quarta-feira, 13 de setembro de 2023

ZEZINHO E OS ABANDONADOS DO CARIRI CEARENSE

 

ZEZINHO E OS   ABANDONADOS DO CARIRI CEARENSE
                                    
                                                     
          CEGO OLIVEIRA-JUAZEIRO DO NORTE-ESTE  O ZEZINHO  ESCUTOU MUITO.

Conta Zezinho, que quando criança,  na sua cidade natal, Juazeiro do Norte,  lá no Sul do  Ceará, ficava impressionado e sempre que podia passava horas a observar os mendigos, os   perambulantes e os moradores de rua   da  cidade.  Estes cidadãos, sem cidadanias,  eram chamados  de esmolés. Todos que pediam eram colocados no mesmo patamar, no mesmo balaio. Bastava um defeito físico, visual, auditivo ou mental para serem tachados de mendigos.

Depois que atingiu a fase  adulta,  passou a entender o quadro sociológico e de invisibilidade daqueles humanos. Muitos eram doentes  psiquiátricos e neurológicos  esquecidos  pela sociedade, alguns, vitimas do alcoolismo crônico, outros eram idosos e  crianças   abandonadas pelos familiares e pelos poderes publicos. A maior parte oriundo da camada mais baixa da pirâmide social, o que existia de comum era que todos  viviam abaixo da linha de pobreza, no limbo social, na nação dos excluídos. 
 
Agora pasmem,  diversos deles  eram verdadeiros gênios das artes, das crendices populares e das matrizes religiosas universais. Muitos eram artistas natos, ícones do regionalismo herdado das tradições milenares dos  povos autóctones( os indíos,  dos invasores estrangeiros, notadamente os portugueses e os holandeses, e dos africanos sudaneses originários  da Nigéria, Daomé e Costa do Marfim, dos bantus capturados no Congo, Angola e Moçambique  descarregados  no país a partir do século XVI.  
 
Estes abnegados poços de cultura, por serem deficientes físicos, auditivos ou visuais   utilizavam-se das artes,  oferecidas por Deus, para as suas  sobrevivências. Tocavam flautas, pífanos, pandeiros, lâminas de serrotes, cítaras, foles artesanais  de oito baixos, a famosa pé de bode; rabecas, triângulos, berimbaus, apitos, pratos, tambores, reco-recos, maracás, realejos, violões, cavaquinhos e diversos outros instrumentos,  às vezes, simultaneamente. 
 
Perdia horas e horas a ouvir os seus instrumentos, suas músicas  e as suas vozes. Depois  de consciente e adulto, aquelas horas,  de perdidas  não tinham nada,  foram  horas  achadas e importantes no forjamento  da cidadania. Horas  gravadas na mente e importantíssimas para a  formação humana, social   e cultural dos privilegiados que tiveram acesso aos legados daqueles descompromissados espetáculos.

O que mais apreciava,  eram as histórias cantadas nas suas características vozes anasaladas, choradas, gemidas e arrastadas, como a pedir clemência. 
 
Muitos foram os clássicos e os benditos gravados na mente de cada espectador, que durante  a  vida,  inconscientemente, repete e vive cada instante relembrado, cada rosto, cada gesto, cada acorde e cada tom de voz  daqueles  guerreiros Caririenses.

Zezinho tem gratidão eterna aos  abnegados e injustiçados gênios do seu Cariri, de sua serra do Araripe, de sua   Juazeiro do Norte e  do seu abençoado Ceará. 
 
Ao Cego Oliveira e a todos os cantadores de rua, agradece pelas aulas não valorizadas à época e que hoje cora de vergonha a face daqueles  que  viveram, nada fizeram e não souberam valorizar aqueles professores que contavam a a história do seu povo  através das artes. 

Agradece aos professores da universidade da  vida, aos difundidores  das belas  e democráticas culturas dos seus  ancestrais. 
 
Viva os ícones que ficaram no esquecimento, mas que brotam de vez em quando  dos infindáveis canteiros e pomares  da sua  mente. 

                                Palavras do Zezinho:                              
"O meu muito obrigado aos  meus eternos professores".

      Salvador,18 de Março de 2023

          Iderval Reginaldo Tenório

 

Adendo importante.

O que caracteriza a cidade de Juazeiro do Norte, é que foi fundada pelo Padre Cicero Romão Batista, padre que nasceu na cidade do Crato, da qual foi desgarrada a cidade de Juazeiro após o milagre da hostia sagrada em 1889, o estopim para a guerra da emacipação, chamada   A SEDIÇÃO DE JUAZEIRO.

Muitos idosos, de todo o nordeste, tinham um compromisso com o Padim Ciço: Viver os seus últimos dias  ao lado do fundador na meca do Cariri  e lá ser sepultado no mesmo cemitério onde encontram-se os seus restos mortais.

Então, todos os anos, no mes de Novembro, dia de finados, muitos nordestinos visitam  o Padre Cicero e uma parte finca residencia no município. Diferente das cidades praieiras como Santos, João Pessoa e Aracaju, nas quais migram para lá os grandes aposentados, homens e mulheres com boas rendas e muitos levam as suas familias. Para  o Juazeiro migram os  idosos pobres, doentes e sem paradeiros com a finalidade de honrarem  o compromisso com o milagroso Padim. 

É uma cidade  com gente de todos os Estados do Nordeste. Muitos artesãos, violeiros, beatos, analfabetos e  pedintes. Grandes comerciantes e industriais, centenas  professores universitários e milhares de estudantes de nível técnico e  superior de todo o país,  por ser hoje um dos  pólos universitarios,  religioso e turístico do Brasil.   É Juazeiro do Norte, hoje com 300mil habitantes, a  metrópole finanaceira e aeroviária da região do Cariri Cearense. Num raio de 300 quilometros, é o seu moderno aeroporto, a ligação de mais de 1,5 milhão de habitantes  com o resto do país.

Tudo tem que passar pela Meca do Cariri, A Capital da Fé.

Nas decadas de 50 , 60 e 70 iniciou o seu real crescimento para se transfornar na metrópole da região. 

Era o seu slogan nestas  décadas :

" Juàzeiro do Norte, a cidade que mais cresce no Nordeste e no Brasil"

Iderval Reginaldo Tenório

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