quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

ZEZINHO-O VELHO, A PENITENCIARIA E A COLÔNIA AGRÍCOLA.

 

ZEZINHO-O VELHO, A PENITENCIARIA E A COLÔNIA AGRÍCOLA.

                                                                  

Cartoon Bardeava Avô De Chapéu Com Cascas De Ouvido Com Pau Na Mão  Ilustração do Vetor - Ilustração de pessoa, antigo: 165197740

Duplo Nono Festival Ascendente Barbudo Branco Homem Velho PNG , Barba,  Margarida, Ilustração Chongyang Imagem PNG e PSD Para Download Gratuito

Cartoon old farmer Stock Photo by ©illustrator_hft 116821544

O VELHO, A PENITENCIARIA

 E 

A COLÔNIA AGRÍCOLA.


Ao  visitar uma penitenciaria,   colônia agrícola, e ao  dialogar com os moradores, Zezinho  ficou impressionado com  um velho detento.

Defronte a um velho de barba branca e cabelos longos, voz arrastada, pouca leitura, pele encolhida e  olhar perdido, sem direção,   o Zezinho se abobalhou.

Após cordial diálogo o velho de  
boca banguela  ,  mãos grossas e unhas escuras olhou para o mundo e mirou o infinito, viajou no tempo e pousou na realidade da vida . 

Cavador nas mãos, bornal cheio de grampos , martelo e  pé de cabra para esticar arames.  Cheio de solidão   olhou para o sol  protegendo os olhos com uma das mãos,  devido   a claridade, e com um molambo puído enxugou a  ressecada tez. 

Esboçando caretas com os desidratados músculos da face e   a  rouca  voz, quase gutural,   balbuciou  algumas palavras.


"Di qui adianta viver num mundo como esse? di qui adianta?! O mundo pra mim num tem sentido, vivo cá há 30 anos, num tenho mué, pai, mãe, fios e nem amigos, a vida é  drumir, acordar, comer, descomer , cavar buracos e insticar arame, num tem sentido. Drumo, acordo, como, descomo, cavo buracos e dispois, dispois vou insticar arame, num tem sentido."

Parou de balbuciar , olhou para cima,  sol a pino. Coçou a cabeça, colocou o seu chapéu de palha, pôs o cordão por debaixo do queixo , arregaçou as mangas do grosso brim, aberta até o umbigo , falou resmungando para si e para o além,  quase a murmurar, num tem sentido esta vida. O Zezinho  ficou boquiaberto  e desnorteado.

"Q
ui dureza!, ave Maria ! Qui sóle quente , já comí, já descomi, já cavei  buracos e agora seu môço vou insticar arame."


E com o tom da voz cada vez mais baixo foi balbuciando, abaixando a voz  e se afastando em busca de realizar a sua tarefa.

"Vou insticar arame , vou insticar arame . Inté mais, inté."

Saiu à procura de arames farpados soltos , de estacas carcomidas pelos cupins   e de mourões prestes a caír.

Indiferente e claudicante sumiu beirando a cerca, puxa aqui , puxa ali, uma martelada acolá, um grampo que cai, um grampo que se perde, um resmungo, uma cusparada, uma estaca frouxa, mole,  quase caindo e lá se vai o velho cheio de desilusão acostumado com a vida recebida e agora em consumo.


Come, evacua, cava buracos , estica arame, olha para o sol, enxuga a testa, bota a mão no bornal, dá uma martelada, assoa o nariz, estica a coluna com as mãos nos quartos , coça as nádegas e continua a deambulação.

É a sua rotina , é o cotidiano , é a vida, é o seu pequeno mundo. Olhou bem nos olhos do Zezinho e falou:  

 "  Muitos são os tipos de prisões nesta vida seu môço.   Vou esticar arame".

 

 
Salvador, 21 de abril de 1998

Iderval Reginaldo Tenório

 

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