ESCUTE O GRANDE DUDÉ DA AROEIRAS, UM DOS GRANDES ARTISTAS DA PARAIBA-
CRÔNICAS DO NORDESTE.
Lendas e Causos
Pedro, de dona Zefinha, acordou pela madrugada, o clarão do sol começava a esconder a luz da lua.
A manhã estava fria, céu de abril de um azul profundo, sem uma nuvem sequer no firmamento.
Pedro foi até o terreiro, se espreguiçou, tirou uma raspa da casca do Juazeiro, limpou os dentes e passou água no rosto.
Cuidou das 3 cabras e dos cabritos, ordenhou a vaca mãezinha, botou água no pote da cozinha, sentou para tomar seu café com cuscuz e um taco de charque assada na brasa do fogão a lenha.
Pedro vivia para a sua mãe, tudo que fazia era em benefício da genitora. Era um rapaz bonito, sertanejo forte, sadio, trabalhador ao extremo, gentil e muito educado, homem pacato, porém de uma coragem acima do normal.
Era sábado, dia de feira livre no povoado de Pedra Preta, confins do alto sertão nordestino.
Pedro perguntou a sua mãe o que precisava comprar na feira, pegou o bizaco de caçador, a velha lazarina, o chapéu de palha, o facão e arribou para Pedra Preta, distava mais ou menos légua e meia do sítio onde morava.
Chegou à feira por volta das 10.30h. Comprou os mantimentos, duas bacias, feitas de folha de flandres, uma Alpercata de couro cru com solado de pneu, chumbo, bucha, pólvora e espoleta para sua arma de caça e foi tomar uns tragos com uns amigos, pois ninguém é de ferro e também era filho de Deus. Dizem que, quando o diabo não vem, manda o secretário, parece que isso é verdade.
O môço após três lapadas de uma cana de cabeça, das boas, estava um pouco alegre. Deu de vista com uma cabocla cor de jambo muito bonita, corpo bem feito e um lindo sorriso. Os olhares se cruzaram e Pedro ficou animado.
Tomou mais umas duas, sempre de butuca na morena, quando sentiu um tremendo murro que o jogou ao chão. De pronto levantou pra briga. Notou que o desafeto estava armado de faca. Deu um passo para trás e se preparou para o pior, só não ia correr do pau, pois era macho sim senhor, o caboclo era paraibano dos bons.
O cabra correu pra cima e ele revidou, se atracaram. Pega e fura ali, murro aqui e acolá, Pedro foi ferido pela faca no braço. Caíram os dois, um por cima do outro, ouviu-se um grito forte e depois o silêncio…
O problema é que, quando o namorado da morena, eis aí o motivo da briga, caiu, o representante do diabo fez a sua estripulia, a faca virou a afinada ponta e penetrou profundamente no peito do desafeto, atingiu o coração, o mesmo morreu na hora.
Pedro se apavorou, pegou seus piqualhos, sua lazarina e caiu no ôco do mundo caatinga adentro por cima de pau, pedra, espinho e o mais que tivesse pela frente. Só não queria ser preso. Preso não, isso nunca...
Andou na mata fechada o resto da tarde e um bom pedaço da noite, evitando sempre as moradias esparsas do sertão. Se embrenhou o mais que pode no carrasco sertanejo, tinha o sertão na palma da mão.
Parou exausto já tarde, bebeu a água da cabaça, escorou-se em uma pedra e adormeceu profundamente, ali ninguém ia lhe procurar.
Acordou cedo, como sempre, e deu de cara com uma vista muito bonita. Tinha dormido perto de um córrego e um verde vale ao pé da Serra. Fez uma pequena fogueira, pegou água na bacia de flandres, ferveu e fez o café.
Quando aconteceu o ocorrido, já tinha comprado os mantimentos. Explorou os arredores e decidiu fazer acampamento no local, assim o fez. Com o passar dos tempos fixou residência.
Depois de uns anos mandou buscar a sua mãe, construiu uma pequena casa de taipa, para os dois, e ocupou o vale. Ninguém apareceu para reclamar a posse das terras. Casou com uma moça da vizinhança, porém não teve filhos.
Possuía um cachorro e se encheu de amores pelo bicho… era o seu companheiro, guarda costa, ajudante, tudo enfim, o seu fiel e corajoso amigo, o nome era Leão, eram verdadeiros irmãos.
Pedro tinha progredido bastante, era um incansável trabalhador. Tinha no
curral meia dúzia de vacas, alguns bezerros, um bode, uma trinca de cabras e dois cabritos. A sua mulher também era prendada, criava galinhas caipiras, perus, patos e galinhas-d'angola.
Uma bela noite acordou com o latido do cachorro Leão ecoando para as bandas do curral, levantou, pegou a lazarina e foi ver o que estava acontecendo.
Chegou ao curral, leão estava indócil, porém no escuro não deu para enxergar o que tinha acontecido, acalmou o cachorro e voltou para casa.
Ao amanhecer foi ao curral e deu de cara com o acontecido…uma onça pintada apareceu e levou uma bezerrinha. Ficou louco da vida e resolveu de imediato caçar a bicha, poderia inclusive perder todos os seus animais. Dali para frente a onça poderia fazer morada no seu aconchego, a onça foi condenada á morte para o bem dos seus animais.
No outro dia preparou todos os apetrechos, chamou Leão e bateram um longo papo sobre o ocorrido na noite anterior, diga-se de passagem, ele gostava de trocar ideias com seu amigo.
O dia era sexta feira, todavia tinha um detalhe, era sexta feira santa, um dia sagrado para todos os sertanejos nordestinos. A sua mulher falou para ele não ir naquele dia, fosse no sábado, era melhor. Pedro estava irredutível, chamou Leão e partiram para a caçada.
Andou toda a manhã e nada de Leão dá sinal de ter farejado algo. Ao meio dia parou em uma sombra, comeu o farnel que dona Rita preparou, deu de comer ao amigo e saiu à procura da pintada.
Andou pouco, o cachorro deu o sinal de ter farejado algo…foi pé ante pé, ele e leão, e por trás d e uma pedra estava a onça dando de mamar aos dois filhotes. Parou, mirou a espingarda na cabeça da bichana e ao puxar o cão, com o estalido da engrenagem, a onça foi despertada e o Pedro ouviu um grito de socorro…
"Pelo amor de Deus seu Pedro, não me mate não. Tô dando de comer aos meus filhos".
Menino, Pedro largou a lazarina no chão, virou-se e deu uma carreira por mais de uma légua, tão em disparada que perdeu as alpercatas e Leão nos seus calcanhares. Ambos caíram prostrados debaixo de uma moita por mais de duas horas.
Quando o Pedro despertou e ainda ofegante, olhou para o cachorro Leão e falou…
"Minha nossa senhora Leão, pelos poderes de Deus, nunca vi onça falar".
E Leão de pronto respondeu:
"Nem eu"!
Eita nordeste bom. Tem cada "causo" né?
MS(MARCÃO)
SSA, 02/09/2021
ESCUTE O GRANDE DUDÉ DA AROEIRAS, UM DOS GRANDES ARTISTAS DA PARAIBA-
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