sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

ZEZINHO-AS IDEIAS DO MENINO PARA A HUMANIDADE

 

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AS IDEIAS DO MENINO  ZEZINHO PARA A HUMANIDADE

I
Vivia no Sertão um menino chamado Zezinho, ao acordar não encontrava o seu pai em casa. Moravam numa chácara e viviam da venda das verduras, frutas,  legumes,  queijos,  do leite e  ovos que  produziam, eram   pequenos agricultores.

A vida no campo era difícil, porém prazerosa, ninguém valorizava os seus produtos, tanto que,  todos os dias  o pai do Zezinho   madrugava na cidade   para apurar alguns trocados e comprar produtos que   não produzia, mesmo assim era  um homem  feliz, vivia do suor do próprio rosto.

Para comprar uma barra de sabão, era necessário  um quilo de queijo,  um pacote de café,  cinco litros de leite, um quilo de sabão duas dúzias de ovos, um litro de querosene custava um balaio de verduras, uma vestimenta quase todo o apurado, por isso aproveitavam as roupas até chegarem ao fim, muitas vezes não dava para comprar tudo que precisavam.  Para o transporte das mercadorias da chácara à cidade  possuíam uma dupla de burros adestrados, não havia estrada para a chácara, havia apenas uma vereda íngreme e estreita, quando chovia era um caminho perigoso.

Zezinho ficava encabulado com o que via, pois o seu pai trabalhava o dia inteiro e quando chegava da cidade  falava para a sua esposa  que as coisas estavam ruins, dizia que havia muitos produtores rurais oferecendo as suas mercadorias  e para não voltar sem nada, sem nenhum trocado   tinha que vender por qualquer preço, melhor do que jogar fora. 

O que também chamava a atenção do menino era o fato de serem  os moradores da cidade, que não entendiam da lavoura e da criação de animais, quem ditavam os  preços dos produtos. 

Como sabiam ler, escrever, contar e se expressar com desenvoltura mandavam  naqueles que só sabiam trabalhar no pesado, debaixo do tempo,  expostos ao sol causticante, aos espinhos, aos ventos e redemoinhos, à  poeira, às formigas,  aos bichos de pé, aos  carrapatos e aos animais peçonhentos como as cobras, as aranhas e os escorpiões, pensava para si próprio: 

“ Para o agricultor ganhar o pão de cada dia é muito trabalhoso e arriscado, é  muito injusto ” .

 Estes pensamentos não saiam de sua cabeça .

                    II
O José foi crescendo e vendo a diferença entre as pessoas, os seus pais trabalhavam de sol a sol e dependiam da vontade do tempo, quando passava muito tempo sem chover a terra nada produzia, as galinhas não punham ovos e nem as vacas davam leite, quando chovia demais muitas plantas se perdiam, pois ficavam embebidas e encharcadas com tanta água, murchavam e morriam, mesmo assim a produção era muito grande, só era bom para o pessoal da cidade, pois os produtos ficavam  baratos pela grande quantidade, porém  para os produtores as mesmas dificuldades e os  mesmos sofrimentos,  pensou mais uma vez só  para si : 
 
“Com o sol causticante a terra nada produzia, com água demais a produção ficava muito grande e o transporte  difícil, continuava ruim para os produtores, produtos  agrícolas  em grande quantidade caem os preços”.
 
 A cabeça do menino mastigava estes pensamentos todos os dias, o José era uma criança, mas já era um pensador.

O que também chamava a atenção do menino era que , o povo da cidade ganhava muito bem dos governos e não dependia da vontade do tempo como  os agricultores, chovesse ou fizesse sol o ganho era garantido, não havia tempo ruim. 

Voltava a refletir, só para si, quais eram as causas desta diferença entre as pessoas,   pensava em muitas possibilidades, uma delas era a escolaridade e assim refletia: 

"Será que é porque eles têm escolas, leem livros , jornais  e estudaram?  Será que , se todos estudassem, inclusive os homens da roça,  teriam as mesmas chances? "
 
 Com estes pensamentos, o José exigiu do seu pai que queria acompanhá-lo mais vezes para vender os produtos,  conhecer mais a cidade e os seus moradores. 
     III

Ficava  impressionado com as vestimentas do povo da cidade, os homens de calças e camisas finas, sapatos polidos, muitos usavam gravatas, chapéus de massa e só fumavam cigarros finos, cigarros mansos, as mulheres  muito bem vestidas e calçadas, as crianças , iguais a ele na idade, com fardas escolares, sapatos pretos, bolsas de couro  a  tiracolo e sacolas coloridas com pães, sucos,  doces, bananas e biscoitos para a merenda , todas saltitantes a caminho da escola, enquanto ele com a mesma idade  já ajudava os pais na lida da roça, lutava sujeito  a  todos os maltratados da lavoura, ora   no cabo da enxada, na irrigação das plantas , na colheita  e ora na contagem dos ovos, pois  em matéria de fazer contas , na sua idade, era um gigante, de bom possuía a natureza, a liberdade e os animais, estes eram os seus verdadeiros amigos. 

