Este conto fiz em homenagem à minha tia Zizinha,achei inusitado e postei para os amigos,quero opiniões . Iderval Reginaldo Tenório
Apesar de franzina era uma setentona valente, de semblante calmo, de voz firme, olhar seguro que impunha respeito, por isso nem só os seus sobrinhos, mas todos a chamavam de tia Zizinha. Era tia Zizinha quem organizava as quermesses, as partidas de futebol, as torcidas organizadas e as festas do milho, quando jovem ,ganhou muitos concursos de Rainha da Paróquia. Apesar de pequena e sequinha era um verdadeiro furacão,era um vulcão em atividade..
Era Dezembro de 1978, a cidade em chamas, a população duplicada devido os visitantes para a maior vaquejada da região.Cavalos por todos os recantos e baixios, bois espraiados pelos currais, caminhões e caminhonetes enchiam as ruas de chão batido, os carros de sons martelando os ouvidos , os sertanejos aproximando os apaixonados, rodas gigantes, canoas, tiro ao alvo e muita comida regional, tudo idealizado, organizado e executado por tia Zizinha.
O relógio marcava 12 horas, a conversa rodeava a mesa farta, o papo solto campeava na imensa sala da amada tia. Eu, sempre tirado a conversador iniciei uma discussão sobre a vida,sobre a grandeza do universo,sobre a importância do ser humano e o quanto de orgulho possui uma certa classe social apesar da insignificância, depois de uma longa prosa filosófica, em tom de deboche falei para tia ZIZINHA..
__Tia, a senhora não vê este mundão de meu Deus, estes indivíduos que se dizem importantes, bonitos, orgulhosos, cheios de soberbas e etc? Eles e todos nós somos uns bostas tia Zizinha, somos uns merdas, aliás, tia Zizinha, nós e bosta somos a mesma coisa, basta um mosquito, uma bactéria, um vírus e lá estão todos e nós debaixo do chão, veja tia, nós não somos nada, basta um dia sem um banho e lá está a inhaca. Tia Zizinha parou, pensou e de imediato falou.
___Nós não meu filho, me tire dessa, vocês sim, vocês que estudaram, que se diplomaram, moraram na capital e são doutores podem se considerar bostas, podem se achar uns merdas, porque eu ainda sou um pum, um pum silencioso, um pum sem odor, isso é um pum fajuto, escondido e que não tem direito a voz, pra você vê nem zoada o coitado faz, eu sou um projeto de bosta, ainda falta muito e nem sei se um dia serei , acho que sempre serei um prenúncio. Eram assim as tiradas de tia Zizinha. .
Após gostosas e efusivas gargalhadas retruquei: é tia, eu não sei porque tanto orgulho, tanto orgulho besta, pois todo mundo do mundo tem por trás uma bunda, umas batidas, outras avantajadas, mas todos têm, todos, todo mundo do mundo tia , tem uma bunda, a tia não contou conversa, com o dedo em riste,abriu a boca e em voz alta falou:
_E ainda por cima meu filho , ainda por cima furada.
Tia Zizinha era uma filósofa,tinha solução e resposta para tudo.
Voltando à vaquejada, pôr do sol de um domingo, tia Zizinha no comando, vestido vermelho-rodado, chicote de couro cru na mão direita, chapéu de massa na esquerda, de bota e tudo, era uma verdadeira Amazonas, pista limpa, rapazolas pendurados nos mourões da cerca de madeira, moças de mini-saias saboreando maçã do amor ,velhos e crianças nas arquibancadas de tábuas agrestes ,cancelas e portões fechados,tudo pronto para a abertura do evento .
Entra a anfitriã sob os aplausos da platéia, sozinha, descontraída e envaidecida com as salvas de palmas, era a toda poderosa, a rainha da festa, ali era a Tia Zizinha em carne, osso e outros predicados. A platéia gritava: tia Zizinha, em côro e sincronizado, TIA ZIZINHA....,era um dia de glória,de labuta,de dedicação, era a coroação. Quando de repente não se sabe de onde, surgiu um boi preto de mais de metro de largura, ancas largas e pontudo,bem pontudo,com um aro de cobre nas narinas, cinta de couro apertada no seu vazio,olhos avermelhados ,bufando que só uma Maria fumaça, com os cascos queria furar o chão,as patadas sobre o solo e o poeirão que subia chamou a atenção do público, não contou conversas e nem gritaria, partiu pra cima de Tia Zizinha, ela procurou os portões, todos lacrados , não titubeou, com os seus finos gravetos quis fazer bonito,levantou os braços,mostrou o belo chapéu de massa e rodou o chicote de couro cru sobre a cabeça,quis parecer que tudo fora programado que aquilo fazia parte do espetáculo,corria para um lado, pulava para o outro,gritava como um vaqueiro,vai boi mandingueiro,boi marruá,boi bufão, procurava enganar o valente bizão, conseguiu chegar até a cerca, chegou tarde, sentiu na sua traseira uma cravinetada dupla,um impulso veloz, compacto, agudo e muito forte nos atrofiados glúteos, os chifres lhes acertaram em cheio, decolou como um teco-teco, a manobra arrancou-lhe a saia , as anáguas e combinação, de quebra trouxe como troféu a sua vermelha calçola de brim , fundo duplo de forro grosso e acinturada com cordões de rêde.
