Carta do menino Zezinho aos seus professores do curso fundamental
Queridos professores nasci na roça, tenho 14 anos de
idade e a minha primeira escola foi no
campo. Os meus professores e colegas , além dos meus
pais, foram os fenômenos da natureza, as plantas, os insetos, os
repteis e os animais do sítio dos meus pais.
Brinquei muito com as formigas, tanajuras, libélulas, gafanhotos e as
borboletas, levei muitas carreiras das galinhas
chocas, das cadelas paridas, das cobras, das abelhas e de bodes pais de chiqueiro.
Sei que os senhores não vão acreditar, nenhum deles sabiam
ler, escrever ou contar, até mesmo os meus pais
não tinham boa leitura. Acho que os senhores vão estranhar, pois foi
graças a todos eles que percebi a grandeza da vida, da natureza e da cidadania. Ensinaram-me a importância de cada um e que cada um merece respeito. Ficou claro que
todos possuem primordial participação na formação de um cidadão, fator
preponderante para se viver em sociedade
com interatividade e harmonia.
Os animais classificados como irracionais, brutos,
simples e sem conhecimentos filosóficos atentaram-me para
a importância da vida, do bem estar e como comportar-me diante da
natureza. Ensinaram-me como viver em sociedade e harmoniosamente com as diferenças e as diversidades, tanto os
seres animados como os inanimados, precisamente os morros, as águas, o sol, a lua, as estrelas, as chuvas, o fogo, as florestas, os
ventos, as capoeiras e tudo quanto emana
da terra, inclusive ela própria.
Ao entrar nesta escola imaginava encontrar um ambiente livre,
que deixasse o meu cérebro voar como um
pássaro e fizesse brotar miríades de perguntas sobre a complexidade da vida e
do universo.
Imaginava que a escola dos humanos trouxesse orientações para concatenar as minhas ideias, que me mostrasse novos caminhos e como desenvolver
novos pensamentos.
Imaginava que nesta escola
iria encontrar muitos orientadores, tais quais os meus amigos de infância que, mesmo sem falar a língua pátria, contar ou escrever enriqueceram o meu saber.
Tinha eu, nesta minha cabeça, que cada colega
passasse alguns conhecimentos e num contínuo compartilhamento fôssemos
somando, e no coletivo melhorando a capacidade de viver em comunidade.
Juro aos senhores que, ao saber que existiam diversas disciplinas
como a língua pátria, a aritmética, a história, as ciências sociais e outras, iria compreender
as suas importâncias, a necessidade
de me aprofundar e entender a participação de cada uma na vida do cidadão ou cidadã.
Acreditava que, sozinho ou em equipe, iria procurar maneiras de explorá-las. Voaria, como um alado livre, por todos os recantos procurando
respostas para as
interrogações da vida.
Porém, o que encontrei foi uma prisão, uma verdadeira gaiola, um
engessamento, tendo que seguir literalmente demandas do imaginário
humano. Clausura esta que me fará
desaprender o ato de voar, cantar,
da liberdade e de discernir o que é bom
ou ruim para vida.
Lembro que todos os
engaiolados possuem donos e eles os levarão para onde quiser, posto que prisioneiros não são donos de si.
Aqui com todas as invenções
do homem, e o intuito de colocar o cidadão no topo da pirâmide ou
encontrar um lugar ao sol neste mundo desigual, induz e aduz reflexões sobre o futuro da
humanidade.
Tenho a impressão que o modelo
desta escola contribuirá para a exclusão no ensino e criará mais degraus
na estratificação social e humana, distanciando mais ainda as
camadas sociais, pois existem diferenças nos
conteúdos escolares. Enquanto maior o poder aquisitivo melhor o ensino,
maior o prato, maior o número de nutrientes e o espirito de
superioridade.
Este modelo faz com que cada um aprenda
a ser um desagregador, um concorrente ou um eterno advsersário. Irá despertar, no Eu de cada um, a propriedade de ser o melhor, o
mais competente, um eterno ganhador e o número hum em tudo,
mesmo que tenha que puxar o tapete do próximo.
Não
tenho cerimônia de falar que, com este modelo o mundo a cada dia ficará mais desigual. É
assim que se constroem as famigeradas pirâmides
sociais em todas as demandas da
vida.
Caros professores, peço encarecidamente que apenas
mostrem os caminhos para a vida, que apontem a melhor maneira de utilizar
o cérebro, pois a de racionar todos são capazes. Com estas ferramentas cada um destes seres humanos, em formação, saberá encontrar a verdadeira importância
da vida. Tenham certeza que cada um continuará o aprendizado sem se
afastar dos princípios sociais, filosóficos, éticos e de como participar de um mundo mais justo em busca
da cidadania plena.
Meus abnegados professores, peço que deixem as crianças raciocinarem e se desenvolverem. Saibam que
cada uma tem e vem de um mundo diferente, todos estão cheios de conhecimentos
pertinentes ao nível social e da convivência infantil, isto é, da primeira infância. Está
no compartilhamento de suas vivências e ideias
a chave para um mundo mais equânime.
Sempre escutei e ainda escuto que cada cabeça é um mundo.
Deixem as crianças criarem, pensarem, comunicarem-se e contribuírem
para encontrar muitas respostas para o
bem desta civilização.
Sei que este modelo não é culpa dos professores, faz parte da conjuntura e da vontade política. Cabe aos
senhores apenas executarem a grade curricular num pequeno espaço de
tempo, num ambiente muitas vezes inadaquado, cheio de amarras invisíveis, sem segurança, sem uma
remuneração condizente e valorização pertinente à função.
Mestres, não falei mais porque ainda sou rude, capiau e quase
um animal do campo, quase um analfabeto nas coisas da vida. Acredito que ao
entrar no curso do ensino médio darei continuidade a esta simples missiva.
. Brasil, 18 de Março de 1968
Assina :Zezinho
ESCUTEM DE OLHOS FECHADOS E VIAGEM NO TEMPO COM O GRANDE BELCHIOR .
ESCUTEM A MELODIA E A GRANDE BARERIA TÁ TÁ TÁ TÁ TÁ TÁ.
REPASSEM ESTA LETRA PARA O MUNDO.
Iderval Reginaldo Tenório
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