Nesta poesia o autor registra o que era a politica brasileira em tempos passados , algo mudou com a melhora da educação.
Cabe à sociedade atual cobrar mais ainda e não cair nas promessas dos políticos em busca do voto.
O voto é uma conquista da sociedade, bem utilizado fará um novo desenho deste sofrido país.
Iderval Reginaldo Tenório
CUNVERSA DE MATUTO
Por Patativa de Assaré
Zé Fulô
Meu amigo João Moiriço,
Eu agora fiquei certo
Que nóis já tá bem perto
De sair do sacrifiço.
Eu onte uvi num comiço
De um dotô candidado,
Home sero e muito isato
E ele garantiu que agora
Vai havê grande miora
Para o pessoá do mato.
No comiço ele falou
Que depois que ele vencê,
Vai com gosto protegê
A cada um inleitô.
O povo trabaiadô
Que padece no roçado
Pode votá sem coidado
Que depois das inleição
Com a sua proteção
Vai tudo recompensado
Aquele é home de bem,
Quando desceu do palanco,
Falô com preto, com branco,
Com rico e pobre tombém;
Ali não ficou ninguém
Pra ele não abraçá,
Veve sempre a conversá,
É alegre e satisfeito,
Num home daquele jeito
Faz gosto a gente votá
Do palanco ele desceu
Alegre e dizendo graça
E mais tarde lá na praça
Palestrando apareceu,
Se assentou pertinho deu
Lá num banco da venida,
Perguntou por minha vida
E disse na mesma hora
Que a sua vitóra
Já tá quage dicidida.
E pediu que eu precurasse
Com muita delicadeza
Aqui nesta redondeza
Gente que nele votasse
Que depois que ele ganhasse
Ia as coisas resorvê.
A premêra era fazê
Aqui no nosso lugá
Um grande grupo escolá
Pra nossos fio aprendê.
Depois um mioramento
Pra nois pudê trabaiá,
Semente pra nóis prantá
Sem precisá pagamento,
Quarqué coisa no momento
É nóis querê e pedi
E depois que conseguí
Esta premêra vantange,
Vem uma bela rodage
Da cidade até aqui.
Eu tenho esperança e fé
Na promessas do dotô
E pedi a ele eu vou
Um imprego pra José.
Mais tarde se Deus quisé,
O meu fio faz figura,
Saindo da agricurtura.
Este cansado chamego
E arranjando um bom imprego
Lá dentro da Prefeitura.
É tanto que vou caçá
Argum voto por aqui;
Já cunversei com Davi,
Com Vicente e Vardemá,
Fuloriano,Mozá,
Mane Chico e Zé Lavo,
Dona Suzana e Lindo,
Napoleão e Romeu,
E tudo me prometeu
Que vai votá no dotô.
João Moiriço ,meu amigo,
Sei que você acredita,
Não venho fazê visita
Hoje aqui no seu abrigo;
Oiça bem o que lhe digo
Você nunca me faltou
E a ocausião chegou
De pedí seu voto isato
Para o dotô candidado
De prestijo e de valô.
Isto que eu tô lhe falando
É bom para nosso futuro,
Nóis tamo num grande escuro
E uma estrela vem briando;
Veja que você votando
Neste home de tanto brio,
Em quem com gosto confio,
É um negoço importante
Vai havê de agora em diante
Escolas pra nossos fio!
João Moiriço:
Meu amigo Zé Fulô,
Vou lhe dizê a verdade:
É véia a nossa amizade
Porém você se enganou.
Pode pedí, que eu lhe dou
Uma quarta de feijão
Uma arroba de argodão
E cinco metro de fumo,
Tudo com gosto lhe arrumo,
Porém o meu voto, não!
Lhe dou se você quisé
Minha boa lazarina
E o meu galo de campina
Que eu amo com muita fé,
Dou minha porca Baié
E o meu cachorro Sultão,
Maria dá um capão
E o Chico dá um cabrito,
Isso tudo eu admito
Porém o meu voto, não!
Meu amigo Zé Fulô,
Não siga por esta tria,
Você ainda confia
Em premeça de dotô?
Aquilo que ele falou
É somente imbromação.
Quando é tempo de inleição
Esse home se aprepara
Trazendo um santo na cara
E o diabo no coração.
Você não dê confiança,
Pois quando a campanha vem,
Com ela chega tombem
A pabulage e a lembrança.
