o BELO ARTIGO DO BRUNO FARIAS LOPES
NÃO SEI O PORQUÊ DA ALEMANHA ESTÁ TÃO DURA COM A GRÉCIA, ELA FOI BENEFIANDA EM 1953, CONHEÇAM ESTE FATO.
NESTE BELO ARTIGO DO BRUNO FARIAS LOPES
O perdão à Alemanha em 1953
A Alemanha beneficiou de um acordo muito generoso em 1953 - mas os incentivos dos credores estavam totalmente alinhados com os seus.
No dia 27 de Fevereiro de 1953, em Londres, depois de seis meses de reuniões, a República Federal da Alemanha chegou a acordo com os credores para a redução de cerca de metade da sua dívida externa. A Conferência de Londres foi um passo histórico – a Alemanha ficava liberta de um grande obstáculo no caminho da estabilização política e económica. Numa altura em que do Syriza ao insuspeito economista alemão Hans-Werner Sinn se somam vozes a falar no acordo de 53 para pedir uma “conferência de dívida”, vale a pena perceber duas coisas: como funcionou o acordo e quais os incentivos políticos.
O acordo de Londres resultou num perdão de 46% da dívida anterior à Segunda Guerra Mundial e de 51% da posterior. Em termos médios foi um perdão de cerca de 50% da dívida externa. O acordo foi muito abrangente: incluiu praticamente toda a dívida pública e privada (mesmo as verbas do Plano Marshall). Do perdão ficaram de fora dois bolos: os montantes a pagar em reparações a Israel e a comunidades judaicas refugiadas noutros países; as reparações aos países invadidos.
O receio dos credores de que as reparações aos adversários de guerra levassem ao incumprimento fizeram, contudo, com que também esta “dívida” ficasse por pagar. Além do “perdão” foram definidos alívios adicionais. Por um lado, uma redução significativa das taxas de juro na dívida remanescente (17% passou a estar isenta de juros, 38% pagava apenas 2,5%). Por outro, um período de carência de cinco anos, no qual os credores podiam escolher receber o juro ou o capital até um determinado tecto. Com o país ainda a renascer das cinzas os credores deixaram de lado contrapartidas rígidas de “ajustamento estrutural” (o plano Marshall, no entanto, tinha significado contrapartidas duras para uma Alemanha tutelada pelos aliados).
O serviço da dívida seria financiado em exclusivo pelos excedentes comerciais futuros, facilitados por um marco desvalorizado. O acordo foi, por isso, muito generoso, sobretudo quando falamos do país causador da guerra - e de atrocidades a uma escala nunca antes vista. Porque razão foi dado este tratamento à Alemanha? Os alemães sentaram-se à mesa com cerca de 20 credores (incluindo a Grécia), mas quem liderou o processo foi uma das potências vencedoras da Guerra: os Estados Unidos. Para os americanos, o incentivo era fortalecer um país que estava na linha da frente da Guerra Fria – a Alemanha não só não podia tornar-se dependente da ajuda americana, como deveria ser uma montra da economia de mercado. Os alemães, com soberania limitada, aproveitaram a sua posição geopolítica.
A conferência de Londres serve para percebermos o óbvio: na dívida, uma reestruturação não pode ser separada do contexto político e dos incentivos dos credores. E, no caso da zona euro, os incentivos de credores e devedores não estão tão alinhados como em 53. O incentivo comum, a viabilidade da zona euro, não passa por cima do incentivo político alemão e de outros estados credores: evitar um dominó de perdas para os seus contribuintes, causadas por países que são alvo de maus estereótipos. Perdas que podem levantar obstáculos jurídicos e sociais ao euro nesses países. A questão de fundo é, assim, política e exige tempo e liderança política quer nos países devedores (reformas e diplomacia activa para destruir estereótipos), quer nos credores (pedagogia aos eleitores sobre o que têm de aceitar para partilharem uma moeda). Até lá é muito prematuro concluir que “a Europa está a mudar”.
O acordo de Londres resultou num perdão de 46% da dívida anterior à Segunda Guerra Mundial e de 51% da posterior. Em termos médios foi um perdão de cerca de 50% da dívida externa. O acordo foi muito abrangente: incluiu praticamente toda a dívida pública e privada (mesmo as verbas do Plano Marshall). Do perdão ficaram de fora dois bolos: os montantes a pagar em reparações a Israel e a comunidades judaicas refugiadas noutros países; as reparações aos países invadidos.
O receio dos credores de que as reparações aos adversários de guerra levassem ao incumprimento fizeram, contudo, com que também esta “dívida” ficasse por pagar. Além do “perdão” foram definidos alívios adicionais. Por um lado, uma redução significativa das taxas de juro na dívida remanescente (17% passou a estar isenta de juros, 38% pagava apenas 2,5%). Por outro, um período de carência de cinco anos, no qual os credores podiam escolher receber o juro ou o capital até um determinado tecto. Com o país ainda a renascer das cinzas os credores deixaram de lado contrapartidas rígidas de “ajustamento estrutural” (o plano Marshall, no entanto, tinha significado contrapartidas duras para uma Alemanha tutelada pelos aliados).
O serviço da dívida seria financiado em exclusivo pelos excedentes comerciais futuros, facilitados por um marco desvalorizado. O acordo foi, por isso, muito generoso, sobretudo quando falamos do país causador da guerra - e de atrocidades a uma escala nunca antes vista. Porque razão foi dado este tratamento à Alemanha? Os alemães sentaram-se à mesa com cerca de 20 credores (incluindo a Grécia), mas quem liderou o processo foi uma das potências vencedoras da Guerra: os Estados Unidos. Para os americanos, o incentivo era fortalecer um país que estava na linha da frente da Guerra Fria – a Alemanha não só não podia tornar-se dependente da ajuda americana, como deveria ser uma montra da economia de mercado. Os alemães, com soberania limitada, aproveitaram a sua posição geopolítica.
A conferência de Londres serve para percebermos o óbvio: na dívida, uma reestruturação não pode ser separada do contexto político e dos incentivos dos credores. E, no caso da zona euro, os incentivos de credores e devedores não estão tão alinhados como em 53. O incentivo comum, a viabilidade da zona euro, não passa por cima do incentivo político alemão e de outros estados credores: evitar um dominó de perdas para os seus contribuintes, causadas por países que são alvo de maus estereótipos. Perdas que podem levantar obstáculos jurídicos e sociais ao euro nesses países. A questão de fundo é, assim, política e exige tempo e liderança política quer nos países devedores (reformas e diplomacia activa para destruir estereótipos), quer nos credores (pedagogia aos eleitores sobre o que têm de aceitar para partilharem uma moeda). Até lá é muito prematuro concluir que “a Europa está a mudar”.
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