sábado, 26 de novembro de 2022

Síndrome de Mirizzi- VESÍCULA E VIAS BILIARES

 

Dr. Eduardo Ramos | Síndrome de MirizziSíndrome de Mirizzi - Endoscopia Terapêutica

Desvendando a síndrome de Mirizzi / Blog Jaleko

O que você precisa saber sobre a Síndrome de Mirizzi | Colunistas


A síndrome de Mirizzi é uma rara complicação da colelitíase crônica (acometendo aproximadamente 0,05 a 4% dos pacientes com colelitíase), com maior prevalência em mulheres na idade fértil. A síndrome é caracterizada como a obstrução do ducto hepático comum ou do colédoco. Essa obstrução pode ser causada tanto por compressão extrínseca quanto por processo inflamatório no ducto, ambos gerados pela impactação de cálculos presentes no infundíbulo vesicular ou no ducto cístico. Foi descrita pela primeira vez em 1948 por Pablo Mirizzi, cirurgião argentino, ao acompanhar pacientes com coledocolitíase e observar quais fatores levariam a uma colestase extra-hepática. 

Quadro Clínico

Os sinais e sintomas mais frequentes seriam os três componentes clássicos da colangite, conhecidos como tríade de Charcot (dor abdominal, febre e icterícia). A dor no hipocôndrio direito e hipersensibilidade à palpação (sinal de Murphy positivo), são causados pelo processo inflamatório. A febre ocorre devido às alterações inflamatórias na parede da vesícula; a icterícia, devido à obstrução do fluxo da bile ao duodeno.

Podem estar presentes também queixas de náuseas, vômitos, colúria, acolia fecal, prurido, hepatomegalia e, menos frequentemente, perda ponderal. Os dados da anamnese, do exame físico e dos exames complementares podem sugerir o diagnóstico, mas, por serem pouco específicos, o diagnóstico definitivo é somente realizado no intra-operatório.

Diagnóstico

Como foi dito anteriormente, é difícil realizar o diagnóstico diferencial com outras síndromes ictéricas, mesmo com uso de exames complementares. Porém, alguns achados nos exames podem sugerir o diagnóstico de síndrome de Mirizzi. A ultrassonografia transabdominal é o exame de imagem de escolha a ser realizado, por se tratar de um exame não invasivo e de baixo custo. Tem grande valia para identificar cálculos biliares e também para indicar se há espessamento da parede da vesícula ou dilatação das vias biliares (intra-hepáticas, extra-hepáticas ou em ambas), o que sugeriria obstrução mecânica da árvore biliar. Caso seja realizada a descoberta da dilatação dos ductos, a via deve ser examinada pela colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE).

Também pode ser utilizada a cintilografia, a qual pode comprovar a obstrução do ducto cístico caso não haja o preenchimento da vesícula por contraste. A tomografia computadorizada fornece achados similares ao ultrassom, porém é um exame menos sensível. Já nos exames laboratoriais, há aumento da bilirrubina às custas da fração direta e o aumento da fosfatase alcalina, indicando colestase.

Classificação de Csendes


A síndrome de Mirizzi pode ser dividida segundo a classificação de Csendes, que tem como objetivo guiar a escolha da abordagem cirúrgica que será realizada. A classificação é organizada em tipo I a V, sendo: I) compressão extrínseca do ducto colédoco ou do hepático comum por um cálculo no infundíbulo vesicular ou no ducto cístico; II) presença de fístula colecistobiliar com diâmetro menor que 1/3 da circunferência do ducto hepático comum/colédoco; III) fístula colecistobiliar com diâmetro maior que 2/3 da circunferência do ducto hepático comum/colédoco; IV) fístula colecistobiliar que acomete toda circunferência do ducto hepático comum/colédoco; V) qualquer tipo, se houver presença de fístula colecistoentérica, sendo Va: sem íleo biliar e Vb: com íleo biliar.

A inflamação crônica das estruturas, gerada pela compressão dos cálculos no ducto hepático comum, leva à necrose dos tecidos e formação das fístulas. Na fístula colecistobiliar, o cálculo pode deslocar-se em direção ao colédoco, já na colecistoentérica, poderá ocorrer obstrução intestinal pelo cálculo, ou seja, íleo biliar.

Tratamento

O tratamento da síndrome de Mirizzi é cirúrgico, porém ainda existe grande controvérsia quanto à escolha da via que deverá ser utilizada. Alguns autores propõem que a dissecção por via laparoscópica é o tratamento de escolha. Entretanto, outros autores afirmam que essa técnica apresenta alto risco, devido à presença das alterações anatômicas locais e da inflamação no triângulo de Calot (triângulo por onde passa a artéria cística, sendo formado superiormente pela borda inferior do fígado, pelo ducto cístico à direita e pelo ducto hepático comum à esquerda), que dificultam a realização da cirurgia por cirurgiões menos experientes.

A escolha da abordagem a ser realizada varia de acordo com a classificação de Csendes do paciente. Em pacientes do Mirizzi tipo I, é aconselhável a colecistectomia parcial ou total. Em pacientes do tipo II, a colecistectomia com o fechamento da fístula (utilizando sutura com fios absorvíveis ou tubo em T) ou coledocoplastia com sutura do orifício fistuloso na parede remanescente da vesícula. Na presença de fístula colecisto-coledociana (tipos II, III e IV) é mandatória a laparotomia pela via convencional, por ser necessária a realização da drenagem biliar simultaneamente.

Conclusão

A síndrome de Mirizzi é uma patologia de difícil diagnóstico pré-operatório, pelo fato de seu quadro clínico ser pouco específico, e seu tratamento ainda gera muita discussão e controvérsia. Apesar de ser uma causa rara de icterícia, essa síndrome deve ser lembrada como um dos possíveis diagnósticos diferenciais, facilitando, assim, seu reconhecimento precoce. Quanto mais breve for sua suspeita e diagnóstico, menor o risco de complicações cirúrgicas (por exemplo, a lesão do ducto hepático comum), já que auxilia o cirurgião na escolha e preparo de sua abordagem. 

Autora: Giovanna di Cola

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