O José era tão pensativo que sabia muitas coisas sobre o tempo, quando era lua nova, lua cheia, quarto crescente, quarto minguante, quando ia chover, sabia das horas pela inclinação do sol , sabia a idade de um cavalo examinando os seus dentes , sabia pelo cantar dos pássaros se haveria inverno ou seca?,   conhecia muitas constelações e o nome de algumas estrelas, pois quando chegava a noite todos iam para o alpendre da casa e os mais velhos contavam todas as histórias que sabiam, muitas eram  antigas, dos tempos dos grandes Reis, principalmente as contadas pelos seus avós.
 
IV
Ficou tão impressionado com a situação , com as dificuldades dos seus pais   que um dia sem sentir, sem querer e sem saber o porquê as lágrimas caíram no rosto e molharam a sua face, o José não entendia tamanha injustiça e imaginou só para si, para ninguém saber, só para si.

 “Aquilo era uma injustiça, aquilo estava errado, não poderia continuar assim” 

E passava o dia pensando. Já falei que o menino era um pensador.

O estopim foi quando o José soube de outras coisas que lhes soaram  muito estranhas. 
Soube que todos os anos os moradores da cidade recebiam um salário a mais e passavam 30 dias sem trabalhar, isto  é , sem fazer nada e por cima recebiam os salários sem faltar um centavo. Depois de pesquisar  soube que eram o 13º salário e as férias remuneradas, os seus pais nem de longe sonhavam com este verdadeiro milagre, aquilo não lhe conformava, lhe deixava impaciente e pensativo, achava tudo muito estranho. 

 Matutou mais uma vez para si mesmo, pois era um pensador e não queria que  ninguém soubesse dos seus pensamentos , com os olhos a  marejar pensou: 

"Se todos são filhos de Deus , todos deveriam receber estes benefícios, não existia dúvidas, deveria ser assim. Quem pagava estes benefícios e como pode receber sem trabalhar ?,  na roça até os animais trabalham, as vacas dão leite, as plantas dão frutos, as galinhas põe  ovos e os burros carregam os produtos nas costas, a vida é dura, até ele, que ainda era uma criança,  tinha que ajudar em vez de ir para a escola e brincar, uma vez que todas as crianças têm que brincar, é brincando e estudando  que se aprende, já dizia vovó  DIDI”.

Neste dia o menino não dormiu, veio à mente que no futuro a força motora iria perder totalmente o valor , tudo seria produzido e transportado por máquinas, até mesmo os animais iriam ficar sem os seus empregos , a vida seria mais fácil para os cidadãos que tivessem estudado, que possuíssem uma profissão e utilizassem o cérebro para ganhar o pão, enquanto mais estudasse maiores seriam as chances para uma vida melhor, concluiu que o homem do futuro para ganhar a vida só precisaria do cérebro, mesmo  com deficiência física possuindo um cérebro sadio poderia crescer na vida,  pois ganharia a vida sentado  numa carteira, dando palestras, escrevendo, ensinando , comandando um grupo de pessoas ou operando uma máquina  , concluiu que o homem é o cérebro e as outras partes são acessórios, o importante é o cérebro.
V
José teve uma ideia e  achava que era muito boa, ele queria justiça entre os povos, não podia continuar assim. Na cidade o povo tem tudo e não precisa trabalhar com a terra, com a lavoura ,  com os animais e nem com o perigo dos animais peçonhentos   para ganhar o pão, muitos ganham a vida para ficar sentados numa carteira, mexem com papeis, canetas, lápis e relatórios, trabalham na sombra e com todas as garantias, inclusive com este tal de 13º salário e férias remuneradas,  todas as crianças  vão para a escola, vestem-se bem, comem  bem e brincam muito, enquanto na mesma idade ele já trabalhava para ajudar a família. 

Não saia  de sua cabeça algumas perguntas: quem pagava este 13º, estas férias que os grã-finos tem direito?, era uma injustiça com os homens da lavoura, outro entrave eram os preços das mercadorias, se o agricultor  é quem planta e colhe, por que não dita os preços, isto não estava certo, era uma injustiça com quem trabalha na terra com todos os sacrifícios que existem, era sim uma grande injustiça, o menino não parava de pensar, já informei que era o José um pensador.