As vez os matutos dança
Com as fia do dotô,
É aquele grololô,
Tudo alegre e satisfeito,
Antes do dia do preito ,
Tudo é prefume e fulô.
Mas depois que passa o preito,
O desmantelo renova,
Palavriado não prova
A bondade do sujeito.
Pra garrafa desse jeito
Não iziste sacarrôia,
Não quera fazê iscôia
Se não você sai perdendo,
Este dotô tá inchendo
A sua venta de fôia.
Isto já vem do passado
E a pisada ainda é essa,
Por causa dessas premessas
Meu avô foi inganado,
O meu pobre pai coitado!
Foi inganado tombém
E eu,que já conheço bem,
Pra votá sou muito franco,
Mas porém só voto em branco,
E não confio em ninguém.
Em branco eu tenho votado,
Pois só assim me convém
Pruquê votando em arguém,
Traz o mesmo risurtado,
Com certos palavreados
Ninguém pode me iludi,
Vivo trabaiando aqui
Nesta vida aperreada,
Mas não dregrau de escada
Pra seu fulano subi.
Zé Fulô repare bem,
As premessa é só na hora,
Porém,depois da vitóra,
Premessa valô não tem
E esperá por quem não vem
Martrata,dói e acabrunha,
Digo e tenho testemunha,
Quage todo candidato
Tem a mamparra do gato,
Dá um bote e esconde a unha.
Na campanha eleitorá
Quando ele encronta a gente,
Chama de amigo e parente,
Naquele parrapapá,
Mas, depois de eles ganhá
E recebê posição,
A ninguém presta tenção,
Assim que a gente repara,
Vê logo a cara do cara
Como cara de lião.
Zé Fulô não seja bruto
Seja mais inteligente,
Repare que aquela gente
Não faz conta de matuto.
Não dou crença e nem escuto
Premessa desse dotô,
Pra não passá o que passou
Sendo inganado e inludido,
O meu pobre pai querido
E o finado meu avô.
Tome esta boa lição,
Dêxi logo esta veneta,
Seja sero,não se meta
Com fuxico de inleição;
Este dotô sabidão
Que agora lhe apareceu
E tudo lhe prometeu,
Depois da vitóra pronta,
Fica fazendo de conta
Que nunca lhe conheceu.
E se você se afobá,
E pegá com lerolero,
Zangado e falando séro,
Querendo se revortá,
Pedindo pra lhe pagá
Todas as premessas que fez,
Ele,com estupidez,
Fica cheio de maliça,
Dá logo quexa a poliça
E lhe leva pro xadrez.
Portanto, vá se aquetá
Não entre nesse curtiço,
Não vá dexá seu serviço
Pra sê cabo eleitorá.
Vá sua casa zelá,
Vá cuidá de seu trabaio,
Não pegue nesse baraio,
Se não você perde o jogo
Água é água e fogo é fogo
Cada macaco em seu gaio.
Patativa de Assaré é Poeta.
Biografia de Patativa do Assaré
Patativa do Assaré (1909-2002) foi um poeta e repentista brasileiro, um dos principais representantes da arte popular nordestina do século XX. Com uma linguagem simples, porém poética, retratava a vida sofrida e árida do povo do sertão. Projetou-se nacionalmente com o poema "Triste Partida" em 1964, musicado e gravado por Luiz Gonzaga. Seus livros, traduzidos em vários idiomas, foram tema de estudos na Sorbonne, na cadeira de Literatura Popular Universal.
Infância e Adolescência
Patativa do Assaré (Antônio Gonçalves da Silva) nasceu no sítio Serra de Santana, pequena propriedade rural, no município de Assaré, no Sul do Ceará. Foi o segundo dos cinco filhos dos agricultores Pedro Gonçalves da Silva e Maria Pereira da Silva.
Com seis anos, perdeu a visão do olho direito em consequência do sarampo. Órfão de pai aos oito anos de idade teve que trabalhar no cultivo da terra, ao lado do irmão mais velho, para sustentar a família.
Com a idade de 12 anos, Patativa do Assaré frequentou uma escola durante quatro meses onde aprendeu um pouco da leitura e se tornou apaixonado pela poesia. Com 13 anos começou a fazer pequenos versos. Com 16 anos comprou uma viola e logo começou a fazer repentes com os motes que lhe eram apresentados.
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