Com a setentona jogada contra a cerca , as saias cobrindo-lhes as enfurecidas narinas , as vistas vedadas pela íntima e encharcada peça da Tia Zizinha ,o boi ficou acuado, perdeu o rumo, rodava como um peão à procura da presa,o povo gritava,o boi ficou perdido, desorientado. Apesar do ataque o boi perdeu a batalha,a tia levantou garbosamente o machucado corpo,sacudiu a poeira e não teve outra escolha, teve que desfilar só de califon e com as vestes de cima três dedos abaixo dos murchos maracujás. Com a traseira batida e dois vergalhões vermelhos indo até as costas tia Zizinha corria elegantemente para escapar do esbaforido boi, foi o espetáculo do ano, a platéia foi ao chão, os gritos ensurdecedores contagiavam os presentes, o povo foi ao delírio, a tia Zizinha chegou ao estrelato, foi um dia de glória e de inglória, os narradores com os microfones em punho. Muitos ficaram roucos ,. foi o maior espetáculo da terra
Nos folhetos o mote: A CALÇOLA VERMELHA DE TIA ZIZINHA E O BOI QUE PERDEU O RUMO.
Daquele dia em diante, nunca mais a tia organizou festas, passou a detestar vaquejadas e como vingança, comprou o boi bufão, realizou o maior churrasco aberto de minha terra, lá não compareceu. Ainda hoje os repentistas comemoram os fatos ,todo boi bravo que aparece nas vaquejadas o locutor brada em voz alta: ___E lá vai o boi que tirou as calçolas de tia Zizinha, o boi dos chifres certeiros, o boi que aposentou tia Zizinha. Completa a narração com diversas trovas.
"Menina casa comigo que tu não morres de fome,la em casa tem uma pinta mamãe mata e nos dois come,de dia tu comes a pinta e de noite a pinta de come."
"Caboca me dá um beijo,só não serve do pescoço,quero no bico do peito num lugar que não tem osso,que é pra quando eu ficar velho,me alembar que já fui moço".
"Saudade é como um parafuso que num buraco cai, só entra se for torcendo se bater ele não vai e se enganchar lá dentro ,ele lasca mais não sai."
Confesso que não gostei da inusitada cena e nem do inesperado espetáculo, porém vibro,vibro,pois não tenho culpa de ser parente de gente famosa e sobrinho da minha querida,amada e inesquecível tia Zizinha.
Não perco a oportunidade de anualmente participar da maior festa do interior do Ceará, realizado no Parque de Exposição e Vaquejada Tia Zizinha, cujo símbolo é uma cabeça de boi com uma calcinha vermelha nas pontas, cravada com o magestoso TZ maiúsculo. O TZ de TIA ZIZINHA. Salvador, 20 de Fevereiro de 2008. Iderval Reginaldo Tenório ACESSE O SITIO acesse o sitio.
http://www.iderval.blogspot.com/
A CABOCLA MAIS PARECIDA COM A MINHA TIA ZIZINHA É A MINHA AMIGA IMORTAL HELENA MEIRELES, QUANDO VEIO A SALVADOR POR TRÊS VEZES CONVERSAMOS MUITO,ERA UMA GRANDE PESSOA.QUE DEUS A TENHA NO CÉU.
Engraçado :))) Um abraço e felicidades, Yayá.
ResponderExcluirkkkkkkkkkkkkkk! Não paro de rir!!
ResponderExcluirEste boi era bem macho, más bobão pois no final virou churrasco. hahha
ResponderExcluirkkkkkkkkkk muito boa essa..mravilha de narrativa..Salve a cultura popular..os causos as prosas as estórias
Excluirparabéns Dr.Iderval.
Aldo Souza
DEZ! PARABÉNS PELA CRIATIVIDADE HUMORÍSTICA.
ResponderExcluirDez! Parabéns pela criatividade humorística.
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