Adicionar legenda |
Medo de perder direitos com novo governo fez casais LGBTI anteciparem casamento
Uniões entre gays dispararam no fim de 2018 após eleição de Bolsonaro; correria aos cartórios chegou a ser sugerida por OAB
Johanns Eller e Ana Letícia Leão
04/12/2019 - 20:37
/ Atualizado em 05/12/2019 - 10:04
RIO e SÃO PAULO — Juntos há oito anos, o arquiteto Daniel Brum, de 48
anos, e o designer Gabriel Pinheiro, de 36, nunca tinham conversado
sobre casamento no civil até o então deputado federal
Jair Bolsonaro,
presidenciável do PSL, despontar nas pesquisas de intenção de voto em 2018.
A vitória do agora Presidente da República, conhecido historicamente por
posicionamentos
considerados
homofóbicos,
além de posições
abertamente contrárias
aos direitos homossexuais, levou o casal, que já dividia um lar, em São Paulo, a repensar os planos.
— Tínhamos todas as formas de comprovar nossa relação estável. Mas o start veio mesmo com a desconfiança de que nossos direitos poderiam ser retirados a qualquer momento no novo governo — diz Daniel.
Segundo ele, houve correria para que conseguissem oficializar a união ainda em 2018, e não deixar virar 2019.
— Casamos em 15 de dezembro, no último sábado disponível para o juiz do cartório. Foi bem apertado. Sabemos como as instituições são frágeis no Brasil. Percebemos, como muita gente, que havia uma data segura, no final de dezembro, para que nossos direitos ainda valessem. Depois de janeiro, quem poderia garantir?
A eleição de Bolsonaro para o Palácio do Planalto foi apontada por especialistas como o principal catalisador do aumento recorde de 61,7% no número de casamentos homoafetivos no Brasil no ano passado, identificado especialmente após o resultado eleitoral.
As Estatísticas do Registro Civil de 2018, divulgadas na manhã desta quarta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ( IBGE ), demonstraram que o número de casamentos registrados em cartórios civis em dezembro do ano passado foi 459% maior do que em outubro, quando Bolsonaro ainda não havia sido eleito no segundo turno.
A Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), à época presidida pela desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul Maria Berenice Dias, uma das maiores especialistas em direitos homoafetivos do país, chegou a alertar casais LGBTI para que buscassem a oficialização do casamento em cartório antes da posse de Bolsonaro. O órgão apontava riscos razoáveis de retrocessos nos direitos, garantidos pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e por uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas não por lei.
O medo de perder direitos também acabou acelerando o casamento das psicólogas mineiras Kênia Fernandes Brandão Oliveira, 28, e Ana Luiza Meneses Soares, 25. As duas estão juntas há cinco anos, pretendiam se casar em 2019, mas acabaram antecipando a união para dezembro do ano passado.
— Quando Bolsonaro assinou um termo se comprometendo a promover a união entre homem e mulher, a gente se preocupou. Tivemos receio do que poderia vir e pensamos em garantir nossos direitos — explica Kênia, em referência ao que foi defendido pelo atual presidente Jair Bolsonaro.
Segundo Kênia, o casamento no civil ocorreu ainda em dezembro do ano passado, antes da posse do novo governo.
— Eu não queria me casar quando ele (Bolsonaro) já tivesse tomado posse porque não sabia o que podia acontecer. Com o casamento, passamos a compartilhar plano de saúde e seguro de vida se alguma coisa acontecer. Se não, depois entraria naquela coisa de ter de ficar provando que estávamos juntas. Não queríamos passar por isso.
— Estávamos juntando dinheiro. Aconteceu a eleição, e pensamos: todos os LGBTs estavam se mobilizando para se casar. Por que esperar se podíamos fazer logo? Começamos a tentar viabilizar. Sempre quisemos fazer no civil, mas não conseguimos a tempo porque eram necessários muitos documentos, e eu estava procurando trabalho. Mas conseguimos esse local de graça, e uma amiga assessora de imprensa conseguiu tudo para mim. Mas havia medo demais.
Em Minas, Kênia e Ana Luiza também aproveitaram o movimento de profissionais que trabalharam de graça em casamentos LGBTIs, no final do ano passado, no intuito de ajudar a união de quem tinha pressa para se casar.
De acordo com Kênia, não foi cobrado qualquer valor pelos serviços da música da festa, com shows de samba do Grupo Tereza, e dois DJs, além dos maquiadores, cabeleireiros e responsáveis pelo bar, que não cobraram nada pelos serviços.
