Este Texto foi produzido quando completei 07 anos de Medicina e fiquei preocupado com o destino dos nossos idosos , pensei que ainda no fim do século XX o ser perderia em parte para o ter, perderia à proporção que ocupações importantes fossem embutidas nas vidas dos filhos educados pelo suor dos seus genitores, educados às custas de muitos sacrifícios , resignação e humildade.
Imaginei um mundo repleto de casas de idosos e os filhos quando bons , custeando. Imaginei também que muitos seriam abandonados e como medida de segurança enviei aos poderes públicos uma carta perguntando se não seria criado um manual, um regimento, um estatuto para proteger os desprotegidos do futuro.
Sempre falei e ainda falo para todos que me escutam , que no futuro além dos menores abandonados , serão milhares de idosos no abandono.
Brevemente o Brasil será habitado por cidadãos acima dos 60 anos .
Fui informado que tramitava no Congresso o estatuto do idoso e o estatuto do adolescente, fiquei mais tranquilo, apenas mais tranquilo.
Iderval Reginaldo Tenório
o blog é cultural
O FILHO QUE NÃO PROSPEROU
Outro dia numa roda de amigos num gostoso
bate-papo foi abordado o quanto era importante para cada um de nós: o olhar, o cheiro, os conselhos e a presença
dos insubstituíveis pais.
Num caloroso e contagiante momento contou um dos amigos a seguinte
história que passarei para os meus caros leitores.
Contou o amigo que na sua cidade havia um bom senhor oriundo de classe
social muito baixa.Apesar do seu
analfabetismo, com a sua vasta cultura e o suor do seu próprio rosto conseguiu
educar os seus 15 filhos.
O tempo passou, os filhos cresceram, alguns galgaram postos importantes
na sua nação e o bom senhor à proporção que ganhava conhecimentos foi
envelhecendo. Envelhecendo com saúde, com
dignidade, com cidadania, envelhecendo com o respeito de todos os que lhe
rodeavam. Como é peculiar à família Nordestina , aquela não fugira à regra
e ano após anos procurava através de encontros familiares lembrar ao velho
carvalho o seu incalculável valor, a sua importância e o quanto era cabal a sua
existência para a sua prole.
Numa grande comemoração familiar
o velho e bondoso pai sentia o calor, o carinho, a compaixão e quão importante
a sua existência para a sua prole. De
todos os seus filhos, um havia voado
mais alto e galgado postos estratégicos na sua República, o tempo passava e
todos os filhos, netos e bisnetos compartilhavam
felizes momentos, de regra, a falta daquele que galgara postos importantes, posições
invejadas por seus pares, aquele nunca estava presente devido a sua importância
perante a nação e muitas vezes nomeava irmãos
e até mesmo amigos para lhe
substituir nestes encontros familiares, jamais negara ajuda financeira quando
solicitado e sempre influente nas questões decisórias da família.
O tempo passou.O ancião foi
perdendo as forças, os músculos foram minguando, os cabelos ficaram ralos, a
mente foi ficando curta, murchando e o bom homem foi paulatinamente perdendo a
memória.Perguntava onde estava, muitas vezes perguntava até mesmo quem ele
era.E a grande e tradicional família continuava nas suas comemorações, anos
após anos; e anos após anos o filho era
substituído por outro irmão ou por um dos seus amigos, até o dia em que
foi convocado, aliás, intimado, notificado
a comparecer ao 99o- aniversário do patriarca por todos os componentes daquela feliz e
honesta família.
Ao chegar, entrou no quarto do seu genitor, se aproximou e disse:
__A bença pai.
O velho imobilizado nada
respondeu, repetiu mais alto:
__ A bença pai .A bença pai.
O velho abriu os olhos, mexeu com
o pescoço de um lado para o outro, fez esforço para levantar a cabeça, mirou o
rosto do seu filho e com a voz trêmula balbuciou:
__Quem é você?__ DE ONDE VOCÊ VEIO?__ONDE VOCÊ MORA?__ QUEM É
O SEU PAI?
O filho parou,
pensou, baixou a cabeça e disse:
__ A BENÇA PAI, EU SOU O SEU FILHO, o seu
filho do meio, é que faz mais de 20 anos que não vejo o senhor, faz mais de 20
anos que não venho na nossa terra.
O pai mais uma vez falou:
__quem é você, de onde você veio, onde você mora, você é filho de
quem, quem é o seu pai? Eu te abençôo, mas não sei quem é você, se você diz que
é meu filho é porque é meu filho, porém
eu não me lembro de você.
Desencantado pelo vasto tempo que havia visto o pai, com a amnésia paterna e decepcionado com o que presenciara não
conseguia entender o que se passava, quando mais tarde soube por intermédio dos outros
irmãos, que o seu pai num processo fisiológico fora perdendo paulatinamente a
capacidade de memorizar, de verbalizar e de locomoção, passando a lembrar
apenas dos fatos repetitivos, dos rostos do seu cotidiano, do seu cachorro, da sua aparadeira e das pessoas
que de mais perto convivera nos últimos dias.
E numa
onda de culpa e de irresponsabilidade, entendeu que o pai devido a sua ausência havia apagado da
mente quaisquer resquícios ou lembranças de sua existência, havia apagado
de sua mente até mesmo a legitimidade paterna.Entendeu também que foi a sua ausência,
a sua distância e o seu descaso para
com o velho e bondoso pai que apagara toda a sua existência como
filho.
Desconfiado,
deprimido e solitário partiu para a conquista, para luta, para
briga, se esforçou, porém, o velho e bondoso senhor aos poucos foi apagando da
mente os dados e imagens cerebrais, aos poucos foi esquecendo, esquecendo, esquecendo...
até o dia em que não mais lembrava nem de si, até o dia em que entrou em estado
vegetativo.
Com os
fatos presenciados o filho passou a
entender que o seu pai precisava era de abraços, amor, carinho, de respeito e
de sua presença e não de ajuda financeira. Foi-se o velho, com ele foi
sepultado todas as suas memórias e conhecimentos, restando
as boas lembranças e os seus
ensinamentos.
Para o filho ficou a certeza
que foi 20 anos atrás o último dia que o seu pai lhe viu, ficou gravado na sua memória que os
seus filhos não eram netos do seu pai e mais claro ainda que o homem é a mente,
o respeito, o homem é a comunicação, o homem é fruto de sua raiz e que o núcleo
familiar jamais perderá a sua importância, jamais será substituída e por
mais longe que o homem vá as suas raízes
serão mais fortes, serão os sustentáculos de sua vida.
Seja mais família, seja mais filho, como
também pai dos seus pais. A vida assim será melhor e o mundo com certeza lhes reservará melhor destino. Nunca esqueça
dos seus...
24 de Janeiro de
1989
Iderval Reginaldo
Tenório
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