domingo, 29 de maio de 2016

AS GARGALHADAS DE SEU MOCIM

AS GARGALHADAS DE SEU MOCIM




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 As Gargalhadas de seu Mocim.

                                    Ao adentrar  não agüentou a decoração, os enfeites da estante , os diversos quadros mostrando a família,   os painéis de informações e nem mesmo as estátuas do Padre Cícero e do Frei Damião escaparam ,  desmanchou-se em risos, não conseguia olhar nos olhos do médico, era um olhar de realização, de superioridade, da desforra, do esvaziamento das mágoas, era o olhar da vitória. A cada detalhe, mais risos, ficou exausto de tanto riso.
                               __Doutor há muito tempo que não tenho dado um único riso, só sofrimentos, só mesmo o senhor para me fazer rir, obrigado doutor e mais uma vez se desmanchou em intermináveis gargalhadas.
 
                                 Se refez, olhou para o médico, perguntou   qual era seu interior  e onde havia se formado. Começou a fazer comentários da inusitada sala. Falou que o ambiente estava mais para museu do que para consultório, mais para o passado do que para o presente ou futuro, perguntou se aquele rádio de 1930  funcionava, lembrou muito do seu avô , do seu pai e ficou assombrado quando no toque de um dos botões surgiu um som grave de uma viola pantaneira, depois um som aconchegante do velho Gonzagão, não se conteve,  levantou-se encostou as orelhas na parte frontal do aparelho, abaixou e elevou o som, ficou impressionado, era igualzinho ao do seu avô .
                               __Doutor me lembro até da voz do meu avô:
                                 Não conseguiu ficar em silencio, pegou um candieiro  que estava sobre o rádio e pronunciou o nome de sua vó, riu ao avistar uma máquina de costura  e veio na  mente a sua tia Cotinha, tão boa, tão caridosa, tão atenciosa, era a  mais velha , inclusive Deus já levou. Não conseguiu calar  quando avistou um fruto nordestino, um jatobá; vieram as lágrimas, pois no seu sertão quando meninoera o único bocado a lhe matar a fome quando perambulava à caça de alguns nambus , preás e juritis. Caiu em prantos.

 
                                __Ah! doutor como era bom , tudo  era alegria.
                                 Os risos foram desaparecendo e aos poucos a razão foi se aproximando e junto com a emoção o homem começou a falar de sua vida, a explicar à filha como foi a sua infância nos cafundós da Paraíbaa raridade da água, a seca de 32os conselhos do Pe Cícero e o quanto importante foram os seus antepassados e que há muito não se lembrava das pessoas como também do seu velho torrão. 

                                Contemplando o ambiente, sentou na cadeira do paciente, pregou os  olhos num quadro 100 X150 mostrando uma velha estação, uma serra lá no fundo, os trilhos envelhecidos, ,um trem cambaleante e uma criança esquálida no batente de uma choupana,olhou,balançou a cabeça, mirou a face do médico .
                             ___Doutor: valeu, só esta visita valeu, mesmo que não fique bom de minha doença, valeu, mas valeu mesmo.Viajei no tempo e no espaço. Valeu.
 
                              Iniciei a consulta, perguntei por  suas origens, do seu Estado natal, profissão, dos seus pais, avós, das brincadeiras na infância, , das namoradas, das festas juninas e de fim de ano, se havia tomado banho de rio, se morou em casa de sopapo,   se falou e andou  na época certa, se já teve sarampo ou catapora , falei dos   seus filhos do seu trajeto como ser humano, e da dureza  de hoje se encontrar com 85 anos , vivo, lutando, brigando , muitas vezes desvalorizado, incompreendido e injustiçado uma vez que na vida só fez mesmo foi trabalhar, trabalhar para educar os filhos.
                             Neste momento notei  mudanças no seu semblante.
                             Após este preâmbulo,  indaguei por sua saúde detalhe por detalhe, ponto por ponto, sintomas por sintomas. Olhei todos os seus exames, trazia na lapela um diagnóstico sombrio de  péssimo prognóstico, era uma doença maligna em avançado estado, inclusive com  ascite e disseminação para outros órgãos, não agüentava mais procurar médicos e sem solução.
 
