segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Após liminar da ‘cura gay’, psicólogos elevam oferta

Em 15 de setembro, o juiz federal Waldemar de Carvalho decidiu em favor de 23 psicólogos que ingressaram com a ação popular para poder ofertar terapias para 'reverter' a orientação sexual Foto: DANIEL MIHAILESCU / AFP/17/05/2016

'Cura gay': três psicólogos foram denunciados nos últimos 5 anos por oferecer tratamento, diz conselho

Na última sexta, uma liminar de um juiz federal do DF passou a permitir a realização de terapias de reversão sexual alegando garantia da 'plena liberdade científica'.



Para a ciência, terapias que prometem mudar a orientação sexual dos pacientes, chamadas de "cura gay", têm um nome: charlatanismo. Não há como se tratar a homossexualidade simplesmente porque ela não é uma doença nem um transtorno.
Mas uma liminar de um juiz do Distrito Federal provocou espanto e foi muito criticada nesta semana. A decisão autoriza os psicólogos a oferecerem tratamentos de "reversão sexual".


Há quase 30 anos a Organização Mundial de Saúde reconheceu que homossexualidade não é doença. No Brasil, desde 1999, o Conselho Federal de Psicologia diz que psicólogos não podem tratar a cura da homossexualidade.


Porém uma liminar do juiz federal Waldemar Claudio de Carvalho determinou que o Conselho Federal não pode impedir psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional sobre a reorientação sexual. A decisão causou choque e mobilização também nas redes sociais. Veja na reportagem do Fantástico.


O juiz federal Waldemar Cláudio de Carvalho, que proibiu em liminar que o Conselho Federal de Psicologia puna profissionais que ofertarem “cura gay”, afirmou nesta quinta-feira (21) que a interpretação da decisão foi "equivocada" e que não considera homossexualidade como doença. A nota foi divulgada no site da Justiça Federal. 
"Em nenhum momento este magistrado considerou ser a homossexualidade uma doença ou qualquer tipo de transtorno psíquico passível de tratamento."
A decisão é da última sexta (15) e está relacionada a uma resolução de 1999 – que impede a oferta do tratamento e diz que homossexualidade não pode ser vista como doença. Na ocasião, o magistrado argumentou "liberdade científica" para tomar a decisão (tire dúvidas sobre cada ponto do texto). 

 
A medida acata uma ação popular movida por profissionais que dizem acreditar em tratamentos de reversão sexual. Entre eles está a assessora parlamentar Rozângela Alves Justino, que sofreu censura pública e teve o registro cassado por causa da prática. O Conselho Federal de Psicologia informou que vai recorrer da decisão.
Para o Conselho Federal de Psicologia, terapias de reversão sexual representam “uma violação dos direitos humanos e não têm qualquer embasamento científico”. Ainda de acordo com o conselho, a resolução não cerceia a liberdade dos profissionais nem de pesquisas na área de sexualidade. Desde 1990, a homossexualidade deixou de ser considerada doença pela Organização Mundial da Saúde. 

“A gente sente muito que ainda hoje a gente tenha que estar discutindo e gastando muita energia com uma coisa que a gente já entende que não tem que estar discutindo isso, a gente tem é que reforçar o respeito ao direito humano, respeitar as diversas formas de as pessoas serem e estarem no mundo", diz o psicólogo e representante do conselho Paulo Aguiar. 
 
Membro do Conselho Federal de Psicologia, Paulo Aguiar (Foto: Raquel Morais/G1) 

 
Ele também contesta o trecho da decisão que cita uma suposta "proibição dos estudos" sobre a sexualidade humana. "Nós não temos inferências sobre isso. Quem regula são os comitês de éticas das universidades, o Ministério da Saúde e órgãos como a Capes que regulam isso." 

O presidente da Associação dos Magistrados do Brasil, Jayme Oliveira, diz haver “uma campanha extremamente difamatória” contra o magistrado. “A gente pode concordar ou discordar, e isso é absolutamente normal. É bom que aconteça o debate porque a sociedade pode avançar, mas conduzir como se ele fosse preconceituos ou uma pessoa má é muito ruim, porque o inferno pessoal que ele sofre como pessoa é irreparável. E ainda que a decisão estivesse toda errada – seja nesse caso ou qualquer outro – o sistema de justiça tem seus meios de reparar.” 

A Constituição Federal não cita a homofobia diretamente como um crime. Ela define, porém, como “objetivo fundamental da República” o de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, ou quaisquer outras formas de discriminação”. A homofobia costuma ser enquadrada como crime de ódio, passível de punição.
 
