sexta-feira, 1 de abril de 2016

O PAI QUE SE SACRIFICA PELOS FILHOS

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              Minha mãe é uma senhora alagoana com 98 anos de idade , uma senhora digna de um grande documentário especial , tudo pela sabedoria que possui , pela vivencia e desenvoltura em diversos tema,mãe de 12 filhos, avós de mais de 50 e bisavós de uns 12. Ela sabe e fala de tudo, sempre que discutimos temas jurídicos polêmicos  ela tem sempre uma história para contar, tome conhecimento deste conto contado por minha mãe, achei prudente colocar no blog, o tema continua polêmico e sem solução.

Iderval Reginaldo Tenório



CONTA A MINHA MÃE

            O PAI QUE SE SACRIFICA PELOS FILHOS

                                        O CUIDADOR

              Conta a minha mãe , que tempos atrás, uma menina de 12 anos chega em casa vindo da escola e estranha a ausência do seu querido e amado pai na hora do sagrado almoço, vai até a mesa, senta, levanta, vai até a porta da rua, olha para um lado, estica o pescoço para o outro e nada do genitor, vai até a cozinha, descobre as panelas e quase que engasgada indaga para genitora: 

Por onda o seu pai. 

Recebe como resposta um balançar da cabeça como uma lagartixa e uma esperança que está a caminho de casa, a espera foi em vão, veio a tarde e nenhum paradeiro do humilde  trabalhador.

               A filha previdente vai até o seu trabalho ,  lá foi informada  que até aquele momento  o seu pai não tinha comparecido , já havia levado falta pelo apontador da obra e  pela cara do homem,   poderia perder o seu abençoado emprego , pois é inadmissível que numa segunda feira, o primeiro dia da semana,  um trabalhador falte ao serviço. 

  A filha não esmoreceu, procurou os familiares mais próximos, rodou os hospitais, os postos de saúde, foi até a rodoviária, compareceu ao cemitério e nada do seu  amado pai. 

A sua última cartada, a sua última visita, mesmo contra a sua vontade,  pois jamais imaginaria o encontrar naquele lugar,  foi na delegacia,   ao chegar encontrou o seu pai na única cela que existia, sala pequena, escura,  com menos de  8 metros quadrados, uma alta janela de meio metro, uma lata velha de querosene como latrina, uma portão de ferro gusa, meia dúzia de pregos como cabides, cinco ou seis buracos na parede para colocar os pertences e mais 06(seis) brutamontes nus da cintura para cima, cobrindo apenas as partes pudenda.

           As lágrimas  vieram ao inocente rosto da bela pequena, não conseguiu chegar ao pai, a sua idade não permitia dantesca cena, foi ao delegado e quis  saber qual o pecado contra a sociedade praticado pelo genitor, o delegado foi até o livro de ocorrência, até o caderno de queixas e falou.
  
          ___ Atentado contra o menor, o seu pai infringiu o regimento, o estatuto do adolescente e da criança , deve pagar por este crime.

          A menor insistiu no que significava, o que o seu pai havia feito, qual o seu crime.

O delegado sem medir as palavras,   informou que aquele homem havia surrado uma criança  naquela manhã , fora denunciado por um vigilante e cuidadoso vizinho, o vizinho da casa  68,   antes que chegasse ao seu trabalho a viatura o prendeu , inclusive  já tem  ordem de envia-lo para a capital,  para cadeia de segurança máxima.            


A criança caiu em prantos, não aguentou tamanha notícia, para ela era o fim do mundo, aquele fato fora o pior golpe já presenciado nos seus 12 anos de vida.

        ___Quem vai pagar as contas lá de casa, quem vai pagar a luz, a água, a minha escola, o meu pão, o remédio de vovó, quem vai consertar a casa de titia, a carroça do Tadeu , quem vai pintar a fachada da igreja do bairro, quem vai capinar a roça do vovô nos domingos e feriados, com quem eu vou para a igreja aos domingos à noite agradecer a Deus a felicidade de estar viva, com saúde, de barriga cheia e vendo meu pai  cumprindo com o seus deveres de cuidador, de preocupado e provedor?

