quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Faleceu em Salvador o Poeta e Escritor paraibano, Marcos Sales.

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Eu (de camisa azul) e meu primo Cleber no restaurante Picuí - Salvador - BA

Faleceu em Salvador, aos 82 anos, no dia 22 de novembro de 2023  o poeta e escritor paraibano, Marcos Antônio Gomes Sales. O Marcão foi para este mortal um verdadeiro amigo e irmão. 

Por  mais de quarenta anos andamos juntos a  divulgar as coisas do sertão. As pérolas  do Luiz Gonzaga, Patativa do Assaré, João Silva, Genival Lacerda, Antonio Costa, João Goçalves, João do Vale,  João Bá, o verdadeiro Pedro Sampaio, Carlos Vilela, Gilton Della Cela, Luiz Fidelis Lopes, Bule Bule e Antonio Queiroz, Elomar, Xangay, Raimundo Sodré, Dudé das Aroeiras, Gerusa Guedes, Shallom Adonai, Quinim de Valente, Zelito Miranda, Riachão,  Perfilino Neto e outros icones do cancioneiro nordestino.

É da lavra do Marcão dezenas de causos publicados no blog.     https://iderval.blogspot.com .  Causos que documentam a vivência do homem do campo, do homem forte do nordeste e das coisas desconhecidas pelos homens da cidade.

Marcão, meu irmão, vá em paz, os seus escritos são verdadeiros documentários dos sertões do Seridó e da Borborema. Todos nós, a sua familia, a Paraiba e todo o nordeste sentirá a sua falta.

Vá em PAZ.

Iderval Reginaldo Tenório


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A onça pintada, Pedro e o Sertão da Borborema

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CRÔNICAS DO NORDESTE.

Lendas e Causos

Pedro,  de dona Zefinha,   acordou  pela madrugada, o clarão do sol começava a esconder a luz da lua.

A manhã estava fria, céu de abril de um azul profundo, sem mácula, sem uma nuvem sequer no firmamento.

Pedro foi até o terreiro, se espreguiçou, tirou uma raspa  da casca do Juazeiro, limpou os dentes  e passou água no rosto.

Cuidou das 3 cabras e dos cabritos, ordenhou a vaca mãezinha, botou água no pote da cozinha, sentou para tomar seu café  com cuscuz  e um taco de charque, assada na brasa do fogão a lenha.

Pedro vivia para a sua mãe, tudo que fazia era  em benefício da genitora. Era um rapaz bonito, sertanejo forte, sadio, trabalhador ao extremo, gentil e muito educado. Homem pacato, porém de uma coragem acima do normal.

Era  sábado, dia de feira livre no povoado de Pedra Preta, confins do alto sertão nordestino, planalto da Borborema, na gloriosa e garbosa Paraíba.

Pedro  perguntou  a sua mãe o  que precisava comprar na feira, pegou o bizaco de caçador, a velha  lazarina, o chapéu de palha, o facão e arribou para Pedra Preta, que distava mais ou menos légua e meia do sítio onde morava.

Chegou à  feira por volta das 10.30h. Comprou os mantimentos, duas bacias, feitas de folha  de flandres,  uma Alpercata, de couro cru com  solado de pneu, chumbo, bucha, pólvora e espoleta para sua arma de caça e foi tomar uns tragos com uns amigos,  pois ninguém é de ferro,  ele também era filho de Deus. Dizem que, quando o diabo não vem, manda o secretário, parece que isso é verdade .

Nosso amigo já tinha tomado umas três lapadas  de uma cana de cabeça,  das boas, estava um pouco alegre quando deu de vista com uma cabocla cor de jambo muito bonita,  corpo bem feito e um lindo sorriso . Os olhares se cruzaram e Pedro ficou animado.

Tomou mais umas duas, sempre de butuca na morena,  quando sentiu um tremendo murro que o jogou ao chão. De pronto, levantou para briga. Notou que o desafeto estava armado de faca. Deu um passo para trás e se preparou para o pior, só não ia correr do pau,  pois não era macho pra isso.

O cabra correu pra cima  e ele revidou, se atracaram.  Pega e fura ali, murro aqui e acolá, Pedro foi ferido pela faca no braço. Caíram os dois, um por cima do outro, ouviu-se um grito forte e depois o  silêncio…

O problema é que,  quando o namorado da morena, eis aí o motivo da briga,  caiu, o representante do diabo fez a sua estripulia, a faca virou a afinada ponta  e penetrou profundamente no peito do desafeto, atingiu o coração, o mesmo morreu na hora.