                             De posse dos seus dados esbocei um rascunho  do aparelho digestório, localizei a origem do seu problema, martelei didaticamente órgão por órgão,  para que servem, o que fazem e como se encontravam, explanei a sua evolução. Expliquei que o homem no país vive em média até os 68anos e ele com 85 já havia ultrapassado 17 anos, mandei que o mesmo relembrasse os seus amigos de infância, coloque em uma única mão contando nos dedos quantos estavam vivos, quantos ainda saboreavam um feijão com toucinho e farinha. Ele não se conteve e disse:
                   ___E bem vividos doutor, bem vividos, o senhor esqueceu da rapadura  .
 
 
                      Completei:
                       ___vividos no trabalho, no respeito, na honestidade e com seriedade, não como muitos que se dizem importantes e só servem para subtrair o pouco dinheirinho do povo.
                        __Pura verdade doutor, pura verdade , eduquei todos os meus filhos com o salário da leste, com o suor do meu próprio rosto, eu só tenho o ABC, mas conseguir educar os meus filhos: hoje um é engenheiro da Petrobrás, outro é Professor  e o outro é Medico, médico numa cidade do interior, muito procurado pelos seus pacientes, não é porque é meu filho não doutor, mas é um bom médico, todo mundo gosta dele, desde pequeno que é muito estudioso, toda semana me telefona e ainda manda uma coisinha todo mês. Sei que  está difícil, mas não esquece de mim e nem da sua velha mãe. Esta que é a caçula, estudou para Assistente Social.
 
 
                      Complementei:
                       ___ Seu Mocim é de pessoas como o senhor que o Brasil precisa, aliás,  foi o senhor quem construiu  este país, naquela época sem estrada, sem luz, sem telefone, nem geladeira existia e se existia só os ricos, só os mangangões, só aqueles que mandavam, só os coronéis possuíam, o resto  era  sofrimento, existindo a comida já estava bom demais.
 
                      __Êita que doutor danado, era  isso mesmo doutor, era assim mesmo.
                          E mais uma vez os olhos marejaram.
 
                          Foi realizado um minucioso exame físico, o que confirmou a gravidade do caso, explicado ao paciente que se tratava de uma doença que não necessitaria de cirurgia, que ele poderia comer o que quisesse desde quando não prejudicasse a sua saúde, que poderia passear, ir à praia , visitar os seus parentes na Paraíba, trazer um bom queijo  coalho para o seu médico e que não deixasse de comparecer à clínica nestes próximos 15 dias.
 Aos familiares informado que se tratava de um caso inoperável devido as metástases .
 
                          De pronto a filha disse:

                    ___Doutor ,nós queríamos ouvir mais uma opinião e pai disse que se fosse para operar ele não aceitaria.
                       A conversa continuou por mais alguns instantes, o abraço da despedida foi mais efusivo do que o da chegada, foi um abraço mais forte, do desprendimento, da conquista, o abraço de dois velhos amigos que há muitos anos não se viam, o abraço da compaixão e  da liberdade.
                    Termino informando que o paciente passou a ser um grande amigo, o consultório começou a fazer parte de sua vida sempre que necessário, muitos foram os momentos de alegrias, de puro entretenimento e muitas histórias recuperadas, passei a freqüentar a sua casa  e conhecer todos os familiares.
                   Usufruir de bons papos , enriquecedoras prosas e saborosas relíquias da culinária brasileira passaram a ser rotina, seus filhos me consideram irmão.
                  Como o tempo não perdoa  e o criador sabe o que faz,  o  amigo foi se familiarizando com seu quadro, tomou conhecimento da sua enfermidade, comentava que o homem é um ser mortal e que todos tem o seu dia para falar mais de perto com Deus . Alegre como  um menino foi plantando alegria , foi aproximando os familiares com as suas mensagens,  até o dia de sua audiência maior com o Criador. E exatamente 360 dias depois foi realizado a missa de 7º  dia em homenagem ao o meu querido amigo , que muito riu, dançou, cantou e me abraçou no  humilde, simples e singelo consultório que muitas alegrias trouxe. Nos seus últimos dias, na cabeceira do leito, ou melhor, na cabeceira de sua cama, rodeado de familiares e amigos, olhava e dizia:

