sexta-feira, 1 de agosto de 2025

O CASARÃO DAS ARARAS

 

Araras Vermelhas Amarelas Azuis Coloridas Birds Park Foz Iguacu Paraná —  Foto © vitormarigo #204199294

 

O CASARÃO DAS ARARAS

( Diana Barbosa – 01. 08. 2025 )

 

Éramos oito, entre irmãos e primos . Residíamos pela rua Padre Cícero , após a praça, conhecido pelo “ Quarteirão Barbosa “ . Em dias letivos, saíamos todos juntos para seguir ao Colégio Salesianos, isto , ainda pela década de 70 . Garotada motivada, alegre e cheia de vida .

Ao chegarmos no cruzamento com a Rua Alencar Peixoto, havia uma parada obrigatória  no “ Casarão das Araras “ . Era a casa do próspero comerciante Sebastião Amorim, pois haviam belíssimas araras, e eram valentes ! Recordo que , inicialmente, viviam soltas , pelas árvores, posteriormente, colocaram em gaiolas . Era lindo de vê , um espetáculo

Anos e anos depois, nesta mesma casa , encontrei o amigo Evison , filho do supramencionado comerciante , sozinho, balançando -se numa cadeira , reflexivo .Comumente necessitava trafegar por aquela área da cidade e lá estava sempre Evison . Começaram a aparecer ornamentando aquela casa lindas flores, plantas raras e bem cuidadas . Era Evison, externando a sua dor , na beleza das plantas .

O meu amigo Evison havia cuidado com carinho e esmero da sua mãezinha até o final da vida, cumprira a sua missão, entretanto, ganhara uma melancolia infindável . Ao passar e vê – lo naquele balanço , buscando talvez um consolo, dirigia -me em sua direção e provocava -lhe uma prosa, comentando acerca do Juazeiro e suas transformações . Outras vezes , estava com o tempo concorrido e impossibilitada de prosseguir na conversa , então, somente cumprimentava :

- Olá amigo Evison !

Ele somente respondia :

- Ei, Diana !

Todavia , o importante são os sentimentos que provocamos nas outras pessoas, estes , deixam marcas indeléveis nos corações .

Ao passar pelo “ Casarão das Araras “  nos meses de janeiro e fevereiro, o amigo Evison chamava -se com força e, ao aproximar , recebia das suas mãos um saco contendo  mangas deliciosas , fresquinhas , da própria mangueira que abrigava as araras em tempos remotos .

E foi assim , amigo Evison , canto uma canção em sua despedida , com saudades : “ fica sempre um pouco de perfume nas mãos que oferecem rosas , nas mãos que sabem ser generosas “ ...

Vá em Paz , a sua amada mãezinha lhe espera ...

 

quinta-feira, 31 de julho de 2025

APELO DE UM AGRICULTOR-POEMA DO CEARENSE PATATIVA DO ASSARÉ

 



 

Nesta página, mais uma pérola da poesia brasileira do mestre Patativa do Assaré.

Nesta época estava em voga a discussão sobre a aposentadoria do homem do  campo,   60 OU 65 ANOS ?

O mestre chama para si o sofrimento do homem do campo, o homem que produz comida para todos os citadinos comerem. O homem que trabalha das quatro da manhã até as vinte e duas, e passa a noite pensando no que fez das 04 as 22. Sonha com as chuvas, com as crias do pouco gado,  no bucho dos filhos, da esposa, da mãe, do pai,  do sogro e sogra, e se vai ter alimentos para os pequenos animais.

Homem que só faz trabalhar e no fim da jornada da  vida, fica abandonado sem uma aposentadoria digna, quando consegue.  

Os meus pais e o velho Patativa do Assaré viveram esta sofrida demanda. Apesar do analfabetismo e abandono, muitos conseguiram transmitir aos filhos a necessidade de estudar. Para que no futuro, em vez  da enxada, use a caneta, em vez de capinar a terra, que capine o papel e em vem da tinta   finita e o grafite, que use  a massa branca do  cérebro, como tinta neuronal infinita. 

Muitos agricultores do nordeste levaram à serio este pensamento, e muitos têm filhos em todo o Brasil e em todas profissões, do mais baixo cargo aos mais altos da nação.

O agricultor brasileiro de subsistência  merece respeito.

Iderval Reginaldo Tenório


APELO DE UM AGRICULTOR

Patativa do Assaré

 

 

Seu dotô, não lhe aborreço,
Venho é fazê um pedido
E como sei qui merêço,
Espero sê atendido.
Não quera se aborrecê,
Pois antes de lhe dizê
O meu desejo sagrado,
Vou minha históra contá
E o senhô vai iscutá
Todo meu palavriado.

