quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

JOQUINHGA E A MAE PASSADERIRA

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JOQUINHA E A PASSADEIRA DO SÃO JUDAS TADEU . 

DEPOIMENTO.

                                        
A minha mãe ganhava a vida com muitas dificuldades, trouxas e mais trouxas de roupas para lavar e passar, geralmente brancas, naquela época não existia elergia elétrica no bairro. 

O quintal da minha casa sempre parecia com a época de São João, era cheia de camisas e calças brancas, como se fossem bandeirolas a  flamularem nos longos e grossos  cordões de algodão ou de nylon.

Eu era muito pequeno,  os meus irmãos eram  dois ou três anos mais mais velhos do que eu, ficavam a vigiar este grande quintal,  que era cercado com arame farpado, não para coibir  roubos, pois quase que não existiam no nosso bairro e nem naquela época. Os amigos do alheio eram raros, raríssimos, parece que o povo tinha mais vergonha, o principal cuidado dos meus irmãos era com os pássaros que vinham beliscar as mangas, as goiabas e os sapotis do pequeno pomar, como também para espantar os sagüins, os sariguês e os  gambás que habitavam as frutíferas árvores,  e que de vez em quando largavam os seus dejetos que manchavam as roupas brancas, que de imediato a minha cuidadosa e limpa mãe lavava outra vez.

As roupas brancas eram de pessoas importantes da cidade, pessoas da sociedade, como falávamos, geralmente a minha mãe  pegava num dia e depois de  limpas, cheirosas, alvas   de arder  nos olhos e muito bem passadas,   as devolvia aos donos dois ou  três dias depois, quando não chovia. Eram roupas preciosas, delicadas e finas,  lembro que o capricho maior era com os punhos e com os colarinhos, nestes detalhes a minha mãe era exageradamente exigente.

No dia da entrega,   Dona Detinha , minha mãe, fazia questão  que eu , o filho mais novo, a acompanhasse, isto porque enquanto ela lavava  e  os meus irmãos  vigiavam, ficava eu atento aos livros , lendo, escrevendo, cantando, dançando e  brincando de gente grande, brincando de gente importante, de pessoas da sociedade , ora como médico, ora como industrial e muitas vezes como o prefeito da cidade, nestes momentos sempre falava para a minha mãe, a  lavadeira,  que quando eu crescesse iria ser um cidadão de estudos e de posição,  em vez de lavar as minhas roupas, iria ter condições de pagar  para lavá-las e passá-las, dizia também que  além das roupas brancas iria possuir muitas roupas , paletós e sapatos de todas as cores e de diversos modelos, porém as camisas  na sua grande maioria seriam da cor branca, repetia também para a minha mãe,  que iria lhe presentear com uma confortável e grande casa bem mobiliada, com tudo que a mesma quisesse num bairro de primeira, além desta façanha a mesma teria bons, inteligentes e estudiosos netos. 

O segredo para a realização deste sonho estava na escola e isto eu tinha convicção, com estes predicados todos os patrões  da guerreira matriarca queriam me conhecer, e conheci muitos, todos eram homens importantes e gostavam de minha  prosa, foram eles quem atentaram para este meu pensamento. 

Um dos patrões, um senhor mais velho e de cabeça branca, conseguiu uma boa escola para mim como bolsista, acho que a escola era  de um dos seus filhos , outros me presentearam com livros, cadernos, canetas, lápis , uma bolsa de couro nova, tênis de pano ,  por conhecer a condição de minha  família providenciaram uma alimentação básica, isto até os 17 anos , uma vez que ao completar  18   não mais aceitei as ajudas, pois já me considerava um adulto e é muito feio , desonesto e vergonhoso um adulto ser sustentado por outro, nem mesmo pelos seus pais, salvo por tradição familiar e se possuir uma boa condição financeira, nesta época consegui  um emprego no escritório do pai do dono da escola, um grande advogado . No escritório  passei a conviver com grandes homens , alguns empresários, médicos, engenheiros e professores, aquilo atiçou a minha mente e dei prosseguimento aos estudos. 

Hoje a minha mãe  está com 70 anos de idade, mora na sua bela e confortável casa própria, muito bem mobiliada e num bairro onde moram os seus antigos patrões, hoje muitos lhe chamam  de comadre. 

A dedicada Detinha  não cansa de ajudar os sobrinhos, os vizinhos do antigo bairro e os seus netos, quase todos cursando ou no rol da Universidade. 

A minha esposa  trabalha num grande hospital e no seu consultório, tem uma bela e fiel clientela oftalmológica, eu sempre faço algumas viagens a trabalho. Nesta semana darei uma conferencia  numa  empresa de engenharia que atua na geração de energia, pois o meu projeto foi aprovado e foi o vencedor de uma licitação num país da Europa. Os diretores querem saber mais sobre  os novos  sistemas de produção de energia limpa, eólica e solar,  querem implanar nos parques industriais.

 Peço a minha bênção a minha mãe e deixo um recado para os  jovens de qualquer nível social:  Força de vontade, coragem, perseverança, respeito, juízo e muito trabalho são  os únicos caminhos  para os que querem crescer socialmente  na vida com ética e cidadania.

Deixo um forte abraço  com muito carinho e esperança para todos os amigos.  A todos muita sorte nos estudos e relembro:

 Para o pobre só existe um  caminho, a Escola,  isto, para que não fique na mente de cada um, que filho de gato tem que ser gatinho, no reino irracioonal sim, porém na raça humana é diferente,  quem manda e comanda  é o cérebro e  depende de cada um, principalmente do seu proprietário.  Mesmo sabendo que tem uma casta que diz em  voz alta que : "FILHO DE GATO,  GATINHO SERÁ", não é verdade.  Na minha convicção na raça humana é diferente, filho de gato pode evoluir para qualquer animal, tanto pode regredir ou evoluir  para  leão, elefante, um tigre de bengala, baleia, águia e até mesmo para um tubarão, vai depender da escola, da  força de vontade, da   coragem, da incansável busca e dos poderes públicos. 
 
Do amigo Joaquim, que quando criança  era chamado de  Joquinha de dona Detinha,  a lavadeira do bairro São Judas Tadeu.

Joaquim de dona Detinha
Salvador, 15 de Outubro de 2016
Iderval Reginaldo Tenório

FOTOGRAFIA 3 X 4 - BELCHIOR - YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=UyYH1biSlBY
11 de jun de 2010 - Vídeo enviado por vangodias
ALUCINAÇÃO (1976) PHILIPS/PHONOGRAM - O SEGUNDO E MELHOR ALBUM DE BELCHIOR.

Um comentário:

Cláudia Carneiro disse...

Aqui chegou ao coração de uma época. Há uma fonte interior. Assim.