Frota de veículo cresceu 644% desde 1998
POR LETÍCIA LINS / CÁSSIA ALMEIDA
RECIFE e RIO
- O eletricista João Henrique de Aguiar, de 29 anos, está internado há cinco
meses no Hospital da Restauração, no Recife. Ele viajava na garupa da moto
pilotada pelo cunhado Orlando dos Santos, de 24 anos, quando colidiu com uma
van na BR-232, perto de Pesqueira, a 215 quilômetros da capital. Santos morreu
no local. Aguiar já passou por duas cirurgias. Aguarda a vez de fazer uma
terceira e perdeu os movimentos de um braço e dos dedos da mão direita. Foi o
segundo acidente de moto que sofreu.
No terceiro
dia da série de reportagens Anda e Para — sobre como as políticas de seguidos
governos incentivam o uso do carro mesmo diante da situação cada vez pior da
mobilidade urbana no Brasil —, o tema é morte e invalidez em acidentes de
trânsito. Em 2013, 54.767 morreram e 444.206 ficaram inválidos. A grande
maioria, 76,7%, sofreu acidente de moto. Enquanto a frota de carros cresceu
175% desde 1998, a quantidade de motos explodiu. Eram somente 2,5 milhões há 16
anos. Hoje, são 18,6 milhões circulando nas ruas do país. Uma alta de 644%.
Crédito mais fácil e engarrafamentos constantes impulsionaram o consumo.
Juntamente com o aumento da frota, os casos de invalidez quintuplicaram: eram
89 mil em 2008.
— Há cinco
anos, a principal vítima no trânsito era o pedestre. Hoje, é o motoqueiro. Nos
acidentes, 74% das vítimas são condutores, 14%, o carona e 12%, o pedestre. Com
os engarrafamentos, a velocidade diminuiu e a letalidade dos acidentes de
carro, também. Mas qualquer queda de moto tem probabilidade grande de atingir
pernas, de provocar a perda da mobilidade — diz Márcio Norton, diretor de
Relações Institucionais da seguradora Líder, que administra o seguro DPVAT.
Foi o caso
do eletricista João Henrique de Aguiar, ao perder o movimento do braço. A
situação no Nordeste é pior diante do avanço do veículo. Em Pernambuco, há
967.170 motos, 1.142% a mais que em 1998. Os acidentes são tão frequentes que
passaram a ser tratados pelas autoridades como epidemia. Em 2011, foi criado o
Comitê Estadual de Prevenção dos Acidentes de Moto (Cepam), que reúne 19
entidades. De acordo com o coordenador executivo do Cepam, João Veiga, os
acidentados de moto já ocupam 87% dos leitos das enfermarias de traumatologia
dos três principais hospitais públicos da capital (Restauração, Getúlio Vargas
e Otávio de Freitas). Em Pernambuco, as mortes por acidentes de moto chegam a
22 para cada cem mil habitantes, segundo Veiga:
— Agora, são
as crianças que estão morrendo. Entrevistamos os pais, e eles alegam que não
achavam perigoso os filhos andarem de moto, porque pensavam que os menores só
circulariam nos sítios da área rural ou no centro das cidades do interior. Mas
quase todas as 23 crianças que morreram no ano passado trafegavam em
movimentadas rodovias federais.
GASTOS MÉDIOS DE R$ 152 MIL COM HOSPITAL
O agricultor
Claudino Melo dos Santos, de 28 anos, mora num sítio, mas se acidentou na
estrada. Viajava pela BR-232 quando bateu de frente com outra moto. Claudino
não tem habilitação e está internado há cinco meses, tendo passado por duas
cirurgias. No sítio onde mora, três pessoas sofreram acidente de moto.
No Recife,
entre setembro de 2013 e setembro deste ano, 10.075 pessoas foram atendidas nas
emergências vítimas de acidentes de moto: 10% sofreram alguma amputação,
limitação permanente, ficaram paraplégicos ou tetraplégicos. De acordo com o
chefe do setor de traumatologia do Hospital da Restauração, Bernardo Chaves,
60% dos seus pacientes tiveram mais de uma fratura, com cirurgia em até três
membros. Eles passam, em média, três meses internados. Pelos cálculos da
Secretaria Estadual de Saúde, uma vítima de acidente de moto custa, em média,
R$ 152 mil só de gastos hospitalares.
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