quarta-feira, 10 de maio de 2017

O DEPOIMENTO DO LULA E AS PERGUNTAS DO MORO



Zuenir Ventura Foto: O Globo

Entre calar e mentir

O alvo do depoimento de Lula, em qualquer momento, será o público externo, não o juiz. Ele prefere convencer os já convencidos, os 30% de incondicionais (de)votos

Escrevo antes de saber o que foi feito com o pedido dos advogados de Lula para adiar seu interrogatório hoje em Curitiba, sob a alegação de que precisariam de mais três meses para preparar a defesa. Mas, qualquer que tenha sido o resultado da liminar, foi mais uma tentativa de ganhar tempo, mais um capítulo da estratégia de transformar um caso policial e jurídico em evento político-partidário. Não é segredo que Lula está em campanha eleitoral. Sua arma é, como sempre foi, a prática política, que maneja como ninguém. O alvo de seu depoimento, em qualquer momento, será o público externo, não o juiz. 

Ele prefere convencer os já convencidos, isto é, os inarredáveis 30% de incondicionais (de) votos que lhe garantem a preferência nacional, tendo ou não culpa no cartório. “Vou matar eles de raiva, porque em todas as pesquisas vou aparecer na frente”, garantiu com a habitual modéstia de quem produziu frases como “sou um humilde nordestino, um ex-operário”, “Nunca na história desse país...” e “não tem nesse país uma viva alma mais honesta do que eu”.
Faz parte dessa tática o confronto com Moro e, do lado de fora, o enfrentamento entre petistas e antipetistas. Só João Pedro Stédile, do Movimento dos Sem-Terra, prometeu levar para Curitiba 20 mil militantes. Para evitar isso, o juiz tomou algumas providências como o apelo em vídeo aos que apoiam a Lava-Jato para que não compareçam e não aceitem provocações. É uma sensata decisão para aplacar o ânimo belicoso de gente como Gilberto Carvalho, ex-chefe de gabinete e amigo íntimo do acusado, que ameaçou: “Espero que eles não ousem condená-lo, porque o povo não vai aceitar. É muito escandaloso o que estão fazendo”. Quer dizer: escandalosos não são os supostos malfeitos praticados, mas sua investigação.

É um equivoco achar que da audiência vai resultar alguma decisão, muito menos condenação. Moro não entende tanta expectativa e esclarece que cabe a ele apenas ouvir e fazer algumas perguntas. 

“O acusado pode inclusive ficar em silêncio ou mesmo mentir”, palavra de juiz. Isso quer dizer que Lula, por exemplo, não é obrigado a explicar a acusação de que teria recebido R$ 3 milhões em propinas da OAS em troca de três contratos com a Petrobras por sua ingerência nem de que teria se beneficiado também de obras no famoso tríplex do Guarujá. Se quiser, pode provocar risos ao repetir o que disse na entrevista no SBT, usando uma de suas bizarras metáforas: “Esse caso pode ser comparado à mulher que vai a uma loja de sapatos, experimenta 40 pares e não leva nenhum”.

“Ficar em silêncio” para quem gosta de falar como Lula é mais difícil do que adotar a segunda alternativa permitida pelo juiz.

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