Era definitivamente mais fácil, no ano do Senhor de 960, imaginar o fim do mundo na tremenda combinação entre o Apocalipse e o Anticristo. Ainda mais que, no trono petrino, sentava-se, com o nome de João XII, um jovem de 18 anos que transformara o Palácio de Latrão, onde os papas se hospedavam, em um bordel.
A reportagem é de Fabrizio D’Esposito, publicada em Il Fatto Quotidiano, 29-06-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Um verdadeiro bordel aberto a mulheres e homens jovens, quase sempre menores de idade. Como a indômita Anna, protagonista do belo romance de Santi Laganà: “I giorni del ferro e del sangue” [Os dias do ferro e do sangue]. Bancário aposentado e natural da Calábria, Laganà vive na zona rural romana e, aos 65 anos de idade, escreveu seu primeiro livro, publicado pela Mondadori.
Anna vive em uma cabana junto com o pai e os três irmãos. Alimentam-se de raízes, de roedores e de um pouco de queijo. O trabalho deles é cuidar do rebanho do bispo local. Estamos em Caere Vetus, hoje Cerveteri. Anna tem 15 anos de idade. Mas “conhecer a idade não adianta nada e não muda a sua vida. Nasce-se e morre-se sempre fazendo a mesma coisa”. Ou seja, tentar sobreviver entre a miséria e as violências de todos os tipos.
Anna também é linda. Assim, em um dia chuvoso e lamacento, chega à cabana um punhado de soldados liderados pelo vassalo do vassalo da região. O bispo lhe deu a tarefa de encontrar seis jovenzinhas a serem indicadas ao papa sátiro. Mas a garota foge, e, em vingança, os soldados degolam o pai e dois filhos, enquanto o terceiro, Martello, o mais velho, é feito prisioneiro para ser vendido como escravo sexual para um cardeal.
Não há limite para a decadência moral de Roma: “Aquela que havia sido durante séculos e séculos a capital do mundo, uma metrópole cosmopolita habitada por milhões de pessoas, agora estava reduzida a uma cidade de 20, no máximo 30 mil pessoas que sobreviveram com obstinação”. E ainda: “Cães, gatos e ratos vagavam por toda a parte, disputando comida e espaço com miseráveis de todos os tipos”.
Nesse cenário sombrio de desespero, quem prosperava era a Igreja e as famílias mais poderosas da cidade. João XII é o filho do príncipe Alberico. O pai quis que o herdeiro reunisse poder temporal e espiritual, sob a proteção do teutônico Otto. Berengário, rei da Itália, era contra esse desígnio.
Anna quer se vingar e reencontrar o irmão Martello. Começa uma intensa viagem a Roma, na qual, etapa após etapa, agrega uma companhia de vários tipos. Em primeiro lugar, o cavaleiro Arnolfo, pago por Berengário. É uma viagem de formação muito dura, digamos assim, em que a garota sofre violências e se vê matando pessoas mais de uma vez.
Estamos em 960, quinto ano do pontificado de João XII, o papa menino. São Roberto Belarmino o descreveu assim: “De fato, esse João foi quase o pior de todos os papas”. Deposto três anos depois, em 963, Otaviano dos Condes de Tuscolo, esse era o seu nome de batismo, ele recuperou o trono de Pedro quase logo depois, em 964. Mas durou muito pouco. Ele estava na cama com uma tal Stefanetta, quando o marido da mulher, um estalajadeiro, os surpreendeu juntos no leito.
O estalajadeiro o jogou pela janela, e João XII morreu após oito dias de coma. Tinha 27 anos.