaso  de minha terra? o Nordeste Brasileiro? É vossa senhoria do meu querido Caruaru?


Não titubeei, firme nas palavras e seguro na semântica , firmei os pés no chão e rebati respostando o interlocutor .


 __Sou sim senhor,  a minha descendência vem das Alagoas, lá de Palmeira dos índios , foi plantada na Serra do Araripe  e regada no Juazeiro do meu Padim Ciço.


O mestre num ar de felicidade, de alegria e de contentamento me puxou até um banco de madeira rústica, abriu  a sua capanga e de lá retirou algumas cerâmicas de sua lavra, bois, vacas de leite, famílias de retirantes, violeiros, sanfoneiros, crianças esquálidas, bandas cabaçais , mulheres buchudas, cachorros magros e outras relíquias, olhei uma por uma, peça por peça, rosto por rosto, semblante por semblante, enxerguei olhos puxados, pernas tortas, braços finos, buchos quebrados, bocas abertas, chifres longos e pontiagudos , não me amofinei e nem me constrangi, indaguei.


 ___Mestre,  porque tantos bonecos de caras  tortas, de buchos quebrados , de olhos esbugalhados e pernas tortas? agora todos perfeitos, bem feitos e que retratam o nosso torrão. 


Pacientemente o mestre olha pru além do além, fita os meus olhos , estende os braços, abre as calosas mãos , segura nos meus ombros e me responde.


__Meu amiguinho, a vida é assim, não existe ninguém perfeito, anatomicamente não existe um só vivente igual ao outro, todos os vivos da terra tem  diferenças, porém, são todos normais, cada um traz uma particularidade, uma peculiaridade,  uns são baixos, outros altos, uns  magros e outros gordos, uns tem a cara fechada, as pernas finas, os braços cumpridos, nariz afilado , outros achatados, é a diversidade da vida meu amiguinho, porém, todos são normais, todos são diferentes, todos são normais.


Parei , fiquei pensando nas suas  palavras, viajei no tempo, lembrei de cada amigo, de cada sotaque, dos costumes, dos rompantes, das vozes mansas , das estridentes, das guturais monossilábicas , de cada animal e  de cada olhar da minha infância, veio à tona a variedade de pessoas, das vestimentas, dos olhares e dos comportamentos, continuei a minha inquirição.


__Mestre, porque  os bonecos dos outros artesãos não possuem os mesmos semblantes? não emanam os mesmos lampejos de vida  e nem nos tocam com tanto vigor?


O mestre se ajeitou no banco, pegou uma peça , lançou o sereno  olhar e mansamente falou.


___Tem meu amiguinho, são perfeitos, são feitos do mesmo barro, da mesma maneira que faço, tem mais, todos os artesãos daquela paragem, todos eles passaram por este velho, se aperfeiçoaram na minha oficina,  quando estavam durinhos e capazes de voar , eu soltava na praça e logo logo chegavam outros, todos trabalham com a alma e com os sentimentos, todos me representam e pregam o meu legado lá na terra, muitos dos seus bonecos são mais perfeitos do que os meus, nascem mortos e vão ganhando vida , com o tempo, com o amor  e com o conhecimento eles vão adquirindo e incorporando uma alma , eles irão retratar os viventes viventes com as suas diferenças, uns com o bucho grande, outros com as pernas finas, alguns alegres, outros com semblantes assombrados, é a vida e só o  tempo é capaz de mudar o homem, só o tempo e a humildade  lhes devolve  a alma.


Acordei , procurei o mestre Vitalino , aquele silencio, nenhuma alma viva , levantei a cabeça e de longe  na última prateleira da minha folclórica estante enxerguei o mestre nas suas peças , um boi , uma vaca, uma banda cabaçal, dois médicos operando um cristão e uma família composta de um velho ,  uma mulher buchuda, um menino e uma menina de calças curtas, um jumento com as tralhas nas costas e um cachorro como guia, balbuciei o meu bom dia, cumprimentei o artesão , fiz o sinal da cruz , tomei o caminho da roça e iniciei mais uma lida, nunca mais contestei a diversidade da vida. 

Mestre Vitalino, aquele abraço, apareça mais, venha tomar um café, da próxima vez convide o imortal João do Pife.


Iderval Reginaldo Tenório


Dois grandes monstros do folclore brasileiro, João do Pife de Arapiraca ao lado do Prefeito e logo abaixo o mestre Vitalino de Caruaru.




João Bibi dos Santos, conhecido como João do Pife, morreu na Santa Casa, em Maceió, vítima de falência múltipla dos órgãos. No velório e no sepultamento, em Arapiraca, emoção e tristeza marcaram a despedida do artista popular.
Filho de agricultores, João do Pife aprendeu a tocar pífano ainda criança, quando ajudava os pais nas lavouras de fumo, em Arapiraca. Dono de uma musicalidade ímpar e autodidata, o menino logo começou a ganhar fama e a ser reconhecido pelo talento.
Do final da década de 1960 até o final da década 1980, João do Pife viveu a fase áurea de sua carreira, realizando shows por todo o Brasil, acompanhando o humorista Coronel Ludogero e tocando com artistas de renome como Luiz Gonzaga e Dominguinhos, João do Pife tornou-se um ícone da Cultura Popular.
João do Pife gravou inúmeros discos de vinil e foi considerado por Hermeto Pascoal um gênio da arte de tocar o pífano. No ano passado, aos 78 anos de idade, foi homenageado pela Prefeitura de Arapiraca, recebendo das mãos do prefeito Luciano Barbosa o troféu Arraiá da Integração, em reconhecimento à preservação da música de raiz e cultura popular


Vitalino Pereira dos Santos (Ribeira dos Campos, Caruaru PE 1909 - Alto do Moura, Caruaru 1963). Ceramista popular e músico. Filho de lavradores, ainda criança começa a modelar pequenos animais com as sobras do barro usado por sua mãe na produção de utensílios domésticos, para serem vendidos na feira de Caruaru. Ele cria, na década de 1920, a banda Zabumba Vitalino, da qual é o tocador de pífano principal. Muda-se para o povoado Alto do Moura, para ficar mais próximo ao centro de Caruaru.

01- A FEIRA DE CARUARU - Luiz Gonzaga - 50 anos de ...

www.youtube.com/watch?v=S0a38es0mrI



09/05/2011 - Vídeo enviado por forrobodologia
Luiz Gonzaga - 50 anos de chão - disco 4 FONTE: http://www.forroemvinil.com Esta música faz parte do 


Não confundir com o João do Pife de Caruaru  que é hoje omaior tocador de Pífano do Mundo.

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José Alfredo Marques dos Santos completará 71 anos no próximo dia 20 de junho. Nascido emRiacho das Almas, no Agreste pernambucano, ele ficou conhecido como João do Pife, por ser mestre na arte de fazer e tocar o pífano, instrumento de sopro. Neste ano, ele deve comemorar o aniversário de maneira especial: é um dos homenageados do São João de Caruaru, município onde foi criado.