.
O VAQUEIRO E O SEU CACHORRO TRIGUEIRO.
CAUSOS DA SERRA DO ARARIPE
O pescador tem a pecha de acrescentar algo nas suas pescarias, pesca um lambari e diz que pegou um tubarão, uma piaba e fala sem ficar com a cara vermelha que era uma baleia, jura de pés juntos que pelo tamanho, era um filhote e ainda tinha a anjuda de um tapiador para confirmar. Lembram do "É MENTIRA TERTA!?" "VERDAADE!".
Quando menino, na minha Chapada do Araripe, tinha um vaqueiro, que não vou citar o seu nome, que diza que conversava com o seu cachorro trigueiro e todo mundo ria da cara dele, inclusive falava que o trigueiro sabia ler o tempo, os fatos e conhecia os fenômenos da natureza, sabia quando iria chover e conhecia o trincolejar de cada chocalho, sabia até qual o animal que estava com ele no pescoço.
Muitas vezes lhe informava se o animal estava morto ou vivo pelo tilintar do chocalho, e o levava até ao animal sem vida ou com um membro quebrado.
Uma vaca, um bezerro ou um boi picado por uma cascavel ou em apuros, o trigueiro não falhava, todas as suas chamadas eram verdadeiras.
O que impressionava era que ele sabia se era um bezerro que ainda mamava ou um animal adulto, pois a vaca ficava pulando de um lado para o outro, a revelar que o problema era com a sua cria e o trigueiro ficava atento e agitado nestes casos.
Dizia que, quando algo de estranho acontecia, logo pela manhã, o trigueiro ficava na calçada de orelhas levantadas e focinho ativo, depois ficava de pé, entre latidos e rosnados, chamava o vaqueiro para lhe acompanhar. Entrava na capoeira e só parava no cadáver, no moribundo ainda quente ou num animal em apuros. O Trigueiro era um animal sábio, um orientador, o povo dizia: " ESTE CACHORRO É UM FEITICEIRO".
Ninguém tinha a audácia de falar mal do vaqueiro na presença do cachorro, era tiro e queda, no mesmo dia o homem sabia de tudo. Iam até a casa do fuxiqueiro, ele o cachorro, este não tirava os dois olhos brilhosos e mirava os olhos do falador, com receio e assombrado, apenas confirmava o que havia dito, depois divulgava para toda a serra o episódio, isto reforçava a fama que o cachorro era realmente feiticeiro, adivinhão ou a encarnação de uma alma penada.
Certo dia, o vaqueiro adoeceu, o patrão e amigo o levou para Juazeiro do Norte, o cachorro trigueiro entrou em banzo. Não comia e nem latia, ficava com o olhar perdido, orelhas baixas, focinho colado ao solo, sem balançar o rabo, ficava a cochilar debaixo da rede do seu tutor, que sempre ficava armada e só era lavada de tempos em tempos, para o trigueiro, aquela rede impregnada de suor era o próprio vaqueiro.
Numa noite, sem de nada saber e passado mais de dez dias, o trigueiro se levantou, disparou a latir e a andar em círculo. Latiu tanto que os demais moradores foram até a casa do vaqueiro. A sua esposa aos 80 anos caiu em prato, algo aconteceu e pela manhã, todos aboletados defronte ao rádio de pilha, na casa do irmão do seu patrão, a Rádio Iracema de Juazeiro do Norte anunciou a fatídica notícia. É bpm frisar que naquela época eram as as ondas curtas do rádio os mais modernos celulares e assim se pronunciou o locutor Alceli Sobreira:
"Atenção, atenção todos os amigos da Serra do Araripe, o senhor FULANO DE TAL ... informa que o Vaqueiro da Fazenda Alvorada, senhor BELTRANO DE TAL faleceu ontem à noite em Juazeiro do Norte, onde encontrava-se internado por mais de dez dias".
No fim da mensagem Pedíu que avisassem a todos para participar da Missa de corpo presente, o patrão levava um padre amigo para celebrar o evento, e depois particpar do enterro que será colado à capelinha, junto a casa que o mesmo morou por mais de 80 anos, pois quando os seus pais morreram ele continuo na mesma casa.
Depois do enterro, o cachorro trigueiro se deitou por cima da cova e durante 30 dias não comia, apenas bebia, até o dia que foi cavado uma nova cova e sepultado o Trigueiro ao lado do seu companheiro de longa s datas, apenas couro e osso.
Dizem os moradores de hoje, que não passam por este local, muitas vezes escutam o aboio do vaqueiro e o latir do Cachorro Trigueiro. Isto aconteceu na minha Chapada do Araripe e eu juro que não sou pescador.
Iderval Reginaldo Tenório
Nenhum comentário:
Postar um comentário