                  ___Amigo doutor, valeu, valeu e como valeu.
                  Convicto de que  daqui há muitos e muitos anos, quando me encontrar quase que irreconhecível pelos janeiros acumulados e  ao chegar onde muitos já estão,  não serei um estranho no ninho, contente e cônscio da missão cumprida  ,  sinto que lá, LÁ, ONDE  DEUS MORA e se for merecedor, serei muito bem recepcionado.
Foi assim que ganhei mais um amigo e foi assim que aumentei a minha família. 
          
                  Salvador, 30 de julho de 2006
 
 
                  Iderval Reginaldo Tenório
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  1. Paulo Diniz - E AGORA JOSÉ - poema de Carlos ... - YouTube

    www.youtube.com/watch?v=1L9mZIxgaq0
    21 de mar de 2014 - Vídeo enviado por luciano hortencio
    Paulo Diniz - E AGORA JOSÉ - poema de Carlos Drummond de Andrade, musicado por Paulo Diniz ...

sábado, 28 de maio de 2016

APELO DE UM BRASILEIRO


                                                                                   

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                                                      APELO DE UM BRASILEIRO
                                                         Iderval Reginaldo Tenório
 

                           Apelo de um brasileiro preocupado com o baixo índice de leitura da literatura brasileira ora substituída pelos dejetos literários de outras nações, ora sem nenhuma leitura.

                           As livrarias, as bancas e os mercados estão abarrotados de obras estrangeiras deseducadoras.

                           É verdade que a literatura estrangeira é muito rica, do teatro à poesia é inegável o seu  valor, porém a fatia que chega aos tupiniquins, aos subservientes periféricos  é uma vergonha,  faz-se necessário uma sacudidela.

                           Não deixem a cultura Brasileira morrer, reproduzam as histórias das vovós para os seus filhos e amigos, falem da bravura do homem brasileiro,  para que os jovens se orgulhem dos seus heróis, dos seus caipiras e de suas ocupações, para que esses mesmos jovens não se envergonhem do seu povo, principalmente dos antepassados.

                           Enalteçam as batalhas, as lutas e esclareçam quem são os verdadeiros  heróis da nação, não deixem a televisão atropelar, matar e sepultar a cultura do seu povo e que não sejam massificados pela cultura contaminada do além mar,  que enchem os lares por intermédio da Internet, livros, cds, DVDs e a industria cinematográfica.

                           Tenho notado que os jovens vêem se inteirando de uma literatura vazia,  insípida e que mostra o que de pior existe do besteirol do mundo civilizado, esta literatura invade os lares, as escolas, os cinemas, as livrarias e a mídia simplesmente pelo mercantilismo, publica, vende e espalha por todos os recantos.

                        O apelo que faço é que as escolas, os pais,  os homens de uma maneira em geral passem aos brasileiros a  necessidade de conhecer a sua literatura, através dela o ser humano passa a conhecer e conviver com cada região do seu país e entender a diferença brutal entre os seres que habitam a mesma nação. 

                           Existem autores que descrevem a nação do nascedouro aos dias atuais, uns os pampas do sul brasileiro, outros pormenorizam o centro oeste e um grande grupo o Norte e  Nordeste, falam das secas, das florestas, dos cerrados, da caatinga, dos animais , do cangaço, do clima e dos costumes, mostram  as  suas diferenças e demonstram a diversidade de cada comunidade.

                     Lendo os autores brasileiros, o leitor  faz um passeio vivo de mãos dadas  com a história, será contaminado pelos costumes e passará a entender a formação deste povo batalhador, só com esta atitude os brasileiros poderão resgatar a auto-estima, só desta maneira tornar-se-ão verdadeiramente brasileiros, sem sentir vergonha ou menosprezo por qualquer que seja a nação,  que procura de uma maneira ou de outra substituir da mente a cultura  raiz.