Pedro se apavorou, pegou seus piqualhos, sua lazarina  e caiu no oco do mundo, caatinga  adentro,  por cima de pau, pedra,  espinho e o mais que tivesse pela frente. Só não queria ser preso. Preso não, isso nunca...

Andou na mata fechada o resto da tarde e um bom pedaço da noite,  evitando sempre as moradias  esparsas  do sertão. Se embrenhou o mais que pode no carrasco sertanejo, tinha o sertão na palma da mão.

Parou exausto já tarde, bebeu a água da cabaça, escorou-se  em uma pedra e adormeceu profundamente, ali ninguém ia lhe procurar.

Acordou cedo, como sempre, e deu de cara com uma vista muito bonita. Tinha dormido perto de um córrego e um verde vale  ao pé da Serra. Fez uma pequena fogueira, pegou água na bacia de flandres, ferveu e fez o café.

Quando aconteceu o ocorrido, já tinha comprado os mantimentos, explorou os arredores e decidiu fazer acampamento no local, assim o fez.  Com o passar dos tempos fixou residência.

Depois de uns anos mandou buscar a sua mãe, construiu uma pequena casa de taipa  para os dois e ocupou o vale,  ninguém apareceu para reclamar a posse das terras. Casou com uma moça da vizinhança,  porém não teve filhos.

Possuía um cachorro e  se encheu de amores pelo bicho… era o seu companheiro, guarda costa , ajudante, tudo enfim. Era  o seu  fiel e corajoso amigo,  o nome era Leão, eram verdadeiros irmãos.

Pedro tinha progredido bastante,  era um incansável trabalhador.  Tinha no curral meia dúzia  de vacas, alguns bezerros,  bodes, uma dezena de cabras e seis cabritos. A sua mulher também era prendada, criava galinhas caipiras, perus, patos e galinhas-d'angola.

Uma bela noite acordou com o latido,  do cachorro Leão, ecoando para as bandas do curral, levantou, pegou a lazarina e foi ver o que estava acontecendo.

Chegou ao curral, leão estava indócil,  porém no escuro não deu para enxergar o que tinha acontecido, acalmou o cachorro e voltou para casa.

Ao amanhecer foi ao  curral e deu de cara com o acontecido…uma onça pintada apareceu e levou uma bezerrinha. Ficou louco da vida e resolveu de imediato  caçar a bicha. Poderia, dali para frente,  perder todos os seus animais,   a onça poderia fazer morada no seu aconchego.

No outro dia preparou todos os apetrechos, chamou Leão e bateram um longo papo sobre o ocorrido na noite anterior, diga-se de passagem, ele gostava de trocar ideias com seu amigo.

O dia era  sexta feira, todavia tinha um detalhe, era sexta feira santa, um dia sagrado para todos os sertanejos nordestinos. A sua   mulher pediu para ele não ir naquele dia, era um dia consagrado para o povo do sertão, fosse no sábado, era melhor. Pedro estava irredutível, chamou Leão  e partiram para a caçada.

Andou toda a manhã e nada de Leão dá sinal de ter farejado algo. Ao meio dia parou em uma sombra, comeu o farnel que dona  Rita preparou, deu de comer ao amigo e saiu à  procura da pintada.

Andou pouco,  o cachorro deu o sinal de ter farejado algo…foi pé ante pé, ele e leão, e por trás da pedra estava a onça dando de mamar aos dois filhotes. Parou, mirou a espingarda na cabeça da bichana e ouviu o grito…

"Pelo amor de Deus seu Pedro, não me mate não. Tô dando de comer aos meus filhos"

Menino, Pedro largou a lazarina no chão, virou-se e deu uma  carreira   por mais de légua, tão em disparada que perdeu as alpercatas e Leão nos seus calcanhares. Ambos  caíram  prostrados debaixo de uma moita  por mais de duas horas.

Quando o Pedro despertou  e ainda ofegante,  olhou para  o cachorro Leão e falou…

"Minha nossa senhora Leão, nunca vi onça falar".

E o cachorro Leão de pronto respondeu:

"Nem eu"

Eita nordeste bom , tem cada "causo" né?

                               Marcos Antônio Gomes Sales 

MS(MARCÃO)

SSA, 02/09/2021

Asa Branca/A Volta Da Asa Branca

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