segunda-feira, 24 de abril de 2023

ZEZINHO-O VELHO, A PENITENCIARIA E A COLÔNIA AGRÍCOLA.

 


                                                                  

Cartoon Bardeava Avô De Chapéu Com Cascas De Ouvido Com Pau Na Mão  Ilustração do Vetor - Ilustração de pessoa, antigo: 165197740

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Cartoon old farmer Stock Photo by ©illustrator_hft 116821544

O VELHO, A PENITENCIARIA

 E 

A COLÔNIA AGRÍCOLA.


Ao  visitar uma penitenciaria,   colônia agrícola, e ao  dialogar com os moradores, Zezinho  ficou impressionado com  um velho detento.

Defronte a um velho de barba branca e cabelos longos, voz arrastada, pouca leitura, pele encolhida e  olhar perdido, sem direção,   o Zezinho se abobalhou.

Após cordial diálogo, o velho de  
boca banguela,  mãos grossas e unhas escuras, olhou para o mundo, mirou o infinito, viajou no tempo e pousou na realidade da vida . 

Cavador nas mãos, bornal cheio de grampos, martelo,  pé de cabra para esticar arame, e uma cabaça d'água.  Cheio de solidão,  olhou para o sol,  protegendo os olhos com uma das mãos,  devido   a claridade, e com um molambo puído enxugou a  ressecada tez. 

Esboçando caretas com os desidratados músculos faciais e   a  rouca  voz, quase gutural,  balbuciou  algumas palavras.


__"Di qui adianta viver num mundo como esse? di qui adianta?! O mundo pra mim num tem sentido, vivo cá há 30 anos, num tenho mué, pai, mãe, fios e nem amigos, a vida é  drumir, acordar, comer, discomer , cavar buracos e insticar arame, num tem sentido. Drumo, acordo, como, discomo, cavo buracos e dispois, dispois vou insticar arame, num tem sentido."

Parou de balbuciar, olhou para cima, céu azul e  sol a pino. Coçou a cabeça, colocou o seu surrado chapéu de palha, pôs o cordão por debaixo do queixo, arregaçou as mangas do grosso brim, aberta até o umbigo, saiu resmungando para si e para o além,  quase a murmurar:

__"Qui dureza! ave Maria! Qui sóle quente, já comí, já discomi, já cavei  buracos e agora seu môço vou insticar arame."

O Zezinho  ficou boquiaberto  e desnorteado com a titude do velho presidiário.


Com  o tom da voz cada vez mais baixo, foi balbuciando, abaixando a voz  e se afastando em busca de realizar a sua tarefa.

__"Vou insticar arame, vou insticar arame. Inté mais môço, inté."

Saiu à procura de arames farpados soltos, estacas carcomidas  e  mourões prestes a caír.

Indiferente e claudicante, sumiu beirando a cerca. Puxa aqui, puxa ali, uma martelada acolá, um grampo que cai, um grampo que se perde, um resmungo, uma cusparada, uma estaca frouxa, mole,  quase caindo e lá se vai o velho cheio de desilusão acostumado com a vida recebida e agora em consumo. Aqui e acolá, uma martelada nos dedo polegar , porém,  sem sensisibilidade, devido a grossa camada de pele maltratada, nada sente e continua a martelar.

Come, evacua, cava buracos, estica arame, olha para o sol, enxuga a testa, bota a mão no bornal, dá uma martelada, assoa o nariz, estica a coluna com as mãos nos quartos, coça as nádegas e continua a deambular.

É a sua rotina, é o cotidiano, é a vida, é o seu pequeno mundo. Olhou, com os seus olhos de baixa acuidade  e tracomatoso,   bem nos olhos do Zezinho e falou:  

 __"  Muitos são os tipos de prisões nesta vida seu môço, eu já nasci refém. Vou insticar arame".

 
Salvador, 21 de abril de 1998

Iderval Reginaldo Tenório

 

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