Esmaltes e cosméticos podem acelerar o processo da puberdade nas crianças
Por Lívia Carvalho,
livia.carvalho@svm.com.br
A puberdade é um fenômeno fisiológico natural do corpo, no entanto, ela pode se manifestar precocemente em alguns indivíduos por fatores genéticos ou externos. Pais e responsáveis precisam ficar atentos aos sinais dessas transformações corporais das crianças para evitar as consequências diante do diagnóstico positivo e da falta de tratamento adequado.
A transição da fase infantil para a adolescência é
um marco do desenvolvimento humano. Conhecido como puberdade, esse
fenômeno inicia-se aos oito anos em meninas e aos nove em meninos.
Porém, quando o começo se dá antes dessas idades é sinal de disfunção e,
por isso, pais e responsáveis precisam estar atentos às mudanças
físicas das crianças e buscar orientação médica.
"Esse fenômeno decorre da ação de hormônios sexuais que são produzido
nas meninas, principalmente, pelos ovários e, nos meninos,
principalmente, pelos testículos", explica a endocrinologista e
professora do Departamento de Medicina Clínica da Universidade Federal
do Ceará (UFC), Eveline Gadelha.
Aos seis anos, a estudante Inessa Maria, atualmente com 20, foi
diagnosticada com puberdade precoce.
O primeiro indício foi percebido
por sua mãe ao sentir um cheiro forte nas axilas e o surgimento dos
seios. Por estar atenta às mudanças corporais da filha, em seguida a mãe
procurou a pediatra, a qual encaminhou a paciente ao endocrinologista.
Os sinais físicos observados pela mãe de Inessa são apenas algumas
dessas mudanças. De acordo com Eveline, os pais e responsáveis precisam
estar sempre atentos ao surgimento de pelos, crescimento das mamas
femininas e o aumento do comprimento peniano nos meninos. Outras
características, como a mudança na voz, crescimento acelerado da
estatura, dos pés, das mãos e dos músculos também servem de alertas para
os pais e responsáveis.
Causas
A puberdade precoce é multifatorial, além de questões genéticas, como
no caso de Inessa. Agentes externos também costumam exercer influência
nos níveis hormonais do indivíduo e podem elevar os riscos de
desenvolvimento prematuro, entre eles estão a obesidade e a exposição a
determinados compostos químicos, a exemplo do bisfenol A, presente em
plásticos e embalagens, bem como os ftalatos e parabenos, comuns na
composição de esmaltes, maquiagens, cosméticos e antitranspirantes.
"A absorção desses compostos pode ser por meio da pele, da ingestão
ou do ar", explica Eveline. A endocrinologista ressalta ainda que o
contato de crianças com mulheres em reposição hormonal, na versão gel,
assim como com pessoas que manipulam o uso de anabolizantes, também
podem desencadear o problema.
Outro composto apontado por Eveline como 'vilão' são os agrotóxicos,
presentes na maioria dos alimentos. A médica cita ainda um estudo
realizado no México que correlaciona a exposição a alguns pesticidas com
o desfecho das gestações das trabalhadoras do campo. "Foi observado
ainda que as gestantes, com maior exposição, no caso dos filhos do sexo
feminino, tiveram a puberdade mais precoce e, os do sexo masculino, mais
tardia", compara.
Aos nove anos, a mãe de Alice Santos percebeu sinais que indicavam o
início da puberdade na menina. Apesar de ter começado no período
considerado normal, a mãe da pequena foi orientada, pela
endocrinologista que acompanhou o diagnóstico, a evitar o consumo de
carne de frango e ovos provenientes de granja, optando pelas versões
caipiras.
Ao notar esses sinais nas crianças, portanto, é imprescindível o
acompanhamento médico, especialmente de um endocrinologista, responsável
pelo estudo dos sistemas hormonais. Para obter o diagnóstico concreto,
são realizados vários exames, como dosagem hormonal e de imagem, a
exemplo do raio X de punho para verificar a idade óssea comparada à
cronológica, além de consultar o histórico clínico individual do
paciente.
Tratamento
Com o resultado em mãos, o próximo passo é tratamento, que varia de
acordo com o origem do problema. A mais comum é feita à base de
medicação para interromper o processo de maturação sexual, até que a
criança tenha idade suficiente para esse desenvolvimento. "O tratamento é
de, no mínimo, dois anos e pode realmente segurar a idade óssea", diz a
médica.
No caso de Inessa, o tratamento foi iniciado alguns meses depois do
diagnóstico e durou pouco mais de três anos, até ela atingir a primeira
menstruação. A medicação é disponibilizada gratuitamente pelo Sistema
Único de Saúde (SUS), no entanto, a estudante teve dificuldades até
conseguir. "A fila de espera chegava a ser de dois anos, e a minha
médica disse que se eu não começasse logo, eu iria menstruar aos oito
anos, ou seja, quando chegasse minha vez o tratamento não serviria
mais", relata.
Cada injeção custava, à época, R$ 600, e a dose precisava ser mensal.
Pelo alto custo, a compra pela família de Inessa era inviável. Mesmo
fazendo o tratamento, Inessa ainda sente as consequências da puberdade
precoce. A jovem desenvolveu depressão e transtorno de ansiedade,
atestada por um psiquiatra, além dos problemas hormonais, como o alto
nível de prolactina no sangue, hormônio responsável por estimular a
produção de leite materno na gravidez. Quando não há gestação, a
menstruação da mulher fica desregulada e pode causar infertilidade.
A estudante também apresenta hipotireoidismo, disfunção na tireoide
que afeta o metabolismo, causando fadiga, ganho de peso, alterações no
humor, além do aumento de chances de ter doenças cardíacas. Doutora
Eveline também aponta para a possível baixa estatura desses indivíduos,
já que eles atingem um estirão do crescimento antecipado e param de
crescer mais rápido.
"Outro efeito é o risco de abuso sexual pelo desenvolvimento precoce,
além do encurtamento de uma fase tão importante para o amadurecimento
do indivíduo. A criança, que tem uma infância mais curta, está mais
vulnerável a ter problemas psicológicos", orienta a especialista.
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