segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

O CUIDADOR


 
                                                                       

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  Minha mãe alagoana DE  98 anos de idade . Senhora digna de um  documentário , pela sabedoria ,  vivencia e desenvoltura em diversos temas. 
 
 Mãe de 12 filhos, avó de mais de 30 e bisavó de uns 12. 
Sabe  e fala de tudo, sempre que discutimos temas jurídicos polêmicos  ela tem  uma história para contar. 
Este foi um dos contos narrado por  minha mãe, achei prudente colocar no blog.  
O tema continua polêmico e sem solução.

Iderval Reginaldo Tenório


                                                O CUIDADOR
 
              Conta a minha mãe , que uma menina de 12 anos chegou em casa vindo da escola , estranhou a ausência do querido pai na hora do  almoço.  Foi até a mesa, sentou, levantou, foi até a porta da rua, olhou para um lado ,  para o outro e nada do genitor, foi até a cozinha, descobriu as panelas e  engasgada indagou para a genitora: 

                              "Por onde onda o meu pai? ."

                  Recebeu como resposta um balançar da cabeça  e a esperança que estava  a caminho . A espera foi em vão, veio a tarde e nenhum paradeiro do humilde  trabalhador.

               A filha  foi até o seu trabalho ,   foi informada  que até aquele momento  o seu pai não havia comparecido , já tinha  levado falta e  pela cara do apontador    poderia perder o   emprego , pois é inadmissível que numa segunda feira, o primeiro dia da semana,  um trabalhador falte ao serviço. 

              A menina  não esmoreceu, procurou os familiares mais próximos, rodou os hospitais, os postos de saúde, foi até a rodoviária, compareceu ao cemitério e nada do seu  amado pai. 

                 A sua última cartada, a sua última visita, mesmo contra a sua vontade,  pois jamais imaginaria o encontrar naquele lugar,  foi à  delegacia.   Ao chegar encontrou o seu pai na única cela que existia, sala pequena, escura,  com menos de  8 metros quadrados, uma alta janela de meio metro, uma lata velha de querosene como latrina, um portão de ferro gusa, meia dúzia de pregos como cabides, cinco ou seis buracos na parede para colocar os pertences e mais 06(seis) brutamontes nus da cintura para cima, as vestes cobriam apenas as partes pudenda.´

           As lágrimas  vieram ao inocente rosto , não conseguiu chegar ao pai, a sua idade não permitia dantesca cena.  Foi ao delegado e quis  saber qual o pecado contra a sociedade praticado pelo seu genitor. O delegado foi até o livro de ocorrências, até o caderno de queixas e falou.
   
    "Atentado contra um menor, o seu pai infringiu  o estatuto do adolescente e da criança , deve pagar por este crime."

             A menor insistiu no que significava, o que o seu pai havia feito, qual o seu crime.

               O delegado sem medir as palavras,   informou que aquele homem havia surrado uma criança  naquela manhã , fora denunciado por um  diligente e cuidadoso vizinho,      antes que chegasse ao seu trabalho, ao sair da escola municipal do seu bairro  a viatura o prendeu ,  inclusive  já tem  ordem de envia-lo para a capital,  corre o risco de morrer, uma vez que os detentos não gostam de quem bate  ou molesta crianças .            


             A criança caiu em prantos, não aguentou tamanha notícia, para ela era o fim do mundo, aquele fato fora o pior golpe já presenciado nos seus 12 anos de vida.

               Com a voz firme , compassada, sopesada e cheia de emoção assim se dirigiu ao ao homem da lei.
 
          "Quem vai pagar as contas lá de casa,  a luz, a água, a minha escola, o meu pão, o remédio de vovó, quem vai consertar a casa de titia, a carroça do Tadeu , quem vai pintar a fachada da igreja do bairro, quem vai capinar a roça do vovô nos domingos e feriados, com quem eu vou para a igreja aos domingos à noite agradecer a Deus a felicidade de estar viva, com saúde, de barriga cheia e vendo meu pai  cumprindo com o seus deveres de cuidador, de preocupado e provedor? quem seu delegado, quem?"

Enxugou as lágrimas, tomou um gole d'agua e continuou o seu relato para o atencioso delegado.

