O FILHO QUE OS PAIS BOTARAM A PERDER
HISTÓRIA QUE MINHA MÃE CONTA
Conta a minha mãe, que numa delegacia encontrava-se preso um jovem de
18anos de idade e que levava surras diariamente. Diziam os seus
algozes que eram surras corretivas e necessárias para aqueles que se
apoderam do que é dos outros.
Certa manhã este jovem chamou chamou o delegado e pediu suplicamente a presença de seus pais, principalmente da sua mãe.
O delegado, após relutância, resolveu atendê-lo. Providenciou e fez chegar até o presidiário os seus genitores.
Chegaram, foram até à sala do delegado, houve a identificação e por último adentraram à cela do infeliz adolescente.
Em
respeito aos pais, o delegado informou que se retiraria para um melhor
diálogo familiar, quando de repente, num rompante incompreensível disse
o jovem ao delegado, que aquela atitude não era a desejada, inclusive
queria que o delegado convocasse todos os seus algozes para ouvir e
presenciar aquela visita, e assim foi procedido.
Quando todos encontravam-se na sala, o presidiário começou o seu relato
Sentado, voz trêmula e baixa, olhos em lágrimas e moralmente
abatido, lamentou a sua atual situação, o seu estado educacional, a sua
personalidade e os conceitos sedimentados em sua mente, todos aprendidos
e praticados durante toda a sua existência.
Quando de repente, mais do que de repente, levantou-se, arregalou os
grandes olhos, trancou a cara e com o dedo em riste apontado para os
pais, vociferou:
"Velhos moleques, safados, descarados, desonestos, irresponsáveis vejam como me encontro hoje"
O delegado fez menção de intervir, o jovem retrucou:
"Não
seu delegado, não senhores soldados, eu preciso falar, eu preciso dizer
alguma coisa. Vejam o filho que eles botaram no mundo e como
criaram, vejam como hoje me encontro, preso como se fosse um bicho
selvagem e alheio à socialização.
Fez uma pausa e continuou:
"Velhos levianos, o que os senhores faziam quando eu chegava em casa
com carrinhos e brinquedos não comprados pelos senhores, bolas que o
senhores nem sabiam de onde vinham?. O que faziam quando eu saía, dizia
que ia estudar e os senhores nunca, nunca foram até a minha escola,
não queriam saber como estavam as minhas notas, nunca foram conversar
com os professores, nem sabiam onde eu estudava, aliás nunca se sentaram
para me orientar"
Parou, respirou e com o olhar distante deu continuidade ao seu relato:
"Depois , com 14 anos, quando não dormia em casa, dizia que
dormia nas casas dos amigos e os senhores nunca questionaram quem eram,
onde moravam, o que faziam e quem eram os seus pais. Comecei a trazer
para casa bicicletas, relógios, roupas bonitas e produtos alimentícios,
os senhores comiam satisfeitos, enchiam a pança e não perguntavam de
onde vinham, como eram adquiridos. Assistiam tudo quanto era
porcarias na televisão e achavam que eram corretos: filmes de assaltos,
roubos, sexos e falcatruas . Votavam em homens conhecidamente desonestos, muitas vezes desmascarados pela mídia e achavam que este
comportamento era normal.
Quantas e quantas vezes chegavam os
cobradores e os senhores diziam : " Diga que não estamos, que estamos
trabalhando, que não sabe a hora que chegaremos".
Seu
delegado eu nunca esqueço de um fato muito vergonhoso. Um dia cheguei
em casa, eu tinha 14 anos, quando minha mãe me disse:
"Filho, pule o muro de seu Idelfonso, o vizinho, pegue uma galinha".
O Velho logo retrucou: "Cuidado, bote uma mão no bico e a outra nas asas para não fazer zoada"
:
"Seu delegado, tirei a minha sandália e pulei aquele muro como se fosse
um gato. Peguei a galinha silenciosamente para não perturbar as outras e
nem seu Idelfonso, voltei para casa; mãe e pai já estavam com a água no
fogo para pelarem a galinha. Pelaram, botaram as penas num saco e
mandaram jogar lá do outro lado da rua, lá embaixo, bem longe, para que
não houvesse nenhuma desconfiança por parte do vizinho. Comemos a
galinha e no outro dia seu Idelfono foi até a minha casa, estava eu, meu
pai e minha mãe, indagou se haviam visto uma galinha e eles de
imediato, na bucha foram logo dizendo.
"Nem
de galinha nós gostamos, aqui há muito que não se come galinha".
Fiquei
impressionado com tamanha mentira, fiquei de boca aberta e achava que
era certo.
"Seu delegado eu mereço apanhar, eu mereço
surras e mais surras, pois naquela época se os meus pais tivessem boas
atitudes, me corrigido, puxado as minhas orelhas, me dado umas boas
correções, até mesmo corretivas surras, pequenas surras simbólicas e
sem raivas, surras merecidas, se falassem a verdade tenho certeza que
não seria o indivíduo que sou hoje. Hoje eu sou um moleque, um
safado, ninguém me respeita, hoje não compreendo o que é ética, vivo à
margem.
"Seu delegado pode bater, eu mereço E aos senhores
velhos desequilibrados vou perdoar, porém sumam de minhas vistas,
desapareçam, puxem de minha vida velhos irresponsáveis."
O delgado e os soldados após este relato foram abaixando as cabeças, diminuindo de tamanho, atônitos e pálidos levaram os lenços até os
olhos, enxugaram os prantos, alguns foram saindo e o delegado em voz
trêmula disse:
"Soldados, o homem tem cura, o homem não é
tão ruim como se pensava, o garoto tem jeito, não foi bem orientado, o
problema foi no seio familiar, Menino a partir de hoje tu terás um pai,
uma mãe, irmãos e uma família, terás um lar".
Iderval Reginaldo Tenório
Esta
história, foi minha mãe que me contou, para justificar muitas vezes os
tratamentos duros que muitos pais dão aos seus filhos para a formação do
homem, principalmente no seio familiar, para que os pais não fiquem
traumatizados diante dos modernos conceitos psicológicos impostos aos
pais e que muitas vezes são insuficientes, proporcionando o desvio de
comportamentos, condutas e éticas do jovem de hoje.
Enfatiza a minha mãe que, primeiro o diálogo, depois o dialogo, por último o
diálogo, na sua ausência, o amor dos genitores : corretivos mais
duros.
Um dia os filhos agradecerão e como agradecerão.
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