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O FILHO , O PAI , A NATUREZA E OS IDOSOS
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Este
Texto foi produzido quando completei 07 anos de Medicina(1989) e fiquei
preocupado com o destino dos nossos idosos , pensei que ainda no fim do século
XX o ser perderia em parte para o ter, perderia à proporção que ocupações
importantes fossem embutidas nas vidas dos filhos educados pelo suor dos
seus genitores, educados às custas de muitos sacrifícios , resignação e
humildade.
Imaginei um mundo repleto de casas de idosos e os filhos quando bons ,
custeando.Imaginei
que muitos seriam abandonados.
Como medida de segurança enviei aos
poderes públicos uma carta perguntando se não seria criado um manual, um
regimento, um estatuto para proteger os desprotegidos do futuro.
Sempre falei e ainda falo para todos que me escutam que, no futuro além dos
menores abandonados , serão milhares de idosos no abandono.
Brevemente o Brasil será habitado por cidadãos acima dos 60 anos .
Fui informado que tramitava no Congresso o estatuto do idoso e o estatuto
do adolescente, fiquei mais tranquilo, apenas mais tranquilo.
Salvador,
12 de janeiro de 1989
Iderval Reginaldo Tenório
O FILHO QUE NÃO PROSPEROU
Numa roda de amigos foi abordado o quanto era importante
o olhar, o cheiro , os conselhos e a presença dos pais.
Num caloroso e contagiante momento, contou um
dos amigos a seguinte história
Relatou
que na sua cidade, havia um bom senhor oriundo de classe social baixa
, que apesar do seu analfabetismo, com a sua vasta cultura
existencial e o suor do seu próprio rosto, conseguiu educar os seus 14
filhos.
O tempo passou, os filhos cresceram, alguns
galgaram postos importantes na sua nação e o bom senhor à proporção que ganhava
conhecimentos, foi envelhecendo.
Envelhecendo com saúde, com dignidade, com
cidadania e com o respeito de todos os que lhe rodeavam.
Como é peculiar à família e aquela não fugira a
regra, anos após anos procurava através de encontros familiares lembrar
ao velho carvalho o seu incalculável valor , a sua importância e o quanto era
cabal a sua existência para a sua prole.
De todos os seus filhos , um havia voado mais alto
e galgado postos estratégicos na sua República, o tempo passava e aquele filho nunca
estava presente devido a sua importância perante a nação , muitas vezes
nomeava prepostos, as vezes irmãos e até mesmo amigos para lhe substituir
nos encontros familiares, jamais negara ajuda financeira quando solicitado ,
era sempre influente nas questões decisórias da família.
O tempo passou, o ancião foi perdendo as forças, os
músculos foram minguando, os cabelos ficaram ralos , a mente foi ficando curta,
murchando e o bom homem foi paulatinamente perdendo a memória, perguntava onde
estava, muitas vezes perguntava até mesmo quem ele era.
A grande e tradicional família
continuava as suas comemorações, anos após anos, e anos após anos o
filho que prosperou era substituído por outro irmão , por um amigos
ou um dos seus funcionários, até o dia em que foi convocado, até mesmo intimado
a comparecer, em pessoa, ao centenário do patriarca por todos os componentes daquela
feliz e honesta família.
Ao chegar, entrou no quarto do genitor, se aproximou e disse :
__A bênção pai.
O velho imobilizado nada respondeu, repetiu mais
alto:
__ A benção pai , a bênção pai.
o velho abriu os olhos, mexeu o pescoço de um lado para o outro, fez esforço
para levantar a cabeça , mirou o rosto do filho e com a voz trêmula balbuciou:
__Quem é você? de onde você veio ? onde você mora?
quem é o seu pai? .
O filho parou, pensou, baixou a cabeça e disse :
__ A BENÇÃO PAI, eu sou o seu filho, o seu filho do
meio, faz mais de 20 anos que não vejo o senhor, faz mais de 20 anos que não
venho na nossa terra.
O pai mais uma vez falou:
__Quem é você, de onde você veio,
onde você mora, você é filho de quem, quem é o seu pai? Eu te abençoo mas não
sei quem é você, se você diz que é meu filho é porque é o meu filho,
porém eu não me lembro de você.
Desencantado pelo vasto tempo que havia visto o seu
pai , com a amnésia paterna e decepcionado com o que presenciara não conseguira
entender o que se passava, quando mais tarde , soube por intermédio dos
outros irmãos, que o seu pai num processo fisiológico fora perdendo
paulatinamente a capacidade de memorizar, de verbalizar e de locomoção,
passando a lembrar apenas dos fatos repetitivos, dos rostos do seu cotidiano, das pessoas que de mais perto convivera nos
últimos dias, do seu cachorro, dos utensílios de primeira necessidade, o
banheiro, as sandálias e o papagaio, primordial para a micção.
Numa onda de culpa e de
irresponsabilidade, entendeu que o pai, devido a sua ausência , havia apagado da mente
quaisquer resquícios ou lembranças de sua existência, havia apagado
de sua mente até mesmo a legitimidade paterna, entendeu também que foi a sua
ausência , a sua distância e o seu descaso para com o velho e bondoso pai que
apagara toda a sua existência como filho.
Desconfiado, deprimido e solitário partiu para a conquista,
para a luta, para a briga, se esforçou, porém o velho e bondoso senhor aos
poucos foi apagando da mente os dados e imagens cerebrais , aos poucos foi
esquecendo , esquecendo, esquecendo... até o dia em que não mais lembrava nem
de si, até o dia em que entrou em vegetação.
Com os fatos presenciados, o filho passou a
entender que o seu pai precisava era de abraços, de carinho, de respeito e de
sua presença, e não de ajuda financeira.
Foi-se o velho, com ele foi sepultado todas as suas
memórias e conhecimentos, restando as boas lembranças e os seus ensinamentos.
Para o filho ficou a certeza que foi 20 anos atrás
o ultimo dia em que o seu pai lhe viu, ficou gravado na sua memória que os seus
filhos não eram netos do seu pai e mais claro ainda, que o homem é a
mente, o homem é a comunicação , o homem é fruto de sua raiz, o homem é o
cérebro.
E que o núcleo familiar, capitaneado pelos genitores,
jamais deverá perder a sua importância, jamais deverá ser substituído e por
mais longe que o homem vá, as suas raízes serão mais fortes.
Seja pai dos seus pais.
24 de Janeiro de 1989
Iderval Reginaldo Tenório
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