                     Os brasileiros deveriam fazer uma campanha de valorização dos seus ícones, sua cultura, sua música, sua literatura, sua culinárias, as suas artes,  seu povo, seus artistas, seus poetas, seus escritores, seus caipiras e seus trabalhadores.

                    Leiam José de Alencar, Jorge Amado, Adonias Filho, Machado de Assis, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, Euclides da Cunha, Guimarães Rosas, Patativa do Assaré, Zé da Luz, Drumond de Andrade, Josué Montello , Castro Alves, Augusto dos Anjos, Ariano Suassuna, Lima Barreto, Darcy Ribeiro, Fernando Henrique Cardoso , Walfrido Moraes, João Cabral de Mello, Frederico Pernambucano de Melo, Lira Neto, Gilberto Freire, João Ubaldo e outros de igual valor, escutem Luiz Gonzaga, Gilberto Gil, Caetano Veloso, João do Vale, João Silva, Elomar, João Gilberto, Chico Buarque, Dona Ivone Lara, Fagner, Ednardo e Belchior, Chiquinha Gonzaga, Helena Meireles, Clementina de Jesus, Odair José, Luiz Vieira , Bule Bule e Raymundo Sodré,   Vilas-Lobo e outros ícones.

                   Procurem  saber sobre- Tiradentes, Felipe Camarão, Padre Cícero, Lampião, Joana Angélica,  Florestan Fernandes, Antônio Conselheiro, Padre Ibiapina, Frei Damião e  Dom Helder Câmara. 

                     Procurem lê sobre as diversas guerras sociais e antropológicas como- A Guerra do Contestado, O Cangaço no Nordeste, Guerra dos Farrapos, Revolta dos Alfaiates, Guerra dos Mascates e dezenas delas que aconteceram neste país.

                    Procurem saber a verdade sobre a escravidão do índio, do negro e do branco no brasil.

 

 

                       Após passarem por estas cabeças, acreditem, nada poderá desvirtuar o sentimento de brasilidade, pois, quando as raízes são fincadas e penetram no solo pátrio, todas as outras culturas independentes de suas origens  virão e virão  para somar , e jamais para substituir a cultura mãe.

 

                      A cultura de sua nação  é quem forjará a sua  consciência e quem lhe dará o crivo da razão,  contemplando a sua mente,  para sorver  o que existe de melhor da cultura do além mar e   não os dejetos que contaminam as pueris e desprotegias mentes, sem olvidar que é o país possuidor de uma pluralidade cultural de causar inveja a quase  todas as outras nações do mundo, fruto de sua formação plurirracial.

                        .

                         Leiam as publicações diárias e semanais da imprensa brasileira, acessem os grandes debates, participem do cotidiano da nação, sejam fiscais dos dirigentes, procurem eleger homens comprometidos com ideais democráticos e  comunitários, que pensem no coletivo, façam cobranças aos seus representantes, lutem por justiça nas aplicações das verbas públicas, principalmente na educação e na cultura.

                     Vejam que tem muito para se aprender e que com certeza melhorarão os seus pensamentos e este jeito passivo de aceitar as coisas que permeiam o empobrecimento cultural da nação.

                       Tenham orgulho do torrão brasileiro, gritem bem alto os nomes dos nossos antepassados, neles se encontram as armas da  sabedoria popular, as raízes para a soberania e o sonho de toda a nação, a independência de um povo. 


Viva a plural e rica cultura brasileira.

Tenham orgulho dos seus pais.

 

Iderval Reginaldo Tenório  

autor. 1998

ESCUTEM DO  JOÃO DO VALE E LUIZ VIEIRA ,  NAS ASAS DO VENTO .
 

Caetano Veloso - Na asa do vento - YouTube


https://www.youtube.com/watch?v=vT1grr5ecZk
3 de mar de 2011 - Vídeo enviado por Captain4DarkMornings
Upload mp3s @ http://www.mp32tube.com da Jóia, 1975.

João do Vale - Na Asa do Vento - YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=ZkhgZ8MYRh8
6 de dez de 2010 - Vídeo enviado por Alfredo Pessoa
João Batista do Vale nasceu em Pedreiras MA em 11 de Outubro de 1934. Desde pequeno gostava ...
 

