Histórias do Zezinho, Tia Joventina e Tio João.
Conta Zezinho, que existem fatos na vida, que jamais sairão da memória do ser humano.
Refere que quando criança, em Juazeiro do Norte, Sul do Ceará, era costume de sua mãe visitar nos fins de semanas a sua irmã mais velha, Tia Joventina, que ele e os seus irmãos chamavam-na apenas de Titia.
Titia era casada com o Tio João, um pequeno comerciante de carvão vegetal, naquela época não existiam fogões a gás, nem na casa dos ricos, o Tíi João, como era chamado, abastecia alguns moradores do bairro vendendo o seu produto a quilo. Quando chegava em casa tinha que tomar um banho reforçado, como não possuía chuveiro, o banho era de cuia, a vida era muito difícil. O casal tinha três filhos, dois homens e uma mulher, saíram da Serra do Araripe para morar em Juazeiro do Norte, tal qual os pais do Zezinho.
Moravam na Rua do Limoeiro, que ficava próximo ao Seminário dos Capuchinhos, os Padres Franciscanos, que administravam uma grande Escola e uma Igreja fenomenal, esta congregação ocupava uma área de terra que possuia campos de futebol, oficinas, áreas de laser e um grande estacionamento com um muro em arcos maciços de 3,5 metros de altura, com parede de 2,5metros de largura, utilizados para belos passeios ao redor do Santuário, lembrava muito os Arcos da Lapa do Rio de Janeiro.
Naquela época, o Bairro dos Franciscanos era considerado muito longe do bairro que o Zezinho morava, o bairro do Socorro no centro da cidade, considerado um bairro nobre. Foi lá, junto ao bairro da matriz, que teve início o núcleo do município, o embrião da Meca do Cariri e todas as reuniões na luta pela emancipação do Juazeiro do Norte, o famoso movimento que recebeu o nome de Sedição de Juazeiro. Neste bairro morou o Padre Cícero Romão Batista na rua São José, neste mesmo bairro ele foi sepultado. Os restos mortais encontram-se no altar da Igreja de Nossa Senhora do Perpétuo do Socorro, no Cemitério do Socorro. É também neste cemitério onde encontram-se sepultados os homens e as mulheres que fizeram a história do município.
É um bairro importante para o mundo, pois todos os dias 02 de novembro, o dia de finados, é visitada por mais de 500mil fiéis, chamados de Romeiros do meu Padim e por mais de 150mil na Romaria de Nossa Senhora das Candeias. Durante o ano, todos os dias, é visitado por 2mil pessoas e nos dias 20 de cada mês, por 30 a 40 mil, para participarem presencialmente de uma grande missa celebrada por mais de 15 padres, vários bispos do Nordeste e de outras regiões do Brasil. Como é transmitida por diversas rádios, televisões e pela internet, é assistida por mais de 2milhões de pessoas mundo afora.
Voltando à casa da Tia do Zezinho.
Geralmente a mãe do Zezinho ia para a casa de sua irmã a pé, levava ao seu redor os filhos, a ninhada era em número de dez, geralmente iam os cinco mais novos, porém quando o pai de Zezinho estava em Juazeiro do Norte, iam de JEEP, era um dia de festa. O seu pai era um comerciante de peso no ramo da Farinha de Mandioca para toda a região, divisa do Ceará com Pernambuco. Abrangia a Serra do Araripe, Feira Nova, Exu, Bodocó, Crato e Juazeiro do Norte. O guerreiro Plantava, fabricava, comprava e vendia a melhor Farinha e a mais apreciada goma do Nordeste, com a sua atividade passava muito tempo na Chapada do Araripe a orientar os demais moradores, os pequenos agricultores. A sua prioridade era a Escola dos filhos, sobrinhos, irmãos, primos, afilhados, amigos e muitos funcionários, dizia que no futuro a força motora perderia a sua importância e o cérebro seria o senhor absoluto do futuro do mundo. A prosperidade estava atrelada à educação, nem os animais pegariam tanto peso, seriam animais de estimação e para o esporte. Eram as suas palavras: "Estudem, trabalhem, sirvam ao próximo, sejam honestos, não esqueçam da gratidão e tenham compaixão".