OGLOBO
— Tínhamos todas as formas de comprovar nossa relação estável. Mas o start veio mesmo com a desconfiança de que nossos direitos poderiam ser retirados a qualquer momento no novo governo — diz Daniel.
Segundo ele, houve correria para que conseguissem oficializar a união ainda em 2018, e não deixar virar 2019.
— Casamos em 15 de dezembro, no último sábado disponível para o juiz do cartório. Foi bem apertado. Sabemos como as instituições são frágeis no Brasil. Percebemos, como muita gente, que havia uma data segura, no final de dezembro, para que nossos direitos ainda valessem. Depois de janeiro, quem poderia garantir?
A eleição de Bolsonaro para o Palácio do Planalto foi apontada por especialistas como o principal catalisador do aumento recorde de 61,7% no número de casamentos homoafetivos no Brasil no ano passado, identificado especialmente após o resultado eleitoral.
As Estatísticas do Registro Civil de 2018, divulgadas na manhã desta quarta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ( IBGE ), demonstraram que o número de casamentos registrados em cartórios civis em dezembro do ano passado foi 459% maior do que em outubro, quando Bolsonaro ainda não havia sido eleito no segundo turno.
A Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), à época presidida pela desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul Maria Berenice Dias, uma das maiores especialistas em direitos homoafetivos do país, chegou a alertar casais LGBTI para que buscassem a oficialização do casamento em cartório antes da posse de Bolsonaro. O órgão apontava riscos razoáveis de retrocessos nos direitos, garantidos pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e por uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas não por lei.
“Tínhamos todas as formas de comprovar nossa relação estável. Mas o start veio mesmo com a desconfiança de que nossos direitos poderiam ser retirados a qualquer momento no novo governo”
Daniel BrumArquiteto
O medo de perder direitos também acabou acelerando o casamento das psicólogas mineiras Kênia Fernandes Brandão Oliveira, 28, e Ana Luiza Meneses Soares, 25. As duas estão juntas há cinco anos, pretendiam se casar em 2019, mas acabaram antecipando a união para dezembro do ano passado.
— Quando Bolsonaro assinou um termo se comprometendo a promover a união entre homem e mulher, a gente se preocupou. Tivemos receio do que poderia vir e pensamos em garantir nossos direitos — explica Kênia, em referência ao que foi defendido pelo atual presidente Jair Bolsonaro.
Segundo Kênia, o casamento no civil ocorreu ainda em dezembro do ano passado, antes da posse do novo governo.
— Eu não queria me casar quando ele (Bolsonaro) já tivesse tomado posse porque não sabia o que podia acontecer. Com o casamento, passamos a compartilhar plano de saúde e seguro de vida se alguma coisa acontecer. Se não, depois entraria naquela coisa de ter de ficar provando que estávamos juntas. Não queríamos passar por isso.
Com festa, sem documento
Ainda assim, há casais que, embora tenham decidido não formalizar no cartório, viveram a onda de solidariedade de estabelecimentos, mestres de cerimônia e demais serviços que se prontificaram a ajudar LGBTIs em processo de casamento. É o caso de Larissa Maia, graduanda do curso de Cinema da Universidade Federal Fluminense (UFF), que se casou com Vanessa Lohane em uma boate carioca de graça.— Estávamos juntando dinheiro. Aconteceu a eleição, e pensamos: todos os LGBTs estavam se mobilizando para se casar. Por que esperar se podíamos fazer logo? Começamos a tentar viabilizar. Sempre quisemos fazer no civil, mas não conseguimos a tempo porque eram necessários muitos documentos, e eu estava procurando trabalho. Mas conseguimos esse local de graça, e uma amiga assessora de imprensa conseguiu tudo para mim. Mas havia medo demais.
Em Minas, Kênia e Ana Luiza também aproveitaram o movimento de profissionais que trabalharam de graça em casamentos LGBTIs, no final do ano passado, no intuito de ajudar a união de quem tinha pressa para se casar.
De acordo com Kênia, não foi cobrado qualquer valor pelos serviços da música da festa, com shows de samba do Grupo Tereza, e dois DJs, além dos maquiadores, cabeleireiros e responsáveis pelo bar, que não cobraram nada pelos serviços.
OGLOBO
Nenhum comentário:
Postar um comentário