 

Luiz Vieira - Na Asa Do Vento [1978] - YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=VvG2JetK2B4
26 de abr de 2013 - Vídeo enviado por EltonRockNacional
Luiz Vieira - Na Asa Do Vento - 1978. ... Florentino "Na asa do vento (João do Vale / Luiz Vieira ...

 

Na Asa do Vento - Caetano Veloso - YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=IxpI7Us7XbQ
28 de dez de 2011 - Vídeo enviado por TONTATAMBEM
Na Asa do Vento - Caetano Veloso .... Florentino "Na asa do vento (João do Vale / Luiz Vieira ...

 

HISTÓRIA DE UM VERDADEIRO PAI




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HISTÓRIA DE UM VERDADEIRO PAI

 

No inicio de minha vida profissional fui plantonista de um sério pronto atendimento.

 

Nestes plantões eram lotados dois médicos , os atendimentos eram para pacientes emergenciais, os casos mais graves  eram transferidos e recebidos com todo prazer pelos plantonistas da unidade Hospitalar que davam suporte a este pronto atendimento.

 

Era discutido naquela época, como nos dias atuais, o que é um atendimento de urgência, o que deve o médico atender, até que ponto é ético o médico dizer que este caso não é emergência e não deve ser atendido nesta casa e sim por outra unidade, unidade esta que neste complexo existia e muitas vezes com especialistas.

 

Era domingo,  , chovia torrencialmente e a cidade estava deserta, não me recordo o motivo, a pediatria se encontrava desativada , recomendado cautela. Os pacientes eram atendidos alternadamente , até a meia noite era intenso o movimento, depois caia consideravelmente, era 03h30min da manhã, chegou um senhor de uns 40 anos de idade, trazia embalado nos braços envolto num grosso lençol uma crianças de 4 a 5 anos , foi até a recepção , disse que o filho estava com febre e dor na garganta .

 

A recepcionista explicou que não se tratava de uma emergência e que deveria procurar o outro serviço logo que o dia clareasse .

 

Humildemente o senhor sentou numa cadeira defronte a televisão, pensou, refletiu , voltou para a recepcionista, tentou explicar e sem sucesso. Solicitou que lhe mostrasse quem eram os médicos, queria falar e solicitar pelo o amor de Deus que atendessem o seu filho, o médico da vez respondeu que aquele caso não configurava uma emergência e poderia muito bem esperar até o amanhecer.

 

Pensou: amigdalite às 3:30h da manhã, era brincadeira, porque não levou o garoto durante o dia no ambulatório apropriado, resmungou para si, amigdalite às 3 e 30, é demais .

 

Ao ver a cena e sentir naquele pai um semblante de diminuição, de inferioridade e de desvalorização como cidadão, chamei o colega, solicitei que atendesse , foi irredutível.

 

Não pensei duas vezes, mandei fazer a ficha , solicitei que colocasse o pai e o filho no consultório, chamei o colega e frente a frente, iniciei a consulta, não uma consulta médico-clínico, mas uma consulta médico-social. 

 

O pai revelou que morava na periferia, que saíra de casa às 06horas da manhã, trabalhava numa empresa encostada noutra, nem mais era terceirizada, o transporte era uma casinha adaptada sobre a carroceria de um caminhão,não tinha alimentação, nem garantia de emprego e era o último a chegar em casa no subúrbio ferroviário, depois de uma peregrinação por toda a cidade, devido o despejo dos seus pares que moravam em pontos diversos.

 

Naquele dia havia deixado a fábrica às 22 horas, rodara por mais de 150 quilômetros , ao chegar em casa, sem almoço e sem jantar, sem banho e possuído pelo cansaço, foi avisado pela esposa que o menino estava com febre e esperava o pai para levá-lo ao médico , matou a sede, encostou a mochila e a marmita, embalou a criança e debaixo de chuva,andou a pé três mil metros,pegou o trem suburbano que se conectava com o ultimo ônibus e depois de rodar 30 quilômetros atingiu o fim de linha,um turístico logradouro, desceu a pé um íngreme , enladeirado , longo e deserto percurso da grande praça ao longínquo serviço de urgência.

