MANHÃ DE DOMINGO NA SERRA DO ARARIPE
Domingo , seis da manhã, caminhonete Chevrolet na porta, carroceria varrida, pneus lavados e calibrados, água do radiador conferida e completada, vidros limpos, nível do óleo do motor e água da bateria conferidos e completados, documentos repassados, sacos de farinha arrumados, alguns animais amarrados num mourão da cerca que faz continuidade com a parede da casa, chegando aos poucos os diversos cidadãos que também irão ao vilarejo para a grande feira ou para a cidade de Bodocó.
Na sala dos fundos uma bacia com água barrenta, um espelho retangular marrom 20cm por 30cm, pincel feito de calda de cavalo, um barbeador alimentado por uma banda de lâmina de barbear Gillete, espuma produzida por sabonete Gessy , é o dono da casa e patrão dando um trato na barba, enquanto isso a patroa prepara o gostoso desjejum.
Momentos depois, já na sala do café, numa longa mesa o grande anfitrião , alguns filhos e os amigos mais chegados saboreando um prato de coalhada, café preto torrado no caco, café com leite , queijo , tapioca, ovos estrelados e um bom cuscuz de milho pisado em casa.
A patroa vai até o grande terreiro e convida todos os cidadãos para um bom café, todos se aproximam e abastecem o corpo com um bom papo, um reconfortante café. Abastecidos os corpos com o saboroso desjejum , os funcionários são chamados um por cada vez para receber o salário da semana, modo este com o intuito de manter a privacidade necessária .
Terminada esta fase, todos bem vestidos , barbas tiradas, chapéus novos, peixeiras nos quartos se aboletam na carroceria do veículo, ajeitam os pequenos animais, seus sacos e suas tralhas , os mais velhos na boleia com o patrão ou compadre e partem para a grande feira do Domingo em Feira Nova.
O motorista que é o patrão e anfitrião com o seu belo chapéu preto de massa, camisa branca mangas compridas, calça de linho, sapato preto passo double liga o carro, passa a primeira marcha, pega a retilínea estrada defronte de sua casa e some com destino ao povoado, estrada esta, fruto de sua lavra, pois , mesmo sem estudo, era um verdadeiro engenheiro praticante, eram assim os domingos nas minhas férias na Serra do Araripe logo ao amanhecer.
O resto do dia era cheio de outras atividades, era o dia do banho semanal, pois nos outros dias apenas se lavavam os pés para dormir, iniciava-se visitas a parentes, partidas de futebol com todos da redondeza, cortes de cabelos na casa de Dão Paulino, muitas vezes aparecia um rábula para extração dentária, era um dia de festa que esquentava no fim da tarde com a chegada dos que tinham ido à feira sempre carregados de novidades, traziam na bagagem roupas, espingardas, munição, pregos, martelos, sabonetes, remédios, biscoitos, víveres que só se encontram nas cidades e até mesmo o saboroso pão , coisa rara naquele sertão e disputados por todas as crianças que aguardavam ansiosas pelos pais naquele momento.
Domingo era o melhor dia da semana, como era bom acordar cedo aos domingos, como era bom, eram assim os domingos nos longínquos sertões na Chapada do Araripe.
Viva a infância e viva a minha querida Serra aonde todos de lá são compadres.
Iderval Reginaldo Tenório
Belo texto! Fechei os olhos e viajei nesse tempo. Vivenciei exatamente a sua narração. 👏
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