O que houve seu delegado, o que houve hoje não foi uma agressão de  um homem para com um menor e sim o cuidado de um zeloso pai para com um desobediente filho, o que aconteceu foi que  ao acordar , eu não queria ir para a escola, eu estava cansada, pois fui dormir muito tarde e tinha combinado com uma colega, a minha vizinha,  que quando meu pai saísse,  nós iríamos para a beira do rio tomar banho com três garotos que ela conheceu no parque, todos da capital, dois eram  maiores de idade , eles prometiam muitas coisas boas para nós e fiquei curiosa. 

O meu pai todos os dias me acorda cedo, vai na padaria comprar o pão, mãe faz o café, depois pai me deixa na escola e vai para o seu trabalho, neste dia depois de muita insistência e recusa por minha parte, ele perdeu a paciência , acredito que mandado por Deus , puxou as minhas orelhas e disse que só a escola salva o pobre, só o saber é capaz de tirar o homem da miséria, só o estudo é capaz de melhorar o seu nível social, só ele é quem sabe o que está passando por ser analfabeto,  por ser criado sem pai e sem mãe, sem ter acesso à escolaridade. 

Neste momento, provavelmente,  o vizinho do 68, pai da minha amiga, um homem  que nada faz, vive bebendo , olhando para as vidas dos outros veio e sem saber o que estava acontecendo , denunciou o que não viu e o que não existiu,   pois não estava presente, irresponsavelmente fez esta queixa.  

Seu delegado,  o meu pai não me bateu, ele apenas fez o que qualquer pai de juízo faria, ele aplicou um corretivo após muitas reclamações e conselhos, puxou uma das minhas orelhas e graças  a este alerta eu não caí naquela armadilha, meu pai foi atencioso, foi eficaz e fez o papel daquele que gosta, daquele que se preocupa com o futuro da família, ele fez o papel de  cuidador, porque quem cuida ama, quem cuida gosta, quem cuida espera um futuro melhor para com os seus filhos, meu pai seu delegado é um herói, solte este batalhador , ele cumpriu com a sua obrigação, feliz é o filho que tem um pai igual ao meu, feliz.


            O Delegado diante de tão efusivo apelo, não conteve as emoções, abraçou aquela criança, lembrou do seu velho pai que muitas sovas havia lhe dado, pensou no hoje ser um grande delegado, um homem de respeito e tudo devia ao seu duro pai, ao seu abnegado genitor, muitas vezes incompreendido nas horas das correções, mas que valeu a pena. 

Não contou conversas, antes do anoitecer foi lavrado um termo de soltura e antes do por do sol, foi até a cela, retirou o humilde e cabisbaixo cidadão, entregou os ínfimos pertences, o abraçou, pediu desculpas,  e juntos, delegado, pai e filha,  no carro particular da autoridade    fizeram questão de comparecer ao serviço do pai, colocado em pratos limpos o acontecido e tomaram o destino do humilde e aconchegante seio familiar.


Esta história  minha mãe conta,  para mostrar que o diálogo é a melhor maneira de educar, para mostrar que deve os pais insistirem na civilidade até o extremo , porém  uma vez falhado o diálogo, tem que partir para uma medida mais enérgica , uma conduta concreta , nem sempre um castigo é crime ou é pecado, muitas vezes é o norteador de um brilhante futuro, muitas vezes é a salvação de uma família. 

Cabe ao filho entender, cabe ao filho enxergar aquela atitude dura, aquele momento difícil, muitas vezes mais  para o pai do que para o filho  e que na grande maioria das vezes  detestada no presente  , só valorizada  no futuro, quando o filho entende o quanto era importante as sábias palavras do vigilante mestre, do preocupado pai, só  quando na mente brota e prolifera   um sentimento de  lamentação ao perder a chance de ser respeitado pela sociedade , um sentimento de impotência que não volta mais  e na sua mente fica gravado o seguinte refrão para o resto da vida:

"SE EU TIVESSE ESCUTADO OS MEUS PAIS!  AH! SE EU TIVESSE ESCUTADO, TENHO CERTEZA QUE A MINHA VIDA SERIA OUTRA"
                            Assina- O filho que não escuta os seus pais



Iderval Reginaldo Tenório
  12 de dezembro de 2000


Mamãe, muito obrigado.

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