Manifestantes da 3ª Marcha Nacional contra a Homofobia ocupam a Praça dos Três Poderes e estendem uma bandeira, com as cores do movimento, em frente ao Palácio do Planalto (Foto: Marcello Casal Jr/ABr) 

 
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) decidiu “auxiliar” a defesa do Conselho Federal de Psicologia e ingressou como amicus curiae ("amigo da corte"). De acordo com o presidente nacional, Claudio Lamachia, uma eventual decisão neste sentido pode representar “retrocesso social”. 

Presidente da Comissão de Diversidade Sexual da OAB, Maria Berenice Dias, a postura do magistrado ao aceitar a ação não foi adequada. "Mas ele não pode ser punido por isso. Ele não infringiu nenhuma regra administrativa. Ele julgou em um determinado sentido. Há um número de decisões que são alteradas pelo tribunal. O que cabe é revisão." 

"A pessoa não tem como, quando procura o profissional, dizer que quer se curar da doença da homossexualidade. Fora que quem dá diagnóstico é médico, não paciente. Se um psicólogo é procurado, ele pode dizer ‘doente tu não está’. O papel dele é fazer a pessoa deixar de se sentir desconfortável. A sociedade que está doente em ainda não aceitar a homossexualidade", disse. 


Liminar da Justiça de Brasília permite que psicólogos tratem homossexualidade como doença 

 

Luta contra homofobia

A decisão liminar, assinada pelo juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, causou estranhamento em redes sociais. Famosos se posicionaram sobre o assunto. A cantora Pabllo Vittar resumiu com: "Não somos doentes". 

Ivete Sangalo também escreveu críticas à decisão no Instagram. “É Brasilzão, a gente tentando ser forte, ser otimista, com inúmeras pendências que caberiam a uma administração decente resolver, e aí me resolvem dizer que homossexualidade é doença. Doentes são aqueles que acreditam nesse grande absurdo. Pessoas, pensem sobre o que é esse equívoco, absorvam a coragem e a luta dos homossexuais e apliquem às suas mofadas e inertes vidas. Tentem que vocês talvez possam ser felizes também.” 

Gretchen postou uma foto do filho, Thammy Miranda para fazer seu protesto. "Eu não tenho um filho doente. Meu filho é perfeito, saudável e cheio de amor". 

Anitta também se manifestou sobre o assunto. "O Brasil se devastando e as autoridades preocupadas com quem queremos nos relacionar. Isso precisa acabar. Deus, cure a doença da cabeça do ser humano que não enxerga os verdadeiros problemas de uma nação. Pais, não obriguem seus filhos a procurarem cura pra uma doença que não existe, baseados neste fato político. Essa busca interminável sim pode deixá-los realmente doentes". Em vídeo, a cantora ainda se disse devastada com a decisão. 

A cantora Marília Mendonça também protestou contra a decisão. "O que esperar de um Brasil que trata as maiores atrocidades como se fosse normal, e que trata o amor das pessoas como se fosse doença? Eu jamais vou entender, pessoas que querem decidir sobre a vida das outras, seja em qualquer aspecto. Passo por isso diariamente, com coisas banais e já sofro, imaginem quando isso acontece com quem só quer AMAR! Não existe mensagem que diga mais do que: Cuidem cada um da sua vida. Deixem as pessoas em paz, para serem exatamente como querem ser. Respeito". 

Liminar

A audiência ocorreu na última sexta-feira e durou mais de quatro horas. Na ocasião, o juiz disse que mantinha a integralidade da resolução, mas determinava que o Conselho Federal de Psicologia mudasse a forma como a interpreta – deixando de "censurar" quem oferece tratamentos do tipo. 

“A gente vai entrar com recurso, mas essa data especificamente a gente não tem. A gente vai tentar o mais rapidamente possível. É certo que a gente vai tentar caçar essa liminar”, disse o conselheiro Paulo Aguiar.

Ação popular

Uma das autoras da ação popular que questionava a resolução é a psicóloga Rozângela Alves Justino, que oferecia terapia para que gays e lésbicas deixassem de ser homossexuais. Ela foi punida em 2009 pela prática. 

Na época, Rozângela disse ao G1 que considera a homossexualidade um distúrbio, provocado principalmente por abusos e traumas sofridos durante a infância. Ela afirmou ter "aliviado o sofrimento" de vários homossexuais.
“Estou me sentindo amordaçada e impedida de ajudar as pessoas que, voluntariamente, desejam largar a atração por pessoas do mesmo sexo", disse Rozângela na ocasião. 

Casos recentes

Nos últimos cinco anos, o Conselho Federal de Psicologia recebeu queixas contra três profissionais que ofertavam tratamento para homossexualidade. De acordo com o presidente do órgão, Rogério Giannini, uma psicóloga – que está entre os autores da ação – teve o registro cassado por causa da prática.
De acordo com o conselho, a resolução trouxe impactos positivos no enfrentamento a preconceitos e proteção de direitos da população homossexual no país, “que apresenta altos índices de violência e mortes por LGBTfobia”. A oferta de tratamentos de “cura gay” eram passíveis de punição.