A
Casa da Tia Joventina era estreita e comprida,
no quintal algumas árvores frutíferas de pequeno porte, como goiabeiras
e laranjeiras,
porém, o que chamava a atenção de todos, era uma cacimba estreita e
profunda,
boca redonda, paredes sem tijolos, tortas e ao fundo se enxergava um
espelho d'água,
bem distante. Bem distante mesmo, pois a boca da cacimba era maior três
ou quatro vezes o tamanho do espelho do fundo,
tanto que a sua mãe e a sua tia tinham muito cuidado quando Zezinho e os
seus irmãos chegavam à
beira deste poço, era uma cacimba funda e torta, disto ninguém esquece.
Era comum ouvir as vozes das duas irmãs em uníssono: " Saiam da beira
desta cacimba meninos, saiam". Como menino é bicho teimoso, às vezes
jogavam uma pequena pedra e esperavam um bom tempo para chegar ao fundo,
quando fazia timbungo, todos corriam para dentro de casa.
A filha de sua tia, que era a mais velha dos irmãos, era casada com um outro primo legítmo do Zezinho, filho de uma das irmãs do seu pai. A moça tinha a sua própria casa e morava com o seu esposo noutra rua. O filho mais velho, que Zezinho chamava de Vicente de Titia, trabalhava com a venda de diversos produtos, de porta em porta em todo o nordeste, ora ouro legítimo ou banhado, ora panelas de alumínio, ora roupas, redes e outras mercadorias. O caçula, chamado de Zé de Titia, trabalhava numa oficina mecânica, provavelmente de automóveis, pois as suas roupas eram sujas de óleos, graxas, tintas, gasolina e querosene, Zezinho se impressionava e perguntava à sua tia como ela lavava aquelas roupas, muitas eram macacões de brim cor de cinza.
Quando eles chegavam à casa de sua tia, ela fazia café para os adultos e o Tio João ia pra rua comprar algo, voltava dez minutos depois, trazia pães doces cobertos por côco ralado adocicado e garrafas de uma bebida de caju fabricada em Juazeiro do Norte, chamada cajuína São Geraldo, segundo Zezinho, o melhor refrigerante da face da terra. Estes passeios foram os melhores do mundo, só sabe quem viveu.
Zezinho e os seus irmãos cresceram, viraram humanos guiados pelos ditames universais, aqueles do imaginário dos homens. Estudaram e passaram a lutar arduamente pelo pão de cada dia. A tia Joventina e o Tio João saíram da rua do Limoeiro, mesmo assim continuaram as mesmas visitas.
Zezinho, seus irmãos, seus pais, Tia Jovem, Tíi João e agora a sua filha, que morava com as suas crias na casa vizinha, participavam de grandes confabulações. Não faltavam o café, as bolachas lídias, os pães doces, as saborosas cajuínas e bolos modernos feitos pela sua prima Vicência .
Zezinho sempre fala, que a sua mãe e a tia Joventina, a TITIA, na sua opinião foram as mais unidas irmãs da face da terra.
Esta é uma das memórias do simples Zezinho, que à procura de dias melhores, não sabe se foi a melhor escolha, mudou-se para outras plagas para completar os estudos.
Agradece todos os dias os cuidados de sua mãe e de sua tia Joventina. Zezinho sempre fala que tinha três mães: a sua mãe uterina, Tia Jovem e Tia Maria Nenzinha, relata também, que possuía mais de quarenta irmãos, 09 legítimos e os demais eram primos. Zezinho foi uma criança, uma verdadeiramente criança e diz que jamais deixará ser criança, uma vez que a felicidade é irmã siamesa da infância, prima da adolescência, amiga do adulto e apenas conhecida dos relacionamentos sociais e financeiros.
Zezinho foi uma criança feliz, bem acolhida e que sempre acreditou na família. Zezinho tem certeza, que a sua mãe e a sua tia Joventina estão confabulando e rindo daqueles encontros da Rua do Limoeiro.
__" Cumade, quando cumpade Zé vem da serra, será que tá chuvendo por lá?" pergunta Tíi João.
Iderval Reginaldo Tenório
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