Tânia Menai, de Nova York
África
É verdade que, em algumas regiões do mundo, se retira o clitóris das mulheres?
Sim. A clitoridectomia, como é chamada, é um ritual de
passagem, ou iniciação, praticado na África, Oriente Médio e sudeste
asiático há 2 000 anos. O objetivo é evitar que a mulher tenha prazer
sexual. As vítimas em geral são bem jovens – entre uma semana e 14 anos –
e os tipos de extirpação variam. Pode ser retirado desde uma parte do
clitóris até os pequenos lábios da vagina. As operações são seguidas de
muita dor e sangramento.
Como são feitas em condições precaríssimas de
higiene, com tesouras, facas e navalhas, o número de infecções é muito
grande e boa parte das mulheres operadas torna-se estéril. Está provado
também que a prática não traz nenhum benefício para o organismo
feminino. A Organização Mundial de Saúde estima que entre 80 e 114
milhões de mulheres já passaram por esse ritual macabro.
O número de
mortes decorrente é desconhecido, pois as tribos não acreditam que a
prática possa matar alguém, o que dificulta a contabilidade. É uma
prática ligada aos costumes dos povos, sem relação direta com a
religião. Não é verdade que o Alcorão (a bíblia islâmica) defenda o
costume.
Para o Ocidente essa prática é chocante. Mas não é assim nas regiões
onde é praticada. A mulher é totalmente submissa e os povos que fazem a
clitoridectomia acreditam que ela ajuda a manter a virgindade das
solteiras. Além disso, reforçaria a identidade do grupo. Apesar da dor
após a operação e da humilhação, as mulheres não se atrevem a reclamar.
“Quando perguntadas sobre o conhecimento das leis dos Direitos Humanos,
elas respondem que apenas conhecem as leis dos maridos”, diz a queniana
Wanjira Muigai, advogada do Sindicato das Liberdades Civis Americanas,
que hoje reside nos Estados Unidos. O nível de educação nas regiões onde
há clitoridectomia é muito baixo. Por isso é praticamente impossível
convencer as mulheres, e principalmente os homens, de que essa prática
prejudica a saúde. Tentativas já foram feitas. Os colonizadores cristãos
do Quênia, em 1930, criaram leis proibindo o ritual. Foi em vão. A
legislação que continuou a ser obedecida foi a da tribo.
Se alguma
mulher tentar fugir dela, o mínimo que vai acontecer, além de sofrer
pressão social, é não conseguir um marido.
200 milhões de crianças e mulheres sofreram mutilação genital no mundo.
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Cerca de 200 milhões de crianças e mulheres foram
vítimas de mutilações genitais no mundo, segundo um relatório divulgado
nesta sexta-feira (5) pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a
Infância). Em países como Somália, Guiné e Djibuti, na África, até 98%
das mulheres sofreram excisão, como é chamada a extirpação do clitóris.
Entre as vítimas, 44 milhões são meninas com 14 anos ou menos. Na maioria dos 30 países que realizam excisão infantil, a mutilação aconteceu antes dos cinco anos da criança.
“Em lugares como Somália, Guiné e Djibuti, essa prática atinge quase todas as mulheres”, destacou Claudia Cappa, diretora do estudo. O índice de mutilação das mulheres nestes países é de 98%, 97% e 93%, respectivamente.
Avanços lentos contra a mutilação feminina
“Nós precisamos apoiar os esforços locais para acabar com essa prática”, frisou Cappa. Desde 2008, mais de 15 mil comunidades abandonaram as mutilações genitais femininas, das quais 2 mil só no ano passado. Cinco países adotaram leis que criminalizam o ato: Quênia, Uganda, Guiné Bissau e, mais recentemente, Nigéria e Gâmbia.
Os dados foram divulgados na véspera do Dia Mundial de Luta contra a Excisão, 6 de fevereiro. O número de vítimas subiu 70 milhões, em relação às estimativas feitas em 2014, no relatório anterior da Unicef.
Traumas da excisão ficam para o resto da vida
“Esse é o combate da minha vida”, resume a maliana Madina Bocoum Daff, 60 anos, que há muitos anos luta para acabar com a prática. Mutilada na infância, ela afirma que as consequências físicas e psicológicas desse costume tradicional nos países africanos ficam para o resto da vida das mulheres.
A hoje coordenadora do programa de luta contra a excisão da ONG Plan International não lembra com que idade foi mutilada.
Antigamente, o ritual acontecia na puberdade das meninas.
Madina relata ter sido vítima do pior tipo de excisão, a que além de extirpar os órgãos femininos externos, também costura a abertura vaginal para deixá-la mais estreita. Por isso, no casamento, as jovens devem passar por uma segunda mutilação para reabrir o órgão - uma intervenção que, com frequência, é feita a faca, sem anestesia e em péssimas condições de higiene.
“É um choque, uma dor que a gente guarda para toda a vida”, sublinha Madina, lembrando que, em cada um dos seis partos, voltou a sentir dores ainda mais insuportáveis. Entre outras complicações possíveis, a excisão também provoca incontinência urinária nas vítimas.
Com informações da AFP
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