COISAS DE MENINOS.
Conta
Zezinho, que quando criança, lá no
seu arrebol, ao olhar para a lua tinha
absoluta certeza que via a imagem de São Jorge e lá era a sua morada.
Na sua luz prateada existia a imagem do Santo guerreiro vestida de capa preta, calça bronze e lenço vermelho,
sempre montado no seu cavalo branco a espetar, com a sua flecha afiada, a boca da serpente voadora, estava ali
a defender a humanidade, era o seu herói.
Depois de adulto jovem, um dos seus amigos, da faculdade, falou :
__
"vocês eram uns bobos, vocês foram enganados, ali nunca existiu, não existe
e nunca existirá um São Jorge"
Zezinho achou o seu amigo um revoltado, viu e sentiu que ele nunca foi criança, não viveu a verdadeira felicidade, a inocência da primeira fase da vida, nunca habitou um mundo pequeno, só seu e dos mais próximos, onde brincavam, conversavam com as plantas, os animais e os seus brinquedos.
Zezinho foi enfático. Falou que na rua na qual morava, nas noites de lua, corria com os amigos, na estreita calçada, sempre a olhar para a lua. O interessante era que a lua os seguia. Não entendiam como a lua poderia está com todos os meninos ao mesmo tempo, era uma verdadeira mágica.
Um menino
ficava na cabeça da rua, outro no meio e outro ficava no fim, não tinha
segredo, a lua continuava com os três ao mesmo tempo. Todos corriam ao
mesmo tempo e o astro não os abandonava, enquanto mais rápidos corriam, mais
rápido corria a lua. Perguntou ao colega se isso não era verdade e qual
seria a sua explicação :
O colega sabichão disse:
__”Continua
falando bobagens, vocês eram uns bestas, a lua não corre coisa nenhuma, pela
distância era uma visão de ótica, um fenômeno natural, ciência pura”.
Falou
o Zezinho que continuava a acreditar no mundo da criança, que a lua corria, que
os acompanhava e lá era a casa de São Jorge.
O
colega replicou:
__“ Vocês eram umas crianças bobas”.
Relata Zezinho que ficou bobo com as suas explicações e nem sabia o que
era essa tal de visão de ótica, conscientemente disse para si:
" Tem cada coisa neste mundo que realmente pode até deixar o sujeito abobalhado, principalmente quando criança, esta tal de visão de ótica é uma delas".
Zezinho
logo chegou a uma conclusão. Viu e sentiu que o seu amigo, por ser
adulto desde o nascimento, hoje faz uso de muitos sedativos, ansiolíticos,
antidepressivos e muitos tranquilizantes. Vive com muitos rancores e
dissabores. Acredita que os grilos
começaram a entrar na sua cabeça desde o tempo de criança, e grilos na
cabeça não é brinquedo. Ainda bem que quando criança a sua cabeça não
existia buracos para ser a morada de grilos. Os rancores e os dissabores que entravam por um ouvido, saiam pelo outro
sem deixar rastros.
Notou que o colega nunca brincou de cobra cega, com os animais, as borboletas, maracujás, vértebras de bois, como se fossem a sua boiada. Nunca foi amigo da lua, nunca tomou banho de chuva e nem contou as estrelas do céu, por isso nunca teve uma verruga nas mãos, parece que nunca viveu o sol e nem a lua, ele viveu foi o dia e a noite com todas as agruras que lhes são peculiares: problemas, desentendimentos, regras, ditames, insônias e coisas de adultos.
Acredita que ele nunca conversou com as árvores, os animais e os seus simples pertences pessoais que os chamava de brinquedos. O colega já nasceu adulto e muito sabido, nunca foi um bobo, ele já nasceu sabido, por isso é que hoje é um bobão.
O magnânimo Zezinho inquiriu ao sabido sobre a caipora, a mula sem cabeça, papai noel, o bicho papão, o papa-figo, a coruja rasga mortalha, a mãe d”água, o catelobo, o lobisomem, as sereias, o saci pererê e outras lendas da infância. O colega deu uma risada de reprovação, balançou a cabeça, foi enfático e irônico:
___" vocês eram uns abobalhados, aquelas estórias eram invencionices e vocês como preás caiam de bobos, vocês foram enganados, aliás muitas eram as besteiras que inventavam e os bestas da época acreditavam".
O Zezinho
ficou surpreso e admirado com a sabedoria do amigo, viu que o seu colega era um
pequeno adulto desde criança. Sentiu que o amigo sabe de tanta coisa que hoje
não tem mais o que aprender. Sabe tanto, que precisa frear e inibir as
circunvoluções cerebrais com múltiplas substancias químicas, caso
contrário o seu encéfalo, com a quantidade de
conhecimentos armazenados, pode
explodir.
O menino Zezinho saiu silenciosamente pela tangente. O sabichão falou:
__ ” Até mais bobão, vê se aprende algo, vê se cresce”.
O menino Zezinho respondeu
__ “ Até mais sabichão”.
Zezinho
Iderval Reginaldo Tenório
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