 

 
Vevi sempre a trabaiá
De ferramenta na mão
Tenho no rosto o siná
Do quente só do sertão.
Tratando de agricurtura
Já mostrei grande bravura
Sempre dei uma premêra
Naquele tempo passado,
Fui o herói do machado
Foice, inxada e roçadeira.

 

 
Sei qui o dotô inguinora,
E tem bastante razão,
Pois quem na cidade mora,
Não vai pensá no Sertão,
E por isso eu vou assim
Contá tin-tin por tin-tin
Como é que tenho vivido,
Minhas razão eu dizendo
O dotô fica sabendo
Quanto eu lhe tenho servido.
 
Sou pai de quatôze fio,
Cabras macho de valô,
Pois num tem nenhum vadio,
São todos trabaiadô,
Cada um destes cabôco
Aprendeu a lê um pôco,
Mais porém mode votá,
Nunca nenhum levô pau,
Já são quatôze degrau
Pra seu dotô se atrepá.
 
Quando o dia amanhecia,
Que meu café eu tomava,
Pra meu roçado  ia
E os fio me acompanhava;
Pra roça eu levava tudo
Era os miúdo e os graúdo,
Era os menino e os rapaz,
Eu satisfeito e contente
Ia seguindo na frente
E aquela infiêra atráz.

O mais véio dava um grito:
__Anima rapaziada!
Era um truvejo bonito
No manejá das inxada;
Com licença da palavra,
Eu tinha da minha lavra
Munta gente em serviço
Trabaiando no roçado
Mode abastecê os mercado
Com os geno alimenticio
 
Defendendo a vida alêia,
Vivi sempre a trabaiá
E nunca fiz cara feia
Promode imposto pagá,
Pois todos aquele que tem
Budega, loja , armazém
E ôtras vendas de valô
O seu lucro nunca estraga,
Pruquê o imposto quem paga
É sempre o consumidô.
 
Fui um  correto sujeito 
E nunca baruio fiz.
Bradando contra os dereito
Criado em nosso país,
Eu nunca me revortava 
Quando pra fêra eu levava
Mio, farinha e feijão
Mode vendê no mercado
Qui chegava um impregado
Trazendo um papé na mão.
 
O agricurtô é desposto
Ele vende , paga imposto,
Se compra, paga também.
Nesta coisa maginando
Vejo qui venho pagando
Imposto derne menino,
Quando comprava bom-bom
Qui chupava e achava bom
Quando eu era pequeninino.
 
Mesmo assim , falando errado,
Já contei a seu dotô,
Quem eu já fui no passado,
Honesto e trabaiadô.
A linguage tá errada
Mas a verdade é sagrada.
E agora preste tensão,
Tenha a bondade de uvi
O qui eu venho lhe pedi
Com dereito e com razão:
 
Não lhe minto e nem lhe nego
Já tenho sessenta ano,
Sofro munto, não sossego,
Já vivo mole, sem prano;
E por isto, nesta idade,
Eu venho aqui lhe rogá
Pra eu sê apusentado
Com dereito carimbado,
Por meio do FUNRURÁ.
 
Sessenta ano, pra mim,
É uma carga pesada,
Tô achando munto ruim,
O peso da minha inxada;
Os fio todos casado
Eu, doente, fracassado,
E além de vivê doente,
Sou da percisão cativo
Sei lá se eu ainda vivo
Mais cinco ano pra frente?
 
Sei que o dotô considera
O meu dito verdadêro.
Que diabo é que a gente espera
Já com sessenta janêro?
Esta idade é um castigo
E é por isto que lhe digo:
Minha aposentadoria
Já é tempo de fazê,
Eu passos mais vivê
Dando murro todo dia.
 
Eu, novo, resovi tudo
Qui fiquei de péia grossa,
Fui cabra bamba, peitudo
Iguá um boi de carroça;
Passei minha vida intêra
Naquela grande cansêra
Da paioça pro roçado.
Se o nosso Brasi falasse
O lucro que eu tenho dado.
 
Já tô de cabelo branco,
A cara toda incuída,
Eu lhe digo e falo franco
Nesta viage da vida
Já tô no fim do caminho;
Seu dotô ,  vá de pouquinho
Mandando de lá pra cá,
Pra este meu cativêro,
Uma parte do dinhêro
Que mandei daqui pra lá.