Na solidão do caminho,na escuridão da noite, sob o frio da úmida e torrencial chuva,arriscando as suas vidas, mergulhou na realidade .  Na cabeça um turbilhão de pensamentos, todos de baixa estima: pobre, não bonito, suburbano, pertencente a uma categoria sem valor, afro descente, cansado, naquele dia sem se alimentar, foi tomado pelo desânimo, porém, tinha um filho, possuía um rei,possuía uma das razões que justificava viver,que justificava todo e qualquer sacrifício, aliás, levar o seu filho a um médico, não era sacrifício,era um prazer e pensava no seu trabalho, na sua família, no seu pai, via e sentia naquela hora,naquele momento como era difícil a vida,como era dura,como era insignificante diante do mundo, ainda bem que existia o médico,este sim me compreendia,este sim era homem de coração bom,este sim atendia a toda hora,atendia em todos os momentos, nos momentos de necessidades e sempre alegre,sempre rindo,ainda bem que existia o médico, deste mundo só o médico,somente o médico era verdadeiramente humano,quem era ele para ser atendido,para receber a atenção daquela espécie de homem,homem estudado e importante,inclusive por ele ser um simples operário era condição suficiente para não ser atendido, ainda assim , o médico atendia.  Atendia porque era humano, porque era bom, porque era gente , apesar de médico era gente e foi assim que veio pensando em todo o seu longo e difícil trajeto,imaginava encontrar um amigo,um amigo que lhe escutasse, que lhe desse atenção, que lhe desse socorro, ainda bem que existe o médico.

 

Disse também que saiu preocupado como voltaria,com que carro, com qual dinheiro e para ir ao trabalho no outro dia, sem dormir, sem comer , sem condições de faltar e se fosse demitido? porém, nada disso era mais importante do que aquele filho, nada tinha mais importância do que a saúde do seu filho. 

O colega frente a frente , escutava silenciosamente  o lamento do pai . Aquele depoimento era mais um desabafo, um desabafo social, um desabafo para com ele mesmo,um desabafo quem sabe, talvez para com DEUS, e o colega escutava calado, silencioso,olhar perdido,o colega estava noutro mundo bem distante, não sei aonde, num lugar longínquo; cabisbaixo.

 

 Repentinamente, com os olhos marejados , voz trêmula, rompeu o silencio , abraçou o guerreiro pai e balbuciou: PAI, AH SE TODOS OS PAIS FOSSEM ASSIM! COMO SERIA DIFERENTE.

 

Pegou as rédeas do atendimento, arranjou energia não sei aonde, atendeu, conversou, riu, ofereceu o seu lanche noturno e o café da manhã para aquele pai exemplar , alimentou a criança , pediu-me que passasse o plantão pela manhã e com a criança medicada,a bolsa cheia de amostras e muita disposição foi conhecer na periferia onde morava um homem, onde morava um cidadão , onde morava um verdadeiro pai e saíram os três na mesma condução .

 

Ainda hoje, nos encontros da vida escuto do nobre e gentil colega:__meu amigo, muito obrigado, a medicina não é só conhecimentos técnicos é muito mais. A medicina é o social, é o humanismo, é a ética, é o altruísmo, a medicina é a essência da cidadania , a medicina é uma das representantes fiel de Deus.

 

Ser médico enfim, é ser um misto de tudo quanto é de bom, ser médico é ser provedor, acolhedor e compreender os encontros e os desencontros do homem , ser médico é apenas ser Médico. APENAS. 

Iderval Reginaldo Tenório

Caetano Veloso - Na asa do vento - YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=vT1grr5ecZk
3 de mar de 2011 - Vídeo enviado por Captain4DarkMornings
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João do Vale - Na Asa do Vento - YouTube

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6 de dez de 2010 - Vídeo enviado por Alfredo Pessoa
João Batista do Vale nasceu em Pedreiras MA em 11 de Outubro de 1934. Desde pequeno gostava ..