Repercussão

"[...] A decisão do magistrado, além de afrontar os princípios constitucionais aludidos, vai contra a promoção da cidadania, o desenvolvimento e a inclusão social, objetivos perseguidos por este Conselho Nacional de Justiça", diz a representação. 

No texto, Orlando Silva diz ainda que a decisão judicial "enfraquece toda e qualquer ação que contribua para o fortalecimento da educação e da consciência dos direitos, deveres e valores do cidadão".
Nesta quarta (20), o deputado federal Jean Wyllys anunciou que também vai acionar o CNJ. Para o deputado, o argumento de que o juiz está permitindo a liberdade científica é "falacioso e enviesado", já que a homossexualidade não é um transtorno psíquico – por isso, nenhuma terapia de reversão pode ser aplicada
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    Liminar da Justiça de Brasília permite que psicólogos tratem homossexualidade como doença 
     

    Luta contra homofobia

    A decisão liminar, assinada pelo juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, causou estranhamento em redes sociais. Famosos se posicionaram sobre o assunto. A cantora Pabllo Vittar resumiu com: "Não somos doentes". 

    Ivete Sangalo também escreveu críticas à decisão no Instagram. “É Brasilzão, a gente tentando ser forte, ser otimista, com inúmeras pendências que caberiam a uma administração decente resolver, e aí me resolvem dizer que homossexualidade é doença. Doentes são aqueles que acreditam nesse grande absurdo. Pessoas, pensem sobre o que é esse equívoco, absorvam a coragem e a luta dos homossexuais e apliquem às suas mofadas e inertes vidas. Tentem que vocês talvez possam ser felizes também.” 

    Gretchen postou uma foto do filho, Thammy Miranda para fazer seu protesto. "Eu não tenho um filho doente. Meu filho é perfeito, saudável e cheio de amor". 

    Anitta também se manifestou sobre o assunto. "O Brasil se devastando e as autoridades preocupadas com quem queremos nos relacionar. Isso precisa acabar. Deus, cure a doença da cabeça do ser humano que não enxerga os verdadeiros problemas de uma nação. Pais, não obriguem seus filhos a procurarem cura pra uma doença que não existe, baseados neste fato político. Essa busca interminável sim pode deixá-los realmente doentes". Em vídeo, a cantora ainda se disse devastada com a decisão. 

    A cantora Marília Mendonça também protestou contra a decisão. "O que esperar de um Brasil que trata as maiores atrocidades como se fosse normal, e que trata o amor das pessoas como se fosse doença? Eu jamais vou entender, pessoas que querem decidir sobre a vida das outras, seja em qualquer aspecto. Passo por isso diariamente, com coisas banais e já sofro, imaginem quando isso acontece com quem só quer AMAR! Não existe mensagem que diga mais do que: Cuidem cada um da sua vida. Deixem as pessoas em paz, para serem exatamente como querem ser. Respeito". 

    Liminar

    A audiência ocorreu na última sexta-feira e durou mais de quatro horas. Na ocasião, o juiz disse que mantinha a integralidade da resolução, mas determinava que o Conselho Federal de Psicologia mudasse a forma como a interpreta – deixando de "censurar" quem oferece tratamentos do tipo.
    “A gente vai entrar com recurso, mas essa data especificamente a gente não tem. A gente vai tentar o mais rapidamente possível. É certo que a gente vai tentar caçar essa liminar”, disse o conselheiro Paulo Aguiar. 

  • Membro do Conselho Federal de Psicologia, Paulo Aguiar (Foto: Raquel Morais/G1)
    Membro do Conselho Federal de Psicologia, Paulo Aguiar (Foto: Raquel Morais/G1)
    O Conselho Federal de Psicologia informou que não foi a primeira vez que a resolução foi questionada – nas outras ocasiões, a Justiça negou os pedidos. “Essa resolução está aí há 18 anos. Na verdade, ela serve de base para decisões judiciais.”
    “A gente sente muito que ainda hoje a gente tenha que estar discutindo e gastando muita energia com uma coisa que a gente já entende que não tem que estar discutindo isso, a gente tem é que reforçar o respeito ao direito humano, respeitar as diversas formas de as pessoas serem e estarem no mundo.” 

    Na decisão, o juiz também fala que o conselho não pode impedir os profissionais de promoverem estudos. Aguiar critica o argumento. "Nós não temos inferências sobre isso. Quem regula são os comitês de éticas das universidades, o Ministério da Saúde e órgãos como a Capes que regulam isso."
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