Ficou mais indignado quando soube que muitos  não trabalhavam mais e recebiam os seus salários, queria saber este mistério, seria milagre?. Foi até a Prefeitura falar com o Prefeito e disseram a ele que este grupo recebia o nome de aposentados, pessoas que trabalhavam até certa idade e depois ficavam em repouso para o resto da vida, era uma garantia para quem trabalhou até a velhice,  veio na sua cabeça o seu avô, que apesar de velho ainda ajudava na lavoura, nunca deixou de trabalhar. 

O José entrou em parafuso, quem paga se ninguém trabalha com  a terra que dá os frutos que alimenta o homem ? pois quem sustentava os seus avós ,  os seus pais  e toda  a sua prole  era   o pequeno terreno da família, dizia o seu avô que aquela chácara era herança do seu pai, o meu bisavô, que há muito tempo vivia daquela terra plantando e criando alguns animais , veio à tona o pensamento da escola:

" Será que o meu bisavô frequentou a escola? será? tudo indica que não" 

 VI
Ao chegar à chácara convocou todas crianças filhas dos lavradores, contou tudo que viu, o que pesquisou e como funcionava a vida na cidade, foi um alvoroço total, os pais não estavam entendendo tantos encontros e tantas reuniões secretas entre as crianças da roça, era muito estranho, o que estavam articulando? Sabiam que quando muitas crianças se reúnem estão planejando alguma travessura, pois as crianças são cheias de artes e sabem de muitas coisas que os adultos nem imaginam, as crianças raciocinam e muito, as crianças são cheias de ideias, tem a mente limpa e nova, aprendem tudo com muita facilidade, são atentas e antenadas  em tudo, as crianças são muito inteligentes, deveriam ser mais escutadas pelos adultos.

                                                                      VII
Noventa  dias depois,  após muitas idas e vindas à cidade, os meninos constituíram uma comissão, foram  ao Prefeito, ao Juiz, aos Vereadores, aos Professores , ao Padre e por último aos pais, falaram que tinham tomado uma decisão e,  estavam convocando todos para uma grande assembleia na qual apresentariam  um plano desenvolvido nestes noventa dias .

Todos gostaram dos comunicados, das sugestões  e das medidas que proporcionassem justiça,  principalmente para o trabalhador do campo, para os mais pobres e para os mais necessitados, as crianças chegaram à conclusão que o  mundo é de todos e não deve existir castas muito distantes uma das outras, os  salários vão depender da capacidade, dos esforços e  do nível de escolaridade de cada um, desde quando todos  tenham a chance de aprender , desde quando o ensino seja com isonomia para toda a população, tudo iria depender das ações dos gestores públicos, daqueles que estão com as rédeas do poder nas mãos,  entenderam que os benefícios são pagos  pela  força do trabalho de todos os trabalhadores e que cada um recolhe uma parcela  proporcional aos ganhos  para depois passar a receber   justos benefícios, muitas foram as ideias, as sugestões  e as soluções.

Foi da mente do menino  José que muitas medidas foram tomadas para melhorar a vida  de muitos seres humanos, foram elaboradas as leis trabalhistas e férias remuneradas para todos, os pequenos agricultores foram orientados a  formarem grupos que tinham poderes sobre as plantações, o transporte e os seus preços, os homens do campo passaram a figurar nas estatísticas como importantes cidadãos e  para as  crianças a escola passou a ser obrigatória , todas passaram a frequentar  diversos cursos,  passaram a alimentar o cérebro, pois José entendia que só a escola , só a educação era capaz de proporcionar a igualdade social. 

VIII
Para uma pessoa  trabalhar noutra fazenda, numa loja  ou na casa de outra pessoa   foi criado a carteira profissional , todos passaram a ter direito a saúde e aposentadoria por um sistema de seguridade público coletivo.

Graças ao José o mundo melhorou pra muita gente, cada pessoa passou a ser chamada de cidadão e todos ficaram sabendo de onde vinha o dinheiro para sustentar tantos trabalhadores que moram na cidade, inclusive este tal de 13º salário, férias remuneradas e aposentadoria, graça ao seu esforço todos passaram a ter os mesmos direitos , no campo ou na cidade, o importante era trabalhar dignamente .

O José continua vivo e em todo o mundo, vive plantando justiça , criando e formando  milhares de Josés , para juntos   um dia construírem um mundo melhor para todos os reinos da natureza, o animal, o mineral e o vegetal, segundo José sem esta interação a vida não tem o menor sentido, diz em voz alta que o remédio é crescer sem destruir , crescer com cidadania e respeito,  crescer preservando e recuperando  a natureza, o remédio é lutar.
Iderval Reginaldo Tenório


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