"O que houve seu delegado, o que houve hoje não foi uma agressão de  um homem para com um menor , foi  sim o cuidado de um zeloso pai para com um desobediente filho.  O que aconteceu foi que  ao acordar , eu não queria ir para a escola, eu estava cansada, pois fui dormir muito tarde e tinha combinado com uma colega, a minha vizinha,  que quando meu pai saísse,  nós iríamos para a beira do rio tomar banho com três garotos que ela conheceu no parque, todos da capital, dois eram  maiores de idade , eles prometiam muitas coisas boas para nós e fiquei curiosa. 

O meu pai todos os dias me acorda cedo, vai á padaria comprar o pão, mãe faz o café, depois pai me deixa na escola e vai para o seu trabalho, neste dia depois de muita insistência e recusa por minha parte, ele perdeu a paciência , acredito que mandado por Deus , puxou as minhas orelhas e disse que só a escola salva o pobre, só o saber é capaz de tirar o homem da miséria, só o estudo é capaz de melhorar o seu nível social, só ele é quem sabe o que está passando por ser analfabeto,  por ser criado sem pai e sem mãe, sem ter acesso à escolaridade, só a escola e a família pode tirar o pobre do atoleiro, ele como pai não iria deixar a sua única filha tomar o caminho errado . 

Provavelmente  neste momento o vizinho do 68, pai da minha amiga, um homem  que nada faz, vive bebendo , olhando para a vida dos outros veio e sem saber o que estava acontecendo  denunciou o que não viu e o que não existiu,   pois não estava presente, irresponsavelmente fez esta queixa.  

Seu delegado,  o meu pai não me bateu, ele apenas fez o que qualquer pai de juízo faria, ele aplicou um corretivo após muitas reclamações e conselhos, puxou uma das minhas orelhas e graças  a este alerta eu não caí naquela armadilha.  Meu pai foi atencioso, foi eficaz e fez o papel daquele que gosta, daquele que se preocupa com o futuro da família, ele fez o papel de  cuidador, porque quem cuida ama, quem cuida gosta, quem cuida espera um futuro melhor para com os seus filhos.  Meu pai seu delegado é um herói, solte este batalhador , ele cumpriu com a sua obrigação, feliz é o filho que tem um pai igual ao meu, feliz."


            O Delegado diante de tão efusivo apelo, não conteve as emoções, abraçou aquela criança, lembrou do seu velho pai que muitas sovas havia lhe dado, pensou no hoje ser um grande delegado, um homem de respeito e tudo devia ao seu duro pai, ao seu abnegado genitor, muitas vezes incompreendido nas horas das correções, mas que valeu a pena. 

               Não contou conversas, antes do anoitecer foi lavrado um termo de soltura e antes do por do sol foi até a cela, retirou o humilde e cabisbaixo cidadão, entregou os ínfimos pertences, o abraçou, pediu desculpas,  e juntos, delegado, pai e filha  no carro particular da autoridade    fizeram questão de comparecer ao serviço do pai, colocado em pratos limpos o acontecido e tomaram o destino do humilde e aconchegante seio familiar.

              Esta história  minha mãe conta  para mostrar que o diálogo é a melhor maneira de educar, para mostrar que deve os pais insistirem na civilidade até o extremo , porém  uma vez falhado o diálogo, tem que partir para uma medida mais enérgica , uma conduta concreta , nem sempre um castigo é crime ou é pecado, muitas vezes é o norteador de um brilhante futuro, muitas vezes é a salvação de uma família. 

                  Cabe ao filho entender, cabe ao filho enxergar aquela atitude dura, aquele momento difícil, muitas vezes mais  para o pai do que para o filho  .  Na grande maioria das vezes  detestada no presente  ,e só valorizada  no futuro quando o filho passa a entender o quanto era importante as sábias palavras do vigilante mestre, do preocupado pai, só  quando na mente brota e prolifera   um sentimento de  lamentação ao perder a chance de ser respeitado pela sociedade , um sentimento de impotência que não volta mais  e na sua mente fica gravado o seguinte refrão para o resto da vida:

"AH !SE EU TIVESSE ESCUTADO OS MEUS PAIS!  AH! SE EU TIVESSE ESCUTADO, TENHO CERTEZA QUE A MINHA VIDA SERIA OUTRA"

                            Assina- O filho que não escuta os seus pais



Iderval Reginaldo Tenório
  12 de dezembro de 2000


15 de jul de 2013 - Vídeo enviado por Programa Dossiê Musical
Uma das mais belas obras da MPB. Música do poeta penambucano Sebastião Dias numa interpretação ...

6 de jun de 2011
Por favor, filho querido. Me escute, pense bem. Seu velho pai quer lhe dar. O valor que você tem ..
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